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Nossa Senhora de Lourdes - Cidades do Velho Chico 21

Percepções do Rio Paraguaçu - por Gilmar Ferreira

Projeto “CONEXÃO LEITURA”

Crônicas Peregrinação à FLICA

Festa Literária Internacional de Cachoeira - Bahia

Cachoeira-BA, 03 de novembro de 2022

Percepções do Rio Paraguaçu

Olá! Eu sou o Rio Paraguaçu, banho com minhas mansas águas a cidade de Cachoeira. Fiquei encantado ao ver tantos jovens estudantes banhando-se aqui, não em minhas águas, mas na Cultura e na Leitura que jorrava na 10° FLICA- Festa Literária Internacional de Cachoeira. Todavia, maravilhei-me com um coletivo estudantil que estava representando o Colégio Estadual José Dantas de Souza, o famoso CEJDS da cidade de Heliópolis – Bahia.

Ah! Não consigo esquecer o que li nos olhos do jovem Roberte Carlos, ele parecia atônito, alguém diria que aquele olhar era por estar assistindo bem de perto o famoso rapper MV Bill. No entanto, eu sei que não era só por isso. Na verdade, o que encheu os olhos do menino foi a mensagem transmitida na Poesia do cantor, que dizia assim:

(...)
“Já não é segredo o plano perfeito para matar
Quem não reclama fica no drama fica fadado a se acomodar
Vida de gado é tempo perdido, tamo de fora desse contexto
Mesmo sem combate tem abate sem pretexto
Independente de opiniões
País com mais de 200 milhões
Tá valendo alto cada tom de voz
Se não for a gente quem será por nós
Sem referência qualquer coisa serve
Tá insalubre com uma pá de verme
É a pureza de genética, sobra arrogância e falta ética
Com seu casaco de general cheio de anéis
JAHbless pra cada verso que decoro
Se o brasileiro renascesse como dinossauro
Certamente votaria em um meteoro”
(...)


Eu, um rio tão velho, fiquei encantado com o sorriso de Roberte, era a primeira vez que o víamos sorrindo. Ali, ao lado de MV Bill, o garoto tirara a sua foto para a posteridade...

Enquanto isso, eu continuava sendo levado pelo vento naquela viagem de contemplação à FLICA. Logo, observei o pensamento de Erickson Augusto César, outro estudante do CEJDS, ele, naquele exato momento, lembrava-se de uma de suas aulas da disciplina Arte com sua estimada professora Ariana Michele, recordava-se quando ela ao falar sobre a Arte Barroca apresentou para Erickson e para a turma uma fotografia da igreja que compõe o conjunto arquitetônico do Convento do Carmo. O jovem lembrou-se que viu aquela imagem num livro didático, contudo, nem imaginava o quão era linda aquela igreja de perto, com suas pinturas gigantescas, com grandes e grossas colunas e com suas paredes revestidas por pequenas camadas de ouro. Tudo era muito lindo e impressionante.  

Gostei muito de sentir a alegria e o encantamento do jovem Erickson. A velha Ponte Dom Pedro II até vive caçoando comigo, dizendo: “Eita! Rio Paraguaçu você está muito mais velho que eu mesmo; você vive contemplando poeticamente essa juventude que frequenta a FLICA todos os anos.” E, ela está certa mesmo, gosto de ver o semblante maravilhado dos jovens. Pensando nisso, não me esqueço do arrepio que vi na pele de Luís Filipe Dias Santos e de Luís Filipe Matos Silva; dava para sentir o quanto eles gostaram de ver as obras artísticas, as pinturas, os artesanatos, os monumentos históricos e todos aqueles pontos turísticos.   

Diante de tanta alegria observada no entusiasmo daqueles jovens até me senti jovem também, logo eu, um rio velho e cansado. Contudo, de uma coisa eu não me cansei, não me cansei mesmo, ao observar o menino Arthur Mota ali, assuntando, refletindo, imaginando quantas e tão diversas foram as pessoas que já havia passado por todas aquelas estruturas arquitetônicas do Brasil colonial e imperial.. Mas, teve outra coisa que me encantou... Foi quando vi Arthur comprando uns livros, pareciam brinquedos de criança, e, de fato, os livros são brinquedos, brinquedos que nos levam para todos os mundos imagináveis e inimagináveis.

Outro momento que deixou esse venturoso rio alegre foi a percepção de estar perto do garoto Sebastião Barbosa Fontes, gente sensível, percebi assim que ele tirou uma foto ali bem pertinho de mim. Ela acabara de estar perto também da poeta cordelista indígena Auritha Tabajara, pegou um autógrafo em seu braça, isso ficará marcado em sua mente para sempre. Assim como também ficará marcada a presença de Sebastião no espaço onde funcionou uma antiga prisão na cidade de Cachoeira nos séculos passados. Ali, cheguei até a ler o pensamento do menino quando ele refletiu consigo: “Só em imaginar o que pessoas que passaram ali... Dentro me dá arrepios; os sofrimentos que passavam, várias e várias pessoas morreram aqui, até mesmo gente inocente, mas, pessoas que não deixaram de acreditar que seu povo (os escravizados) um dia séria livre.”

