Blog do Rodrigo Matos – do UOL
O governo federal destinou
diretamente R$ 63 milhões para a reforma de 24 estádios que serão candidatos a
receber treinos de seleções para a Copa-2014. Esse valor foi obtido pelo blog
em levantamento em dados oficiais da União e contraria o discurso da presidente
Dilma Rousseff de que não houve dinheiro do orçamento federal para arenas do
Mundial. Antes, o UOL Esporte demonstrara que a União dera R$ 1,1 bilhão de
forma indireta para os estádios que serão usados nos jogos, diferentemente do
que dissera a presidente.
O despejo de dinheiro público
federal em estádios para treinos do Mundial começou a ocorrer no final de maio
e se estendeu pelo mês de junho deste ano. Durante esse período, o Ministério
do Esporte assinou convênios e empenhou (destinou dinheiro para determinado
fim) recursos para essas arenas que poderão servir como centro de treinamentos
para seleções – isso se forem escolhidas pelos times.
Coincidentemente, no dia 21 de
junho, a presidente Dilma Roussef declarava que jamais permitiria que recursos
do orçamento federal fossem usados para a reforma de “arenas” em detrimento de
setores prioritários como saúde e educação. Naquele momento, ela se prendia a
um aspecto técnico para negar investimento em locais que serão usadas em jogos
do Mundial, já que havia dinheiro de uma empresa estatal, incentivo fiscal e
juros subsidiados nas reformas e construções. E o Ministério do Esporte
afirmava: “não há um centavo do orçamento da União direcionado à construção ou
reforma das arenas para a Copa.” Mas
essa argumentação não resiste ao uso direto do dinheiro do governo para a
modernização de estádios para realizar treinos de seleções.
É importante lembrar que, na
Africa do Sul, a Fifa aumentou em US$ 100 milhões o orçamento dos organizadores
locais para melhorias nos centros de treinamentos de seleções. No Brasil, quem
vai pagar boa parte dessa conta é o governo federal. Tanto que a conta do
investimento em CTs já chega a cerca de R$80 milhões, com a soma de outros seis
projetos de centros que não são em estádios.
O Ministério do Esporte até já
informara que destinaria dinheiro aos CTs públicos. Só não explicou que o
montante do investimento seria tão alto, nem que seria destinado a arenas.
O blog fez um levantamento em
todos os pagamentos feitos pelo Ministério do Esporte neste ano para encontrar
todos os convênios relacionados à Copa-2014. Encontrou gastos previstos em 13
Estados do Amapá ao Rio Grande do Sul. Vários deles estão longe das
cidades-sedes do Mundial, e de qualquer acesso fácil a aeroportos centrais.
Um exemplo disso é o Estádio
Zerão, em Macapá. Está a 1071 km de Manaus, o local de jogos mais próximos, e
tem limitadas possibilidades de vôos para o restante do país. Nem por isso
deixará de receber R$ 4,1 milhões da União para se adaptar ao ‘padrão Fifa’. O
Mangueirão, também longe 1.146 km de Fortaleza, cidade-sede mais próxima, terá
outros R$ 2,3 milhões para o mesmo fim. Outros Estados que estão fora do
circuito dos jogos como Santa Catarina, Goiás e Alagoas também terão os seus
estádios reformados com a desculpa da Copa-2014.
Ressalte-se que a utilização dos
CTs no Mundial dependerá da escolha das seleções. Se nenhum dos times optar
pelo local, ele ficará de fora da competição. Outra observação relevante é que
times nacionais de países fracos economicamente costumam atrair poucos
turistas, ou jornalistas. Ou seja, o impacto financeiro para a cidade pode ser
quase nulo se um país pequeno adotar a cidade.
Há, sim, casos de seleções que
optam por centros mais distantes, como ocorreu com a Espanha na Copa-2010. Mas,
em geral, tentam escolher lugares em que conseguem ter acesso a aeroportos
centrais em no máximo duas horas. Tanto que os espanhóis estavam a menos de 200
km da capital Johanesburg.
Central, São Paulo é o Estado que
receberá o maior investimento federal em CTs, com dinheiro destinado a arenas
em São José dos Campos, São Caetano, Guarujá, São Bernardo, Piracicaba e Itu. O
Anacleto Campanella, com R$ 6 milhões, e o Estádio Martins Pereira, em São José
dos Campos, representarão os maiores gastos com cerca de R$ 6 milhões cada um.
Nenhum deles recebe uma média de público significativa durante a temporada.
Questionado sobre esses
investimentos em arenas pelo blog, o Ministério do Esporte afirmou que entende
que isso é um legado para as cidades. “Uma das missões do Ministério do Esporte
é o fomento à prática esportiva e o aprimoramento dos equipamentos públicos
esportivos em todo o território nacional. (…) Como parte do plano de
nacionalização da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos e da construção do legado
esportivo dos dois eventos, um conjunto de equipamentos está sendo reformado
para atender às diversas regiões do País, em particular às cidades que não
serão sede dos torneios.”
A argumentação de que há um
legado pós Copa fica bastante prejudicada ao se constatar que Macapá, Guarujá,
Maringá, Tocantins, entre outros beneficiados, estão longe de ser grandes
centros do futebol nacional. Ou seja, a necessidade de ter estádios novos é, no
mínimo, questionável.
Para o Ministério, porém, só
estar na lista de CTs oficiais para Copa representa uma oportunidade de
negócios para as cidades. Não foi explicado que negócios poderiam ser obtidos
por um município simplesmente por estar em uma relações de candidatos a receber
seleções no Mundial, sem nenhuma garantia de eficácia.
Mais importante do que isso,
perguntado sobre a contradição do gasto com estádios e o discurso da presidente
Dilma, o ministério se recusou a responder.