Governadores controlam máquina de
105 mil cargos sem concurso público. Pesquisa do IBGE revela que apenas na
administração direta dos Estados havia, em 2012, mais de 74 mil servidores com
indicação política, número 17 vezes maior que o existente no governo federal.
Daniel Bramatti e José Roberto de
Toledo, de O ESTADO DE SÃO PAULO
(Estadão Dados)
Campanha pelo concurso tenta moralizar o poder público |
A primeira pesquisa completa
sobre a estrutura burocrática dos Estados, realizada pelo IBGE, revela que os
27 governadores empregavam em 2012, em conjunto, um contingente cerca de 105
mil funcionários que não fizeram concurso para entrar na administração pública.
Se todas essas pessoas se reunissem, nenhum dos estádios da Copa de 2014 - nem
mesmo o Maracanã - teria capacidade para acomodá-las.
Apenas na chamada administração
direta, da qual estão excluídas as vagas comissionadas das empresas estatais, o
número de funcionários subordinados aos gabinetes dos governadores ou às
secretarias de Estado sem concurso público chega a 74.740, o suficiente para
ocupar 98% do maior estádio do Brasil. No governo federal há 4.445 servidores
sem concurso em cargos de confiança na chamada administração direta, ou 0,7% do
total dessa categoria. Já nos Estados, a proporção chega a 2,8%.
Gestão indireta
Na administração indireta dos
governos estaduais - autarquias, fundações e empresas públicas, segundo a
metodologia da Pesquisa de Informações Básicas Estaduais, do IBGE -, há outros
30.809 servidores comissionados não concursados, contingente que encheria
metade do estádio Beira Rio, em Porto Alegre. No governo federal, são 1.300,
mas qualquer comparação é indevida, pois o conceito de administração indireta
não é o mesmo nas diferentes esferas.
Líder
Do total de 105,5 mil servidores
sem concurso nos Estados, quase 10% estão em Goiás. O governador Marconi
Perillo (PSDB) abriga em sua burocracia 10.175 funcionários nessa situação, o
que o torna líder no ranking desse tipo de nomeações em números absolutos. A
Bahia, governada pelo petista Jaques Wagner, vem logo atrás, com 9.240 não
concursados.
Ao se ponderar os resultados pelo
tamanho da população, os governadores que saltam para a liderança do ranking
são os de Rondônia, Confúcio Moura (PMDB), e do Distrito Federal, Agnelo
Queiroz (PT), com 937 e 263 cargos por 100 mil habitantes, respectivamente. Os
oito governadores do PSDB controlam, em conjunto, 37,6 mil cargos ocupados por
servidores não concursados. Os quatro governadores do PT, por sua vez, têm em
mãos 23 mil vagas. Logo atrás estão os quatro do PMDB, com 21,6 mil. O peso dos
partidos muda quando se pondera a quantidade de cargos controlados por 100 mil
habitantes. Nesse caso, o PT passa para o primeiro lugar (75), e o PSDB cai
para o quinto (41).
Função política
Em teoria, os cargos de livre
nomeação servem para que administradores públicos possam se cercar de pessoas
com quem têm afinidades políticas e projetos em comum. Na prática, no entanto,
é corrente o uso dessas vagas como moeda de troca. Além de abrigar seus
próprios eleitores ou correligionários, os chefes do Executivo distribuem as
vagas sem concurso para partidos aliados em troca de apoio no Legislativo ou em
campanhas eleitorais.
"Os critérios e métodos de
composição de governo que servem para a esfera federal se reproduzem nos
Estados", observa o cientista político Carlos Melo. "A grande reforma
política que poderíamos fazer seria reduzir ao mínimo esses cargos, tanto no
âmbito da União quanto no dos Estados e municípios. Faremos? Creio que não. Não
interessa ao sistema político."
Cargos de livre nomeação também
podem ser usados para atrair para a máquina pública profissionais qualificados
que não têm interesse permanente. Mas a pesquisa do IBGE mostra que nem sempre
isso acontece. Em Goiás, por exemplo, 49% dos comissionados têm apenas o ensino
fundamental, segundo registros oficiais. O governo diz que não controla a
escolaridade (leia texto abaixo). No governo federal, apenas 1,4% dos
comissionados têm escolaridade até o 1º grau.
"Não podemos tirar nenhuma
conclusão sobre a competência dos servidores, mas são evidentes os critérios
utilizados para nomear pessoas para o serviço público", avalia o cientista
político Sergio Praça. "Em termos de estruturação administrativa, os
Estados estão atrasados em relação ao governo federal."