Outra jovem que mexeu com a minha percepção foi a Maxilane de Souza Silva Gonçalves. Quando, da janela de um casarão da cidade de Cachoeira ela refletiu: “Para mim tudo foi muito significativo e importante pelo fato da FLICA querer despertar coisas como: o sentido do senso crítico na juventude, a mentalidade sobre os temas abordados acerca da diversidade; a importância da leitura; a importância de conhecer outras culturas e o que a própria cidade imprime para você que é saber do contexto histórico, pois que tem muita gente que não sabe, e isso tudo é marcante.” Eu, um rio antigo que se achava sábio, vi foi muita sabedoria naquela jovem. Enquanto eu ficava aqui encantado, Maxilane via a cidade, via livros e via a diversidade tão necessária para todos nós.

Sinceramente, foram muitos os momentos marcantes que observei na peregrinação dos jovens estudantes do CEJDS de Heliópolis à FLICA. Além dos já citados, cabe ressaltar que também estavam ali: Maria Eduarda Silva Gama, a Duda; Sabrina Santana Tavares e Vitor Andrade Santos. Com eles estavam os Professores Nilton Alex e Gilmar Ferreira. 

Outro grupo muito importante que esse saudoso rio gostaria de destacar é o do pessoal da Secretaria Municipal de Heliópolis, entre eles: Abraão Guerra, Monívia Oliveira e Jéssica Souza. 

Jéssica, que é coordenadora da Educação de Jovens e Adultos (EJA) da rede municipal de ensino heliopoliense e uma entusiasta no Incentivo à Leitura fez questão de confidenciar a esse maravilhado Rio o seguinte: “O que mais gostei fora o olhar encantador de um Professor – Gilmar Ferreira – ao proporcionar momentos assim para seus Educandos e o encantamento dos adolescentes pela vivacidade da história em cada canto da cidade de Cachoeira, onde aconteceu a 10ª FLICA.” Com as palavras dessa Educadora inefável, eu, o Rio Paraguaçu, despeço-me de vocês, na esperança de encontrá-los próximos de mim no ano que vem.

Gilmar Ferreira - Professor de Língua Portuguesa

Colégio Estadual José Dantas de Souza

Heliópolis – Bahia

Aqui ficam registrados nossos agradecimentos especiais à Eluiza Mendes – Secretária de Educação do Município de Heliópolis – e a Gilberto Jacob – Diretor do Colégio Estadual José Dantas de Souza. 

Veja como ficou o novo Colégio Estadual José Dantas de Souza!

A foto do fato: One Peace em Vidas Secas: O Retorno

De malas e cuias, seguiram para Salvador os alunos João Victor, Raissa Alves e a professora Ariana Michele. Eles participarão da 10ª Feciba - Feira de Ciências, Empreendedorismo e Inovação da Bahia. Lá defenderão o novo formato da ideia vencedora na Feciba do ano passado, unindo a cultura do anime japonês com as coisas do nosso sertão. O Colégio Estadual José Dantas de Souza, de Heliópolis-Ba,  está bem representado.

Do Sertão ao Centro-Oeste: Valente, BA 120, BA 416, São Domingos, São Pedro e Santo Antônio

Este é o segundo episódio da série Caminhos do Brasil - Do Sertão ao Centro-Oeste.

Sob a presença exuberante do Açude Tapera, saímos de Santa Luz e seguimos pela BA 120, rodovia em péssimo estado e em processo de revitalização. Ao longo da rodovia há placas indicando o processo de recuperação, mas as obras estão mesmo a todo vapor já bem perto de Valente. Cerca de dez quilômetros depois passamos pela comunidade de Lagoa das Pedras, localizada logo depois da divisa entre Santa Luz e Valente, mais ou menos no meio do caminho entre as duas municipalidades. Mais dez kms depois chegamos ao município de Valente, a Capital do Território do Sisal.

Localizado em pleno semiárido, o município de Valente foi abençoado por ter um solo e ambientes propícios ao cultivo do sisal. O agave veio da América Central e se desenvolveu por aqui, abastecendo nossa região e até sendo exportado. Famílias do local fizeram fortunas, embora isto não tenha diminuído a dependência do povo do lugar a programas sociais governamentais. 

Valente foi um povoado pertencente a Conceição do Coité e virou cidade em 12 de agosto de 1958. O nome antigo era Caldeirão do Boi Valente, nome originário de uma fazenda de gado onde existiu um boi que se desgarrou do rebanho e nunca mais foi dominado por vaqueiro algum. Findou morrendo afogado, quando resistia ao domínio do homem. O local ficou conhecido como Caldeirão do Boi Valente, Fazenda Caldeirão do Boi Valente e depois de virar povoado o nome foi reduzido para apenas Valente.  O município tem uma população de 32 mil moradores e se localiza bem próximo do rio Jacuípe. Em suas terras nasce o riacho Carnaíba, que tem suas águas represadas no distrito de Poço Grande, em Araci. A área total do município chega a 394,876 Km². Sua altitude é de 358 metros e a sede fica distante 238 km de Salvador.  

