Enquanto alguns poucos
procuradores e juízes se dedicam a revelar os meandros da corrupção no Brasil,
pessoas se digladiam nas redes sociais defendendo o seu corrupto favorito ou
difundindo ideias de algum populista de plantão. Ao lado dessa guerra verbal,
reveladora de um país doente, os vilões tentam continuar no comando, enquanto
uns poucos tiram leite de pedras para transformar uma realidade que parece
querer se eternizar. Por aqui, distante de tudo, no Brasil que aparece vez ou
outra na série “Brasil que eu quero”, da Rede Globo, parece que nada vai mudar
tão cedo. A política ainda é um grande negócio, mais parecida com o enredo de
uma mega série “Onde os corruptos nascem fortes”.
Foi isso que, entre tantos outros
casos, revelou o Ministério Público este ano. Calma! Não foi o de Cícero
Dantas. Trata-se do Ministério Público Federal (MPF) de Bom Jesus da Lapa, no
oeste da Bahia, que ajuizou 17 ações contra atos de improbidade administrativa.
O órgão aponta que, somados, os recursos tratados nas ações, contabilizam mais
de R$ 7,5 milhões em prejuízo, nas áreas de Educação e Saúde, por desvios de
verbas e danos aos cofres públicos em nove municípios baianos. Entre os
acionados, estão os atuais prefeitos de Correntina, Macaúbas, Morpará e
Paratinga. A lavra é de autoria do procurador da República Adnilson Gonçalves
da Silva.
A pedido do MPF, a Justiça
Federal determinou o bloqueio de bens no valor de R$ 30.409,84 da coordenadora
do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) no município de Lapa, Flávia
Carvalho Garcia, por desvio de recursos federais do programa. A ré é acusada de
se apropriar de todos os itens adquiridos com a emissão dos cheques, em
detrimento dos alunos e das escolas em Bom Jesus da Lapa, com o uso indevido de
pelo menos 21 cheques, no ano de 2013, colocando assinaturas falsificadas ou
preenchendo de maneira abusiva os cheques que lhe foram confiados em branco e
já assinados por presidentes ou tesoureiros dos colegiados escolares do
município.
Em outro caso, o MPF requereu a
indisponibilidade de bens e a Justiça Federal determinou integralmente o
bloqueio de até R$ 308.869,94 da Farmácia Graça e do seu representante,
Vinícius Dias da Rocha. Os réus foram denunciados por desvio de recursos
federais do Programa Farmácia Popular do Brasil (PFPB), atuando na simulação da
venda de medicamentos, no ano de 2012. De acordo com as investigações, foram
constatadas dispensas de medicamentos que não foram adquiridos pelo
estabelecimento ou em quantidades superiores às aquisições, como também foram
realizadas dispensas de medicamentos em nome de pessoas já falecidas, gerando
enriquecimento ilícito dos acionados.
No município de Boquira, o MPF
acionou o ex-prefeito do município Edmilson Rocha de Oliveira e mais 10 por
danos ao erário e desvios de recursos do Fundeb - Fundo de Manutenção e
Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da
Educação, durante a gestão de 2009 a 2012. As investigações apontaram que
Oliveira participou de fraudes na licitação do Pregão Presencial nº 001/2009 e
Pregão Presencial nº 006/2011 para a contratação da cooperativa de fachada
Transcops. A empresa seria encarregada de prestar serviço de transporte escolar
no município. Além do direcionamento da licitação, houve o superfaturamento de
preços no pagamento por quilometragem – superior ao que realmente era
percorrido pelos veículos escolares –, como também lucros injustificados,
revertidos para os dirigentes da entidade e para agentes públicos.
Na cidade de Morpará, o MPF acionou
o atual prefeito Sirley Novaes Barreto (Lelei) e a ex-prefeita do município
Edinalva Pereira de Almeida pela não prestação de contas de gastos com a
construção de uma creche. Segundo o órgão, a prefeitura recebeu R$ 948.168,75
em verbas federais, no entanto, executou apenas 54,13% das obras até a data de
expiração do convênio, e não prestou contas ao FNDE - Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação. O prazo final para o registro dos dados da
prestação de contas foi encerrado em janeiro de 2017.
