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Neópolis - Cidades do Velho Chico - 31

A seca virou moeda de troca eleitoral

Rebanho bovino dizimado virou paisagem comum no Nordeste (foto: O Portomanguense)

Nas minhas andanças por este sertão, vendo a miséria e a seca imperando em plena época da tecnologia, frequentemente me irrito com a incapacidade dos nossos governantes. Desconfiava que tudo isso não fosse só ausência de capacidade. Agora tenho certeza que é má vontade ou oportunismo. Vê 600 milhões sendo gastos naquela belíssima Fonte Nova, recheados com um tempero extraordinário de um histórico 5 a 1 do meu Vitória sobre o grande e maltratado Bahia, e saber que este dinheiro faz falta ao meu sertão é doloroso. O cenário de desgraças já é do conhecimento de todos e o prejuízo é também do Estado. Os preços sobem e a arrecadação despenca. Somos pobres, ficaremos mais pobres ainda. Isto reforça a minha ideia de criar aqui o nosso estado da Bahia do Norte. Mas isso é assunto para depois. Quero que todos os meus leitores desfrutem de vários textos recolhidos do Bahia Notícias sobre a questão da seca e vejam que a miséria continua de forma propositada. O governo Wagner quer que continuemos com o pires na mão. Quer a seca como moeda de troca eleitoral. Vejam:
Geddel diz que Governo Wagner não se planejou e optou por “dividendos eleitorais” da seca
Por Bárbara Souza
Geddel Vieira Lima (foto: Tiago Melo)
O vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa, Geddel Vieira Lima (PMDB) engrossou o coro das críticas feitas pelo presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (Faeb), João Martins, à atuação do governo de Jaques Wagner frente ao problema da seca, que atinge mais da metade dos municípios baianos. Com a promessa de que evitaria “o viés da crítica meramente política”, Geddel afirmou que havia reunido documentos e “dados objetivos” sobre o tema para a entrevista que concedeu, nesta quinta-feira (11), ao jornalista Samuel Celestino, no programa Bahia Notícias no Ar, da Rede Tudo Fm 102,5.  Com base em tais informações, disse, ele relatou que em 2005, a Bahia tinha um plano estadual de recursos hídricos “que identificou 215 reservatórios no estado, com capacidade em torno de 100 mil metros cúbicos de água e mais 24 reservatórios com capacidade de acumulação acima de 25 milhões de metros cúbicos, aí incluídos Sobradinho – o maior lago artificial do mundo, e Itaparica” e previa ainda a construção, “entre 2007 a 2020, de seis outros reservatórios, com um custo estimado de R$ 640 milhões”. Segundo Geddel, o governo de Wagner “não deu início a uma barragem” e “abandonou o plano de recursos hídricos de 2005 e não lançou as barragens previstas”, além de ter optado por um caminho “que não é o do enfrentamento da seca” e sim o que “traz mais dividendos eleitorais do que estruturantes”. Como exemplo, Geddel citou a adoção de um sistema baseado “exclusivamente” na implantação de cisternas. “Ora, cisterna é boa para acumular água se você tem água para acumular. Se não chove, como é que você vai captar água, se não tem um sistema de distribuição, se não tem barragens?”, questionou. O peemedebista relatou ainda que, antes de deixar Ministério da Integração, consultou todos os estados afetados por longas estiagens sobre quais seriam suas obras estruturantes prioritárias. “A Bahia foi o único que não respondeu”, declarou, ao explicar que as informações norteariam a implantação de um “plano nacional de infraestrutura hídrica”. Para termo de comparação e “para fazer justiça” aos governos de César Borges (PR) e de Paulo Souto (DEM), o ex-ministro da Integração enumerou obras realizadas pelos ex-governadores. “A barragem Bandeira de Melo, a de Ponto Novo, a de Pedras Altas, de Pindobaçu e a barragem do França”, listou, ao completar: “E foi deixada iniciada a barragens de Cristalândia, Serra Preta, Santana e Lagoa da Torta”. Na opinião de Geddel, “estão tratando este governo como se fosse um governo de sete meses, mas é um governo de sete anos, que se exaure no próximo ano”, concluiu.
