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Nossa Senhora de Lourdes - Cidades do Velho Chico 21

Poucas & Boas nº 101: Um livro de Décio Torres, o mundo paralelo bolsonarista e o apagão econômico!

Paisagens interiores de Décio Torres

Com enorme prazer anuncio a chegada do livro Paisagens Interiores, do escritor, crítico literário, poeta, pesquisador da Ufba e Uneb, o baiano Décio Torres Cruz. Phd em literatura, especialista em tradução e com livros publicados em inglês. O livro é um primor de acabamento, feito pela editora Patuá. Lançado em 2021, vem em duas partes: Livro 1: Paisagens diurnas; Livro 2:  Paisagens noturnas – com Prelúdio, Intermezzo e Finale. A orelha é assinada por Aleilton Fonseca e o próprio autor abre o livro com um “A você que me lê” e deixa espaço para poemas que foram originalmente publicados em inglês ao lado de vários outro inéditos. Mas não é só isso. Há ainda fotografias do próprio Décio, bem no perfil atmosférico da temática do livro, e ilustrações que nos levam ao mundo multirrevelador da nossa memória. Décio Torres Cruz é membro da Academia Baiana de Letras e, pelo jeito, deve logo estar ao lado do Antônio Torres na ABL. Talento não lhe falta. Pelo jeito, o Junco ainda tem muito a falar ao mundo. 

De um paralelo a outro

Por mais que os vídeos mostrem, o inacreditável ainda permanece estampado em nossa face quando novos e inexplicáveis comportamentos vão marcando a pauta das redes sociais bolsonaristas. Depois de marchas ridículas, cantos de hinos para pneus, gritos para prisões que nunca aconteceram ficar acampados dias à espera de um golpe de estado, agora é a vez do desespero. Um militar da reserva aparece rasgando todas as suas fotos de quando serviu ao Exército só porque não houve o golpe. Os militares passaram a ser covardes. Outros taxam Bolsonaro como covarde porque não “assinou” a intervenção federal. Dá a impressão de que eles estavam usando Bolsonaro e não o contrário. Saem de uma realidade paralela e criam uma outra realidade paralela.

A obra de 10 anos

Se na Bahia muitas obras se arrastam, Poço Verde, em Sergipe, mostra que as obras lá terminam. Demoram, mas terminam. O largo que une as avenidas Epifânio Dória e Capitão Narciso, em frente ao Banese, demorou dez anos para ser concluída. Agora é a vez do Largo da Trindade. Os canteiros estão em obras há muito tempo e os pessimistas dizem que desta vez o tempo será menor. Bom menor que dez anos ainda é um bom tempo, mas é menor que dez anos, entendem?

Apagão

Nossa amiga Dona Neoenergia está castigando Heliópolis. Na sexta-feira (06) tivemos um apagão por volta das 16:00 que durou até 19:30. Metade da cidade ficou às escuras, enquanto os funcionários da concessionária subiam e desciam ruas a busca da solução do problema. Isso aconteceu trocentas vezes e paliativos são feitos, mas o problema não é resolvido em definitivo. Cuidado, Dona Neoenergia! Não deixe que o povo sinta saudades da Dona Coelba!

Fatura antecipada

E por falar em Neoenergia, as contas de luz estão sofrendo mutação nas datas de vencimentos. Antes, algumas contas venciam no fim do mês. Com o tempo, as datas vão caindo sem que o usuário perceba. Isso quer dizer que, em dois ou três anos o usuário sempre paga uma conta a mais. Para quem tem alto consumo, o problema são as tarifas extras. Agora quem paga baseado no consumo mínimo, acaba pagando sempre mais, além das taxas. Pior é que ninguém reclama porque é quase imperceptível. Com a palavra o Ministério Público.

Economia perversa 

Depois da passagem irremediável das eleições, muitos prefeitos pisaram no freio da gastança. Um deles já avisou que carro para levar gente a Aracaju não tem mais, exceto os casos de tratamento oncológico e outros amparados por lei. Outro se limitou a anunciar aos auxiliares que só ele liberaria ordem para compras ou viagens. Como fica pouco no município, praticamente tudo parou. Um terceiro até que libera carro para os casos emergenciais, mas a volta fica por conta da família do ex-doente. Até ornamentação sofre com os cortes. Um prefeito, quem sabe para gastar menos, contratou uma empresa que nunca fez ornamentação e prestava serviços consertando poços artesianos. Claro, a contratada usou também parte da ornamentação do ano anterior, tudo em nome da economia! Isso tudo sem falar nas obras que pararam ou nem mesmo começaram. Só se vê gente com saudades das épocas das eleições. Neste período nada faltava e, sem nenhum exagero, até serviços eram oferecidos pelos políticos e agentes públicos. Brasil inigualável!