Em Paratinga, o MPF acionou o
atual prefeito Marcel José Carneiro de Carvalho por contratação irregular de
funcionários e desvio de finalidade com recursos do Fundeb, na sua gestão de
2009 a 2012. Segundo as investigações, os funcionários foram contratados pela
prefeitura para prestar serviços de limpeza dos órgãos municipais. No entanto,
o prefeito utilizava verbas da educação para pagá-los, simulando a contratação
de professores para justificar os pagamentos. Durante o ano de 2011, foram
pagos aos funcionários o total de R$117.154,40, dos quais pelo menos R$
16.340,40 eram recursos do Fundeb. Também a pedido do MPF, a Justiça Federal
determinou integralmente o bloqueio de bens de até R$ 983.940,00 de Carvalho e
mais três pessoas por danos ao erário e desvios de recursos federais da Funasa
- Fundação Nacional de Saúde, na gestão de 2009 a 2012. A ação refere-se ao
Convênio nº 0796/2009, firmado entre a prefeitura e a Construtora Marfim Ltda,
que tinha por objeto a execução de 28 melhorias habitacionais para o controle da
doença de chagas. No entanto, embora o Município de Paratinga tenha recebido
todo o valor conveniado - R$ 400.000,00 - e pagado R$ 415.518,35 à contratada,
foram concluídas apenas 14 unidades habitacionais. Além disso, o prefeito
atestou, falsamente, a execução integral da obra perante a Funasa, por meio da
declaração de “Alcance dos Objetivos” e do “Termo de Aceitação Definitiva da
Obra”.
Em Correntina, a Justiça Federal
determinou o bloqueio de bens de até R$ 64.323,04 do atual prefeito Nilson José
Rodrigues (Maguila) e mais quatro por danos ao erário e desvios de recursos
federais referentes ao Plano Nacional de Implantação de Unidades Básicas de
Saúde para Equipes de Saúde da Família, na gestão de 2009 a 2012. De acordo com
o MPF, houve fraude em licitação para a construção de uma Unidade Básica de
Saúde (UBS) no município (Tomada de Preços nº 005/2010), com superfaturamento
de preços e vícios na construção. A licitação foi simulada e direcionada para a
contratação de uma empresa que não possuía nenhum empregado registrado em seus
quadros até 2016 – cinco anos após a ordem de serviço que autorizou o início da
execução das obras.
O MPF acionou também o atual
prefeito de Macaúbas, Amélio Costa Júnior (Amelinho), e mais cinco, por danos
ao erário, desvios de verbas federais da Educação e por fraude a licitação,
durante a gestão de 2009 a 2012. Segundo o MPF, os réus direcionaram a
licitação Tomada de Preços nº 032/2009 para a construção de uma creche, com
recursos repassados integralmente pelo FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento
da Educação, totalizando R$ 940.500,00. No entanto, o Município contratou,
irregularmente, a empresa Adepres - Agência de Desenvolvimento e Prestação de
Serviços Ltda, simulando e direcionando o procedimento licitatório. A pedido do
MPF, em outras três ações de improbidade, a Justiça Federal determinou o
bloqueio de bens de Costa Júnior e mais cinco no valor de até R$ 6.157.366,66
por fraude a licitação, danos ao erário e desvios de recursos federais do
Fundeb na gestão de 2009 a 2012. Segundo o MPF, os réus fraudaram o Pregão
Presencial nº 053/2011, a Carta Convite nº 047/2010, o Pregão Presencial nº
063/2010 e o Pregão Presencial nº 076/2010, todos destinados à aquisição de
materiais de papelaria e impressão. De acordo com as investigações, houve
superfaturamento nos preços e os pagamentos foram realizados sem a devida
verificação da prestação dos serviços ou entrega dos produtos.