Samuel Celestino: Calamidade total I
Samuel Celestino
Na terça feira, assustado com o que ocorre no semiárido baiano, o secretário Rui Costa, da Casa Civil, e Eduardo Sales, da Agricultura, estiveram na Federação da Agricultura da Bahia, Faeb. A seca, a pior de muitas décadas, dizima os rebanhos e, virtualmente, as possibilidades de o governo evitar a grande catástrofe é praticamente nenhuma. Mais: como informa o presidente da Federação da Agricultura, João Martins, o pior está por vir até o final do ano. Para que se tenha uma ideia, o município de Senhor do Bonfim, com 300 mil habitantes, está sendo abastecido por caminhões pipas por não ter outra solução para oferecer água à população. Os secretários se deslocaram para a Federação de Agricultura do Estado para uma conversa com o presidente da entidade, que conhece a fundo a questão. Se entraram espantados, deixaram a sede da entidade apavorados. O governo tem feito de tudo para evitar o pior, mas suas possibilidades se resumem praticamente aos caminhões pipas, poucas aguadas praticamente sem água e nada mais, porque os governos da Bahia não cuidaram de adotar soluções para um fenômeno que está  presente no Nordeste desde que a região existe. Alguns estados, como o Ceará, foram mais precavidos e enfrentam a calamidade com açudes, construídos ao longo do tempo, de sorte que dispõe de 30 vezes mais água represada do que a Bahia.
Calamidade total II
Para a população do agreste ainda se consegue com paliativo os tais caminhões pipas, mas não se sabe até quando. O semiárido ainda vai sofrer, segundo os especialistas, até o final deste ano, porque se as chuvas chegarem será em novembro. Mas é difícil. De modo que a população, que já começa a deixar, pouco a pouco o sertão (embora digam que não há êxodo), vive um drama sem igual. O êxodo poderá ser muito pior. A Bahia até aqui já perdeu 1 milhão de cabeças da gado, rebanho maior do que existe no Estado de Sergipe. O governo só agora pensa alguma coisa como projetos para perenizar os rios que cortam o Estado usando a água do São Francisco, enquanto os Baixios de Salitre e Irecê, principalmente o primeiro, passaram mais de 15 anos em construção que ainda não foi concluída. O sertanejo definha, a água que chega é pouca, o sol é inclemente e os rebanhos estão sendo dizimados. A prioridade são os habitantes e não a criação.
Calamidade total III
O prejuízo é absurdo. As carcaças de animais que morrem por falta d´água estão por toda parte. Espalhadas pelo agreste. Por muito tempo o sertão da Bahia penará na pobreza. Mesmo depois que chegar o período das chuvas, virá, no próximo ano, ou no seguinte, o que chamam no interior de “seca verde,” isto é, a vegetação renascerá, mas pouco, ou nada, produzirá. Enfim, o governo afinal está assustado. Os produtores empobrecem, daí os secretários terem ido à Faeb conversar com Martins. A solução é uma, apenas um: perenizar os rios e construir barragens, porque cisternas só não bastam. Nem perfurar poços, a não ser que sejam centenas de milhares deles. Se não há chuva não há água para abastecê-las através das bicas. Enfim, o inferno é aqui.  E, de resto, em todo o Nordeste que pouco mudou no quesito seca no último século. Como se diz há muito tempo, o governo e os políticos só aparecem para pedir votos e não para oferecer soluções definitivas para a calamidade que se abate sobre a região.
Coluna do Samuel Celestino em A TARDE, dia 7 de abril
As carcaças dos “sem água”
Se a Bahia não fizer um projeto estratégico, estruturante, para os recursos hídricos e implantá-lo, mesmo que seja em governos sucessivos, jamais será um grande estado. Reconhece-se que um governo só é insuficiente para atender o vasto semiárido baiano, que está a pegar fogo, assim como todo o Nordeste, pela dimensão da catástrofe da seca que atinge a região. A UPB –União de Prefeituras da Bahia – alerta que 70% do território estadual sofre com o flagelo. O rebanho está sendo dizimado. Antes aos poucos, agora de forma acelerada. Em toda a região nordestina já pipocam movimentos, simbolizados por carcaças de gado que são depositadas em frente a agências do Banco do Nordeste. Aqui, está prevista uma manifestação semelhante para o dia 15, em Feira de Santana.