Economia necessária?

Ao contrário do que se comente nas redes sociais, a demissão de coordenadores, vice-diretores e diretores das escolas públicas municipais de Heliópolis não tem nada a ver com economia. Pelo menos foi o que afirmou nota enviada ao Contraprosa pela secretaria municipal de educação. Diz: “A exoneração dos gestores ocorreu devido ao DECRETO MUNICIPAL Nº 150, DE 13 DE OUTUBRO DE 2022, objetivando atender às condicionantes dispostas na LEI Nº 14.113, DE 25 DE DEZEMBRO DE 2020 (LEI DO NOVO FUNDEB), que em seu art. 14, § 1º,  I, versa sobre a complementação do VAAR (Valor Aluno Ano Resultado), o qual abarca sobre o provimento do cargo ou função de gestor escolar de acordo com critérios técnicos de mérito e desempenho. 

Assim, a gestão municipal tem buscado implementar a gestão democrática considerando não apenas o que dispõe a Lei Municipal nº 279/2007, art. 9º, que trata sobre a função gratificada de Diretor e Vice-Diretor de Escola, mas todo aparato legal para proporcionar um caráter de gestão escolar nas escolas. 

É um passo inicial que busca fazer diferença na forma como os gestores escolares são direcionados/nomeados nas unidades escolares da rede municipal de ensino. Nesse primeiro momento haverá a prioridade de seleção por mérito e desempenho, além da construção do plano de gestão escolar sob supervisão da secretaria municipal de educação e dos conselhos escolares. Esperamos, posteriormente, poder junto à rede, aprimorar esses critérios de seleção, incluindo outras etapas.”

Se isso realmente acontecer, será a primeira revolução na educação de Heliópolis. Vamos aguardar!

Do Sertão ao Centro-Oeste: Episódio 08 - BR 330, BA 160, uma ponte e a Barra!

Saindo de Xique-Xique, partimos em direção ao sudoeste. Nosso objetivo era chegar ao município de Barra, localizado na margem direita do São Francisco, mas ainda bem distante. É que Xique-Xique é um município enorme. Para se ter uma ideia, percorremos algo em torno de 40 kms para que as duas rodovias irmanadas, BA 160 e BR 330, fossem cada uma para o seu destino. A federal segue em direção de Gentio do Ouro e nós seguimos de volta ao Velho Chico. A rodovia é pedagiada. A concessão ficou com a Concef. Antes da ponte sobre o São Francisco, pagamos o mais caro pedágio: 19,60 para automóvel. Levando em consideração que já havíamos percorrido mais de 150 kms em pleno asfalto e sem nenhum perrengue, excetuando-se a multa, até que valeu a pena.

Chegamos finalmente a um dos objetivos da viagem, conhecer a nova ponte Barra/Xique-Xique. A obra possui mais de 1 km de extensão e foi construída sobre o Rio São Francisco, ligando a cidades de Barra e o município de Xique-Xique, com sua sede distante cerca de 90 kms.  É a ligação definitiva entre a região produtiva de Irecê e o oeste baiano do agronegócio. São 2,5 milhões de baianos que esperavam esta obra. Antes, balsas e barcos cumpriam o dever de transportar veículos e pessoas entre os dois lados do rio. Esperas que duravam cerca de uma hora. Tudo isso custou aos cofres públicos do Governo da Bahia um investimento de R$ 133 milhões. fruto da Parceria Público-Privada (PPP) entre a Secretaria de Infraestrutura do Estado (Seinfra) e a Concessionária Estrada do Feijão (Concef), com a participação da Agência Estadual de Regulação de Serviços Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (Agerba) como agente fiscalizador. Não há dúvida que o retorno será rápido. Só não dá para imaginar por que demoraram tanto para construir obra tão necessária.

O importante agora é que chegamos à cidade de Barra. Sua história é tão bela quanto sua gente. E começa lá pelos idos de 1670, quando um curral da Casa da Torre, de Dias D'Ávila, foi implantado nas barrancas do Rio Grande. A cidade nasce no exato ponto do encontro entre o Rio Grande e o bem maior São Francisco. Surge aí a Fazenda da Barra do Rio Grande do Sul e a exploração das terras para criação de gado. Depois vieram os padres para catequizar os índios dessas terras. Construiu-se então uma capela. A capela de São Francisco das Chagas, da Barra do Rio Grande do Sul. Hoje, após ampliações e restaurações, virou o Palácio Episcopal e Catedral de São Francisco das Chagas, localizada na Praça Barão de Cotegipe, coração da cidade de Barra.  

