Ninguém pode julgar o comportamento de um sujeito vivendo em condições de miserabilidade. (Foto: Marcello Casal/Ag. Brasil) |
Ouvi uma frase certa vez que dizia ser o brasileiro comum um ser com falha de caráter. Tudo isso para justificar a nossa capacidade de endeusar corruptos, assassinos, os fora-da-lei e não priorizarmos as ações republicanas no nosso agir cotidiano. E se formos olhar para a história, é possível encontrarmos homens que varreram este país com comportamentos, atitudes e ações que fogem completamente daquilo que possamos chamar de racional, adequado e aceitável. Quem não vai encontrar falhas de comportamento em figuras como Zumbi, D. Pedro I, Lampião, Getúlio Vargas e inúmeros personagens da história que eram bastante populares? E nem vou digitar aqui nomes do presente para que possa continuar com alguns leitores até o fim deste texto.
Mas, fato é que, todas as nossas desgraças são sempre creditadas nas costas do homem comum. Tudo que acontece neste país, de bom ou de ruim, tem como base de sustentação a argumentação seguida da expressão “em nome do povo”. E se alguém ousa desafiar o comum e apontar o erro da pessoa, vem um sempre a bradar um “está falando mal do Brasil”. É praxe nossas autoridades cometerem erros, inclusive grosseiros, e creditar ao povo o motivo. “Fiz para sanar a fome do povo” ou “É que você ainda não passou fome para entender o que fizemos”. Os dois mais populares candidatos a presidente, com índices nas pesquisas que chegam a 25% ou 40%, sempre se defendem dos atos praticados erroneamente com as palavras chaves povo, pátria, liberdade, família, fome. Prometem um mundo sempre melhor, que nunca vem. Acreditar nestas promessas, dizem, é ter falha de caráter.
Ora, então se acreditarmos em um mundo melhor for falha de caráter, o que será com aqueles que não cumprem o que prometem? Aqui, mentir para o povo é uma necessidade política. É preciso manipular verdades para ser visto como viável na esfera política. Se você está com o povo, aparece o financiador de campanha, que afirma estar ali para contribuir com o crescimento da cidade, do estado ou do país! Mentira! Vai querer cada centavo que gastou na campanha... e os juros! Uma vez disse isso a um emprestador de dinheiro e ele me disse que “o povo quer isso: vencer!. Não importa que o político seja um péssimo administrador. O povo precisa sonhar sempre!”. Foi a coisa mais cruel que já ouvi em toda minha vida.
Em suma, a mentira, a vitória, a corrupção, a sacanagem, a guerra... Tudo é pelo povo! E eu me questiono quando vejo pessoas bem educadas, com diplomas, sem nunca sofrerem perrengues sociais, praticando os mesmo defeitos: ou sonhando como o povo, ou corrompendo a república. Podem procurar todas as justificativas para sustentar tal comportamento, eu não me acho apto a entender. Na minha cabeça, as pessoas que possuem conhecimento o usam para o bem ou para o mal. E as pessoas más, de posse do conhecimento, são um perigo para a sociedade, principalmente se são populares. A história está cheia de exemplos.
Por fim, se o brasileiro comum, que aceita votar num corrupto ou num negacionista, tem falha de caráter, o que dizer de um brasileiro com diploma superior que apoia, assina, defende e divulga comportamentos não republicanos? Se o brasileiro comum, sem formação, sem condições para estudar, lutando apenas para não ficar sem o pão e a busca de um teto para abrigá-lo, acreditando em promessas que nunca se consolidam, tem falha de caráter, o que dizer dos que prometem e não cumprem, dos que financiam tais promessas e dos que, com conhecimento, apoiam tais promessas?