O MPF acionou ainda o ex-prefeito
de Serra Dourada Enilson Fagundes Melo, e mais dez, por danos ao erário e
desvios de recursos públicos do FNDE. O Município selecionou e contratou a
empresa Oliveira Machado Comércio de Peças e Serviços Ltda – Epp, por meio da
licitação Tomada de Preços nº 017/2011 para a construção de uma creche. No
entanto, de acordo com as investigações, houve fraude a licitação, além de
pagamentos indevidos, com base em boletins de medição da obra ideologicamente
falsos, que não refletiam os serviços realmente executados. O Município
repassou à contratada mais de 80% dos recursos - R$ 1.068.912,47 -, entretanto
foram executados apenas 54,96% das obras, permanecendo paralisadas e inacabadas
desde 2012.
Também foi acionado pelo MPF o
ex-prefeito de Serra do Ramalho Carlos Caraíbas de Souza, e mais onze pessoas,
por fraude a licitação, danos ao erário e desvios de recursos do Fundeb. A ação
refere-se à fraude nos procedimentos licitatórios Carta Convite nº 005/2008 e
Carta Convite 006/2008, no ano de 2008, destinados à contratação de mão de obra
para reforma de escolas e construção de quadra poliesportiva no município,
respectivamente. Segundo o MPF, os três licitantes preencheram de maneira
idêntica o formulário padrão disponibilizado e a empresa contratada não possuiu
nenhum empregado registrado em seus quadros até o ano de 2015. O órgão requer o
bloqueio de bens dos réus em até R$ 346.839,21. As ações referem-se a fraudes a
licitações do Pregão Presencial nº 007/2008 e do Pregão Presencial nº 028/2010,
destinados à aquisição de materiais elétricos, hidráulicos, de construção e
ferragens com recursos da educação. Segundo o MPF, a empresa Pôr do Sol
Materiais de Construção foi contratada através de licitação direcionada, sem a
competitividade prevista em lei. Ainda segundo as investigações, a empresa
contratada é do ramo de comércio varejista de artigos de papelaria e não presta
os serviços solicitados na licitação. Em vista disso, os réus não comprovaram a
entrega dos produtos.
Por fim, a pedido também do MPF,
a Justiça Federal determinou o bloqueio de bens do ex-prefeito de Sítio do Mato
Danilson dos Santos Silva, e mais cinco pessoas, em até R$ 1.351.006,77 por
fraude a licitação, danos ao erário e desvios de recursos federais da Funasa.
Segundo as investigações, a licitação Tomada de Preços nº 013/2009 foi
direcionada, sem a devida competitividade, na qual as verbas, referentes ao
TC/PAC nº 0670/07, eram destinadas à execução de ação de melhoria habitacional
para o controle da doença de chagas, por meio da (re)construção de 51 casas. No
entanto, foi constatado que, embora o município tenha recebido todo o valor
conveniado - R$ 750.000,00 -, apenas 31 unidades habitacionais foram
concluídas.
Ou seja, o mecanismo parece se
repetir. A forma de roubar é repetitiva. E olhem que tudo isso envolve o
trabalho de um procurador federal numa dada região da Bahia. Se isso se repetir
no mesmo nível nas outras regiões, não há como não dizer que estamos diante de
um quadro de corrupção quase incurável. Só vislumbro o fim disso com apoio maciço
da população. Entretanto, quando vejo jovens estudantes, professores,
magistrados, filósofos, desembargadores, ministros, por interesses, ideologias
questionáveis ou inocência inútil, argumentar defesa a favor de determinados corruptos
ilustres, minha esperança de um país democrático, justo e progressista jaz no
túmulo da desilusão.
(Com a colaboração dos portais
Bahia Notícias, Blog do Paulo Nunes, Macaubense Life, Correio do Oeste, Sertão
Hoje e Zump)