Mas é preciso contar a história com detalhes. A fazenda Barra do Rio Grande do Sul cresceu e virou arraial. Em 1698, já era uma povoação, reconhecida pelo próprio Dom José I, rei de Portugal. A Carta Régia foi assinada pelo então governador geral do Brasil, Dom João de Lancastro. Depois disso, o local ficou oficialmente conhecido como Povoação de São Francisco das Chagas, da Barra do Rio Grande do Sul. De povoação passou a vila em 1753, com o nome de Vila de São Francisco das Chagas da Barra do Rio Grande do Sul. Nessa época, a economia da vila era promovida pela criação de gado, pela lavoura e pelo beneficiamento de carnes e peixes. A população era composta por vaqueiros, lavradores, pescadores, produtores de rapadura, de cachaça, caixeiros viajantes, dentre outros.

Vale ainda uma informação importante. A região pertenceu à capitania de Pernambuco por mais de setenta anos. Chegou também a pertencer a Minas Gerais. Só em 1827, depois que o Brasil se tornou independente de Portugal, Dom Pedro I, Imperador do Brasil, incorporou à Província da Bahia a Comarca do Rio São Francisco com sede na Vila da Barra, o povoamento mais importante do Oeste. A transferência religiosa só aconteceu em 1853, quando a vila da Barra da diocese de Pernambuco passou para a diocese da Bahia.

Se hoje há dificuldades em cruzar os quase 600 kms que separam a região de Salvador, imaginem no século 19? Só havia uma linha dos Correios, com homens a pés, ligando Vila da Barra à Cachoeira, no Recôncavo Baiano, por três vezes ao mês. No início do século XX entre em cena o vapor Saldanha Marinho, trafegando entre Pirapora (MG) e Juazeiro (BA), com parada obrigatória por esta cidade. Sim, Barra não era mais vila, desde 16 de junho de 1873, promovida à cidade com o pomposo nome de Cidade Florescente da Barra do Rio Grande. No mesmo ano reduziu-se a denominação e passou a ser chamada Barra do Rio Grande. Em 1931 ficou apenas Barra.

Em divisão territorial de 1950 o município é constituído de 5 distritos: Barra, Buritirama, Ibiraba, Igarité e Piragiba. Em 09 de maio de 1985, desmembra-se de Barra o distrito de Buritirama, elevado à categoria de município. Já em 13 de junho de 1989, nasce o município de Muquém do São Francisco desmembrado do município de Barra. A partir daí, Barra passa a ter o seu distrito sede e mais dois: Ibiraba, que fica do outro lado esquerdo do São Francisco – direção norte, distante cerca de 10 kms em linha reta a partir de Xique-Xique. Neste distrito é iniciada a rodovia BA 161 ligando a povoação até Barra, sempre margeando à direita do São Francisco no sentido sul. A mesma rodovia, após Barra, segue margeando o rio Grande até se encontrar com a BA 351. Daí em diante, segue novamente a busca do Velho Chico e ao outro distrito: Igarité. Daí em diante vai rumo à BR 242.

Barra tem um povo que parece ter herdado a valentia dos seus povos primitivos, os Acroás, os Mocoazes, os Tupiniquins, Xacriabás, Caiapós, Cariris e Aricobés, base sólida dos seus 55 mil habitantes hoje, espalhados pelos 11.414,405 km2, numa densidade menor que 5 habitantes por km. Isso ajuda a enfrentar os vários obstáculos provocados pelo esquecimento de várias autoridades. Só em 1998 teve sua sede ligada à rodovia 242 e somente agora, em 2021, teve finalmente sua ponte ligando seu território a Xique-Xique. É um povo que sabe que a luta está só começando e ainda há muito a conquistar.

De Oliveira dos Brejinhos ao Tribunal de Justiça do Acre

A história de uma menina baiana pobre que se dedicou aos estudos e começa 2023 como juíza do TJ do Acre.

