Marcelo Pellegrini – de CARTA
CAPITAL
Lourival Mendes - autor da PEC 37. |
Para os delegados, é a PEC da
Legalidade. Para os promotores, a PEC da Impunidade. A forma como a Proposta de
Emenda Constitucional (PEC 37/2011) tem sido tratada fora do Congresso dá o tom
do embate entre as policias civis e federal, encabeçados pela Adepol
(Associação dos delegados de Polícia), e os integrantes do Ministério Público.
O receio destes é justificado: o projeto, de autoria do deputado Lourival
Mendes (PTdoB-MA), pretende retirar os poderes de investigação de promotores e
procuradores da República. Por causa da proposta, têm circulado pelo Congresso
cartilhas sobre as atribuições constitucionais da Polícia e do MP. Ao mesmo
tempo, palestras dentro e fora das categorias interessadas são organizadas pelo
País.
Debate sobre se o Ministério
Público deve ter poderes investigatório suscita teorias de um possível contra-ataque
de parlamentares denunciados pelo órgão. Foto: José Cruz/Agência Brasil
De acordo com a Constituição, os
únicos órgãos com permissão para tocar as investigações criminais são a Polícia
Civil e Federal. No entanto, a exigência do Ministério Público se apoia em um
tratado internacional do qual o Brasil é signatário e assegura seus direitos de
investigação. Em uma carta assinada por diversas entidades ligadas ao MP
defende-se que “sendo o Brasil subscritor do Estatuto de Roma, que criou o
Tribunal Penal Internacional, fez opção no plano internacional por um modelo de
Ministério Público investigativo, sendo impensável que no plano interno seja
(…) impedido de investigar”.
De acordo com a carta, a PEC
significaria, se aprovada, um desrespeito a princípios do direito internacional
e isolamento brasileiro em relação aos demais 120 países subscritores do
estatuto.
Para o vice-presidente do
Ministério Público Democrático, Roberto Livianu, a PEC indica que os interesses
que inspiram o Poder Legislativo nem sempre são democráticos. “A proposta é
produto da reação de pessoas investigadas e processadas pelo Ministério Público
e que querem cercear e enfraquecer a atuação do órgão”, argumenta Livianu.
Segundo ele, a PEC é uma forma de reconhecimento, mesmo que distorcida, do
trabalho do MP. Como exemplos, o promotor relembra grandes casos investigados
pelo Ministério Público como o “mensalão”, os bicheiros do Rio de Janeiro e o
Esquadrão da Morte, em São Paulo.
Em resposta, Paulo D’Almeida,
presidente da Adepol, argumenta que acima de qualquer tratado internacional
deve-se assegurar o que diz a Constituição Federal. Segundo ele, muitas vezes a
Promotoria atravessa as investigações policias visando um retorno midiático. “O
Ministério Público trabalha de forma seletiva e midiática nas escolhas das
investigações”, afirma. “Além disso, a polícia deve ser fiscalizada pelo MP,
mas quem fiscaliza a atuação e os procedimentos dos promotores?”, indaga.
Por lei, o Ministério Público
deve agir como o fiscalizador da lei, titular da ação penal e o responsável
pelo controle externo da polícia. As investigações sobre o MP, prevê a lei,
devem ser averiguadas por uma comissão interna do próprio órgão.
Uma polícia fraca
Um dos principais pontos de
atrito entre as entidades diz respeito à capacidade da polícia em cuidar dos
processos investigatórios sozinha. Para Livianu, hoje não há recursos humanos e
financeiros para a Polícia Civil e Federal tocarem as investigações sem o
auxílio do Ministério Público. Por isso a proposta é chamada de PEC da Impunidade
pelos promotores.
Outra questão-chave é a
dependência da polícia em relação ao Poder Público local, em particular nos
pequenos municípios. “A polícia não tem a força necessária para realizar os
trabalhos investigatórios porque é um organismo que em seu estatuto não tem as
garantias que o Ministério Público tem, como a vitaliciedade e a estabilidade
profissional de ser um agente do Estado e não um servidor público”, explica o
vice-presidente do Ministério Público Democrático.
A realidade de dependência dos
promotores é admitida pelos delegados. No entanto, no entendimento da Adepol,
um órgão não pode ser fortalecido em detrimento de outro. “O MP deve respeitar
a atribuição da polícia e trabalhar para fortalecer o órgão e reivindicar
nossas necessidades. Isso sim é trabalhar em cooperação”, diz o delegado
D’Almeida.
Para ele, com o fortalecimento da
polícia o Ministério Público trabalharia melhor e menos sobrecarregado. “Temos
que fazer uma polícia de Estado e não de governo por meio do fortalecimento de
nossas corregedorias. Concomitante a isso, o MP deve investigar improbidades e
omissões da polícia”, defende. “Assim, cada um faz sua parte e todos cumprem o
que a Constituição diz.”
Outro temor em relação à proposta
é a possibilidade de todas as condenações obtidas por meio de investigações do
MP serem cassadas após a investigação da PEC 37. No entanto, de acordo com
D’Almeida, a PEC 37 assegura que, junto à sua aprovação, seja adicionado o
artigo 98 ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição
Federal. Este artigo garantiria o respeito às decisões jurídicas anteriores,
baseadas em investigações do Ministério Público.
Tramitação
Até o momento, a PEC 37 já obteve
o número mínimo de votos em uma Comissão Especial para ser votada no Plenário
da Câmara, embora siga sem uma data estabelecida para a apreciação. A proposta
ainda precisa ser votada em dois turnos no Plenário da Câmara antes de seguir
para o Senado.
Caso seja aprovada na Câmara, o
Ministério Público promete entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade
(Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF).
O deputado federal Lourival
Mendes (PTdoB-MA) não respondeu à reportagem até o seu fechamento. A assessoria
do parlamentar orientou a reportagem a obter eventuais esclarecimentos sobre a
proposta com a Adepol, uma das partes interessadas do texto.
Deste blog: A aprovação desta
Proposta de Emenda Constitucional será mais uma contribuição do nosso Congresso
Nacional aos corruptos deste país.