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Heliópolis muito além dos 36 anos


Nos anos de trinta, o senhor José Pequeno, de fato ainda pequeno, recebia uma moeda das mãos de uma senhora por ter recolhido gravetos para o fogão de um restaurante aberto naquele descampado. O nome desta senhora era Maria de Marcionílio e o seu comércio foi a primeira casa erguida localizada abaixo da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, na trilha que seguia para a Pindorama. Antes disso, Heliópolis era só uma igreja rodeada de fazendas. Seu Pequeno não se cansa de repetir: Heliópolis nasceu pelas mãos de uma mulher. Apesar da constatação, o nome que mais aparece na construção da história do município é de José Umburana, que cortava carne embaixo de um provável cajueiro nos dias de sábado. A denominação inicial de Pau Comprido é mais folclórica que real, mas revela a omissão do fato de tudo se consolidar com o trabalho de uma mulher. A questão é cultural.

Seja como for, daquele restaurante brotou uma povoação que abrigou tropeiros e vaqueiros que cortavam a região com destino ao comércio de gado em Simão Dias, no estado de Sergipe. Não demorou muito a formar identidade própria e a se tornar Novo Amparo, povoado ligado ao município de Ribeira do Amparo. O nome Heliópolis veio da lavra intelectual do Padre Mendonça. O crescimento vertiginoso por estas bandas era fruto de um povo que sempre sonhou na labuta por um espaço no paraíso do sossego. O grande problema sempre foi a falta da água em períodos de grande estiagem. Com a construção da barragem do açude da Pindorama, na década de cinquenta, um novo crescimento se fez realidade. O povoado cresceu mais que a sede do município. Com a eleição de José Dantas de Souza, conhecido por Nozinho, morador e fazendeiro do então povoado, começam as lutas pela emancipação, consolidada no dia 11 de abril de 1985.

Não precisa pormenorizar quão grande foi a transformação vivida por Heliópolis nestes 36 anos. Como os mais de 5.500 municípios brasileiros, evoluiu em muitas coisas e decaiu em outras. Do ponto de vista econômico, ainda há muita estrada a percorrer porque ainda somos exportadores de mão de obra para São Paulo. Sem cálculos precisos, há uma outra Heliópolis espalhada por Salvador, litoral paulista, Aracaju, capital e interior de São Paulo. Alguns sempre retornam, outros de quando em quando e alguns para nunca mais. A cidade ainda não está preparada para manter os seus por aqui. Dos trabalhadores comuns a médicos ou advogados, nosso heliopolitano leva sua inteligência e força para construir outros vários pedaços de Brasil por aí a fora, sem falar nos que estão nos Estados Unidos, França e além.

Mas há quem diga que podemos melhorar e muito. Para isso, é necessária uma renovação no modo de encarar a educação e a política. Precisamos ver a escola como oportunidade de ampliar nossos horizontes, como chance de vivenciar o mundo da ciência. Não pode ser apenas uma obrigação, mas, antes de mais nada, uma necessidade. O professor precisa ver a escola como algo além do emprego e o aluno tem que encará-la como uma escada até a evolução plena e máxima possível. Não é um fardo, mas não é fácil. Nada acontece por acaso. Por detrás dessa visão da educação como um fardo está o pensamento político. A política por aqui ainda é um grande negócio, ou, no mínimo, uma grande troca. Essa herança cultural maldita pode ser o mal maior de todos os males. São os prefeitos os responsáveis pela implantação de políticas públicas. Se algum prefeito é eleito pela força do dinheiro, com a compra de votos por exemplo, financiada por empresários gananciosos, a última coisa que teremos é um poder público voltado para a solução dos problemas do município.

Mas Heliópolis tem uma capacidade especial de superar problemas. Há uma gente aguerrida, trabalhadora, inteligente e talentosa que suportou casos escabrosos. Quem não se lembra daquele prefeito que falsificou uma lei, usando o mesmo número da lei que criou a Rua Ulisses Guimarães, a de nº 100. Depois que descobrimos, levaram o Livro de Leis para comprovar e um milagre aconteceu: um bandido roubou o livro. Não levou nada de valor, apenas o livro. O prefeito continuou prefeito, nunca foi afastado, mas superamos o caos. Tivemos aqui Polícia Federal, concursos públicos fraudados, desvios enormes de recursos, estradas que são feitas e quase abandonadas depois. E tudo isso não nos desanimou. Vai ficar na história a união de muita gente que fez na BA 393 o que o governo deveria ter feito, pelo menos a nível de paliativo.

Não vamos aqui jogar para a galera e dizer que está tudo bem. Nossa estrada precisa ser recuperada, nossa saúde precisa ser 24 horas, nossos filhos precisam nascer por aqui, nossas ruas não precisam esperar 100 dias de governo para receber iluminação, precisamos de mais emprego, precisamos cuidar da periferia, inclusive resolver os inúmeros problemas do Bairro Santos Dummont. Precisamos também melhorar as estradas, dar mais suporte ao agricultor, incentivar o empreendedorismo, valorizar mais a inteligência e a disposição. Ainda há um longo caminho, mas temos o que mostrar ao mundo. O São Pedro de Heliópolis e Os Barões da Pisadinha são exemplos de que é possível ir além das nossas fronteiras, das nossas possibilidades. Muito mais que anos de vida, que estes 36 anos sejam apenas o início da eternização de uma sociedade que se encontre, que se veja, que se entenda e que coloque em prática suas mais dignas possibilidades, buscando sempre a proteção dos seus, direcionado a um norte de progresso, justiça e igualdade social.

Parabéns, Heliópolis, pelos seus 36 anos!