Trago hoje para os leitores do Contraprosa uma história real, que revela o poder da educação na vida de uma pessoa. Nossa personagem é Rosilene Santana Souza, de 38 anos, empossada juíza do TJ do Acre no dia 8 de dezembro passado. A história dela já seria um feito histórico se se tratasse de uma pessoa da classe média, ou filha de magistrados. Não. Na verdade, trata-se de uma garota nascida na região rural do município de Oliveira dos Brejinhos, nas proximidades do São Francisco e próximo a Ibotirama. O município tem uma população próxima aos 25 mil habitantes, com números educacionais desanimadores. De lá do sertão baiano, Rosilene saiu para ser juíza do Tribunal de Justiça do Estado do Acre. E mais! Foi a 1ª colocada no concurso.

Rosilene é a segunda filha de um total de sete irmaõs. Ela e sua irmã mais velha estudaram numa escola rural. Era um professor para ensinar todos os rebentos de todas as idades e faixas escolares do antigo ensino primário. Quando completou dez anos, a prefeitura não contratou professor para a localidade. Ela ficou dois anos sem estudar. Aos 12 anos, foi ela e a irmã morar num município onde residiam parentes da família, também em condições precárias. Dormiam num colchão de cama de solteiro, numa cozinha da casa. Mas elas não podiam reclamar porque havia escola. Trabalhou de doméstica por anos e, como não queriam voltar para a roça, com medo de não continuar os estudos, tentavam esconder as condições em que vivam e ainda, nas férias, iam para a roça ajudar os pais. Para melhorar a vida das filhas, a mãe levava temperos para vender na cidade e aumentar a renda das meninas. Elas chegaram a pedir restos de ossos no açougue para melhorar a alimentação. 

Da cozinha com colchão, as meninas passaram a uma casa sem banheiro, arranjada pela mãe. Aos 19 anos, Rosilene foi para Colatina, no estado do Espírito Santo. O sonho era estudar Direito e um dia ser juíza. Em Colatina as oportunidades eram bem melhores, mas a jornada ainda era enorme. Ela precisava de um bom emprego para não só financiar sua subsistência como para pagar uma faculdade. Foi aí que veio a ideia de um Curso Técnico em Edificações. O problema é que só eram vinte e cinco vagas e o seu conhecimento não chegava a tanto. Em contato com um professor particular, ele resolveu dar a ela um desconto de 50% nas aulas. Não pensou duas vezes. Quando o resultado saiu, Rosilene ficou na 21ª colocação. Com o diploma, conseguiu empregos melhores e pode entrar na faculdade. Antes de concluir o curso, conseguiu passar na prova da OAB. Sua formatura em Direito foi no ano de 2012, aos 28 anos.

Mas, para ser uma juíza é preciso experiência na área como advogado por, pelo menos, três anos. Rosilene trabalhou num escritório de advocacia até se firmar na vida. Ela queira ser juíza, mas a vida de advogada estava longe de permitir que ela estudasse com afinco. Foi aí que resolveu parar por um tempo e se dedicar aos estudos. Com o surgimento do concurso no Acre, fez a inscrição junto com outros 2.711 colegas. Ao final, seu esforço foi recompensado: ficou em 1º lugar e escolhida para ser a oradora no dia da posse.

Desde quando saiu o edital, há quase quatro anos, sonhamos muito por este momento. Enfrentamos a pandemia da COVID-19, o concurso chegou a ser suspenso, perdemos alguns colegas e tivemos que nos manter saudáveis estudando para a prova oral. Diante de tantas lutas, ingressar nesse tribunal no Dia da Justiça, é muito significativo e motivo de orgulho para todos nós. Precisamos lembrar que tomar posse na magistratura não é tornar-se um ser superior coberto de honrarias e distinções”, disse.

São as primeiras palavras da Dra. Rosilene Santana Souza, agora como juíza em Rio Branco, capital do Acre. E ela sabe que tudo só foi possível porque ela conseguiu pular as enormes dificuldades que nos colocam pela frente e que nos ajudam a desistir. Tenho impressão de que existem exatamente para fazer com que nós desistamos. E faço um paralelo com a escola que vivencio, o CEJDS. Nela, começamos com 500 alunos no ensino médio e terminamos o ano com 371 estudantes. Destes, 92 foram reprovados. Ou seja, de 500, apenas 279 conseguiram chegar ao fim da trilha deste ano com sucesso. É muito pouco para uma escola que oferece as três refeições, transporte escolar e ambiente razoavelmente confortável. Precisamos de mais Rosilenes. Não basta ter uma boa educação pública, é preciso que o aluno tenha determinação, objetivo e gana para buscar o que desejar.