Apesar de hoje ter uma maior diversidade econômica, Valente ainda se nutre do sisal. Prova é a existência da Associação de Desenvolvimento Sustentável e Solidário da Região Sisaleira – APAEB, que produz fios naturais, tapetes e carpetes de sisal. Também há uma indústria calçadista que emprega muitas pessoas. Como não poderia deixar de ser, a Prefeitura Municipal de Valente também é um dos principais empregadores. Além disso, com a baixa valorização dos derivados de sisal, a agricultura familiar foi diversificada e tem até unidade produtora de mel, sem nunca ter abandonado a pecuária.

Como todas as cidades nordestinas, as festas populares do mês de junho, como o São João, ainda despertam muito interesse. Neste período a cidade recebe muitos turistas e ex-moradores, pessoas que ganham a vida em São Paulo, Feira de Santana, Salvador e outros cantos, para fugir do desemprego na região. No esporte, há todos os anos o campeonato municipal de futebol realizado no Evandrão, estádio da cidade, além da Copa de Integração Rural de Futebol Soçaite e do Rally do Sisal, competição automobilística integrante do Campeonato Brasileiro de Rally.

Os espaços culturais em Valente são bem desenvolvidos graças aos seus moradores que sempre mantém viva a cultura popular do lugar, mas o destaque fica com a Casa da Cultura, construída em cima de um imenso lajedo no centro da cidade, equipada com um teatro com capacidade para 320 pessoas, espaços de convivência, auditório e centro de informática. Lá, repentistas, cantadores, reiseiros, grupos de teatro amador, cantores e outros artistas alimentam o legado deixado pelo folclórico músico Tio Moura.   

No caso da infraestrutura, Valente conta com um hospital de médio porte, escolas estaduais e uma rede municipal com boa estrutura, escolas particulares, faculdades, ginásio poliesportivo, clubes, áreas diversas de lazer, pistas de skate, academias e tudo mais que seus habitantes precisam para ter qualidade de vida. Além da BA 120, que liga o município a Retirolândia e Conceição do Coité, há ainda a BA 416, que segue na direção da cidade de São Domingos e de lá vai até a BR 324. Embora esteja também sendo recuperada, o trajeto foi uma luta contra a tradicional infernal buraqueira que assola as estradas desta Bahia de meu Deus!

Saindo então de Valente, seguimos pela BA 416 e, após 10kms, chegamos ao município de São Domingos, mais uma cidade que surgiu de uma fazenda. Os proprietários eram o Coronel Francisco Pedreira e D. Amélia Pedreira. A localidade foi construída no ano de 1926. Devoto de São Domingos, o coronel colocou o nome do santo na fazenda, que na época pertencia ao município de Conceição do Coité. Anos depois a fazenda passou para João Torquato de Oliveira, casado com Aquilina Vitalina de Oliveira. Tiveram ali sete filhos e abriu um pequeno comércio. Chegaram então os primeiros moradores. João Torquato resolveu morar na fazenda Bela Vista. Na fazenda São Domingos ficaram o seu filho João Oliveira e o genro Leonardo Celestino, que administrava a casa comercial. 

Em 1941 já constava como proprietário da fazenda José Vitalino de Araújo, casado com Maria Ramos de Araújo. Daí em diante, o povoado só cresceu. Surgiram barbearias, barracão para feirantes e a capela, erguida em 1949, consagrada ao padroeiro São Domingos de Gusmão. No início da década de 50 veio a construção do açude. Nesse período, São Domingos já fazia parte do distrito de Valente.

A luta pela emancipação começa em 1984 e contou com a simpatia de várias autoridades. Em 13 de junho de 1989, é sancionada a Lei Estadual nº 5.005, desmembrando São Domingos do Município de Valente. Os primeiros Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores foram eleitos em eleição de 15 de novembro de 1989 e tomaram posse nos seus respectivos cargos em 1º de janeiro de 1990. Hoje, São Domingos tem uma população próxima dos 10 mil habitantes, numa área de 265,375 km².  

Continuando pela BA 416, ainda em estado de penúria, três kms depois nos deparamos com a simpática comunidade de São Pedro, de formação bem recente e que ainda não está preocupada em organizar sua história. Cerca de outros três kms depois chegamos à Vila África, uma comunidade quilombola onde moram cerca de 20 famílias. Mais cinco kms depois chegamos ao distrito de Santa Antônio do Jacuípe, localizado nas divisas de São Domingos com Gavião e Nova Fátima. Curioso é que, depois de atravessar o rio Jacuípe, é a BA 416 a linha divisória entre Gavião e Nova Fátima, até chegar ao entroncamento da BR 324. Santo Antônio tem o rio Jacuípe como seu principal atrativo, além do Morro do Mamote, que fica bem próximo. Claro, o período dos festejos juninos recebe visitas de muitos turistas e ex-moradores. 

Seguindo mais dez kms pela esburacada BA 416, chegamos ao entroncamento com a BR 324 e daqui seguiremos com destino a Gavião, Capim Grosso e Jacobina, mas é assunto para o nosso próximo episódio da série Caminhos do Brasil - Do Sertão ao Centro-Oeste

Veja o vídeo.