O “pacote” anunciado pela presidente Dilma Rousseff em Fortaleza foi um blefe, nada além disso. De maneira geral frustrou as entidades vinculada à agricultura e aos rebanhos, como a Federação da Agricultura da Bahia, presidida por João Martins, que considerou “frustrantes às expectativas gerais do setor, porque se esperavam medidas efetivas de apoio à economia, que está em processo acelerado de degradação”. A situação da Bahia é singular. Uma unidade cortada em toda a sua extensão pelo Rio São Francisco, ressente-se de água em seus rios secos que poderiam ser perenizados se houvesse uma política consistente nesse sentido.
Para que se tenha uma ideia, a presidente anunciou o seu “pacote”, que não tem significado para o drama que sertão está submetido, mas a verdade é que o Ceará de há muito vem tomando providências contra as estiagens prolongadas que sempre o atingiram e hoje tem armazenado 20 vezes mais água do que o estado da Bahia. Ademais, o governo baiano anunciou, numa tentativa de socorrer o rebanho que resta, 80 mil toneladas de milho, porque, de resto, não há no pasto mais nada para alimentar os rebanhos já reduzidos.
A princípio, pode-se imaginar que 80 mil toneladas é muita coisa. Não é. Pelo contrário. Num levantamento feito pela Federação da Agricultura, se forem distribuídos 50 sacos de milho (por produtor) em um mês para alimentar o gado, apenas 26 mil deles serão atendidos, o que representam 15% dos criadores baianos. 50 sacos por produtor pouco significa.
Não há nenhuma projeção de chuva para o semiárido baiano, o que gera um processo aflitivo para os criadores. Trata-se de uma das maiores secas em décadas. Possivelmente, a maior em 60 anos. Aliás, não se sabe, ao certo, há quantos anos não acontece um flagelo semelhante. Todas as medidas tomadas, como adutoras, caminhões-pipas e cisternas pouco representam. Este processo de desatenção governamental não vem de agora, mas de governos anteriores, e não poderá ser solucionado, como já citado acima, num só governo. É preciso que haja um projeto estratégico, definitivo, ou a Bahia sempre será um estado com grande parte da sua população na pobreza absoluta, até pela característica do semiárido onde as habitações são esparsas no grande sertão.
Lembra a grande obra de Graciliano Ramos, que conta a história de uma família de retirantes, vagando pela terra esturricada, fugindo da seca, acompanhada de uma cadela, Baleia, e de um papagaio que não falava, apenas latia, porque era o som que ouvia da cadela, mais triste do que seu dono. O livro, do ciclo pós-moderno, transformou-se em filme, que apresentou uma visão árida e correta do romance de Graciliano.
Esta grande seca que empobrece a Bahia e toda a região poderá ter reflexo mais adiante, nas eleições do próximo ano, até porque os prefeitos dos município atingidos preparam uma marcha para Brasília em busca de medidas rápidas e emergenciais que denominaram de “Marcha dos Sem água”. Se derem sequência às manifestações que já se registram em alguns estados nordestinos e em Feira de Santana acontecerá no dia 15, poderão levar carcaças de boi para a Praça dos Três Poderes. É um símbolo que representa com exatidão o sofrimento dos que não têm água e, em consequência, perdem os seus rebanhos.
Enfim, as medidas tomadas pela presidente Dilma, o esperado “pacote”, recebeu críticas generalizadas. Consideram os prefeitos que as desonerações fiscais agravam a situação, segundo eles por reduzirem o repasse para os municípios. De resto, relembro um verso do saudoso Luiz Gonzaga ao cantar o drama da seca, chorando na sua sanfona o desespero do nordestino famélico e retirante: “Seu doutor uma esmola/ para um homem que é são/ ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão.”