DIMMI AMORA – da Folha de São Paulo
Seca provoca morte de gado em propriedade rural em Flores (PE) (Foto: Lula Marques/Folhapress) |
Maria Irene Alves Rodrigues, 44, gastou R$ 480 na última
compra do mercado para alimentar sete pessoas que vivem com ela na zona rural
de Araripina, sertão de Pernambuco, uma das 1.072 cidades em estado de emergência
pela seca no Nordeste. Como 73,5% dos eleitores desses municípios, Maria Irene
votou na presidente Dilma Rousseff em 2010 e conta que, antes da estiagem
destruir suas roças de milho, mandioca e feijão, vivia melhor: vendia parte da
produção, gastava menos de R$ 350 no mercado e ainda comprava carne, goma para
tapioca e mortadela. Ela recebe R$ 134 do Bolsa Família e R$ 622 da
aposentadoria rural do pai, Elvídio Rodrigues, 82. Nas cidades onde as chuvas
são escassas desde outubro de 2011, pelo menos duas em cada três famílias
recebem algum benefício assistencial do governo. Esse dinheiro, cerca de R$ 1
bilhão por mês, não é suficiente para atenuar os efeitos da pior estiagem em
décadas. O resultado é uma profunda crise econômica, mas não como em outras
ocasiões, quando a falta de chuvas gerava um flagelo social com mortalidade
infantil, migração em massa e saques. O clima na região é de apreensão, como a
Folha constatou numa viagem de quase 2.000 quilômetros feita em julho por
Pernambuco, Alagoas e Bahia, na qual visitou dez cidades afetadas pelo clima. "Tempo
de seca é tudo uma coisa só. Mexeu com seca, mexeu com sofrimento", relata
o agricultor Expedito Raimundo da Silva, 47, que perdeu metade do faturamento
com a venda de orgânicos em Ouricuri (PE). Expedito e Maria Irene formam o
bloco eleitoral que ajudou a garantir a vitória de Dilma. Nas cidades na seca,
ela teve 5 milhões de votos a mais que seu adversário, José Serra. No restante
do país, a diferença foi de 7 milhões. A votação expressiva foi resultado dos
programas federais e da geração de empregos durante a gestão Lula. Também houve
investimento em grandes obras e pequenos investimentos públicos em urbanização.
Os projetos, contudo, não garantiram estrutura adequada. "Não fosse essa
cisterna, eu tava passando sede morando de frente pro rio", conta
Francisco Ferreira da Silva, 56, que vive em Delmiro Gouveia (AL), cidade
cortada pelo rio São Francisco. A cisterna de Francisco é do programa Água Para
Todos, de Dilma, reciclagem do Um Milhão de Cisternas, promessa do
ex-presidente Lula. Somando as duas gestões, o governo fez 450 mil delas,
metade do prometido. Mesmo com o baixo desempenho, são elas hoje a principal
estrutura do sertanejo para enfrentar a seca. Isso porque, além das construídas
com recurso federal, prefeituras, governos estaduais e os próprios moradores
ergueram as suas. A água das cisternas, porém, não é suficiente para dar de
beber aos animais, que, nessa região, são como poupanças das famílias. Sem a
renda rural, onde vive a maioria da população, o comércio míngua, levando a
crise para a zona urbana. O governo federal prometeu R$ 2 bilhões em
investimentos para minimizar os efeitos da estiagem, mas a ajuda chega de forma
irregular e a burocracia impede parte da população de acessá-la. Nesse pacote,
Maria Irene recebeu a sua cisterna do governo. "Este ano não voto de graça
para ninguém."