Manifestações do dia 15 de março atordoaram o governo do PT (foto: Estadão) |
Documento reservado do Palácio do
Planalto admite que o governo tem adotado uma comunicação "errática"
desde a reeleição da presidente Dilma Rousseff, afirma que seus apoiadores
estão levando uma "goleada" da oposição nas redes sociais e aponta
como saída para reverter o "caos político" e o quadro
pós-manifestações o investimento maciço em publicidade oficial em São Paulo,
cidade administrada pelo petista Fernando Haddad onde se concentra, atualmente,
a maior rejeição ao PT.
Elaborado pela Secretaria de Comunicação
da Presidência da República, comandada pelo ministro Thomas Traumann, o
documento não assinado circulou dentro do governo e foi revelado com
exclusividade pelo portal estadão.com.br às 17h11 de terça-feira, 17.
O texto cita, em tom de alerta, pesquisa
telefônica recente feita pelo Ibope a pedido do Planalto na qual 32% dos
entrevistados disseram ter mudado de opinião negativamente sobre o governo nos
últimos seis meses - ou seja, da campanha de outubro até agora. Conclui que o
País passa por um "caos político" e admite: "Não será fácil
virar o jogo".
O documento é dividido em três
partes: "Onde estamos", "Como chegamos até aqui" e
"Como virar o jogo". A primeira faz um diagnóstico do momento e
admite erros de ação nas redes sociais. "A comunicação é o mordomo das
crises. Em qualquer caos político, há sempre um que aponte 'a culpa é da
comunicação'. Desta vez, não há dúvidas de que a comunicação foi errada e
errática. Mas a crise é maior do que isso.">Após o mea-culpa, o governo
tenta dividir o ônus da crise.
"Ironicamente, hoje são os
eleitores de Dilma e Lula que estão acomodados com o celular na mão enquanto a
oposição bate panela. Dá para recuperar as redes, mas é preciso, antes,
recuperar as ruas."
Erros
No segundo capítulo é feito um
inventário dos erros acumulados desde 2010 para explicar o momento atual.
"O início do primeiro governo Dilma foi de rompimento com a militância
digital", diz um trecho. Os motivos seriam a política de defesa dos
direitos autorais implementada pela ex-ministra da Cultura Ana de Hollanda e o
distanciamento com os blogueiros ditos progressistas na gestão de Helena Chagas
na Secom.
"O fim do diálogo com os
blogs pela Secom gerou um isolamento do governo federal com as redes que só foi
plenamente restabelecido durante a campanha eleitoral de 2014", diz o
texto. "Em 2015 o erro de 2011 foi repetido", completa. O documento
aponta a escolha de Joaquim Levy para o Ministério da Economia e as medidas de
ajuste fiscal para explicar um "movimento impressionante" de
"descolamento entre o governo e sua militância" a partir de novembro.
Esse movimento, segundo a
análise, foi intensificado pelo "desastrado" anúncio de corte no
Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e subida do preço da gasolina e da
energia elétrica, além das denúncias de corrupção na Petrobras. E faz uma
crítica ao discurso usado até aqui pelo próprio governo e pelo PT.
"Não adianta falar que a
inflação está sob controle quando o eleitor vê o preço da gasolina subir 20% de
novembro para cá ou sua conta de luz saltar em 33%. O dado oficial IPCA conta
menos do que ele sente no bolso. Assim como um senador tucano (Antonio
Anastasia, MG) na lista da Lava Jato não altera o fato de que o grosso do escândalo
ocorreu na gestão do PT."
O texto cita o "sentimento de
abandono e traição" entre os dilmistas e aponta a necessidade de aceitar
esta "mágoa" como estratégia de reação.
Isolamento
O texto indica claramente que o
isolamento da presidente da eleição até o carnaval contribuiu para a
intensificar a crise e cobra ação dos parlamentares do PT que, segundo a
análise, deixaram de defender o governo. "Hoje, a página do deputado Jean
Wyllys, do PSOL, tem um peso maior que quase toda a bancada federal",
compara. A avaliação é que a estratégia atual de comunicação atinge apenas o
eleitorado de Dilma e não é capaz de chegar ao grosso do eleitorado.
Para "virar o jogo", o
texto sugere mais exposição de Dilma, "não importa quantos panelaços eles
façam", além de alterações no núcleo de Comunicação Social, concentrando
sob a mesma coordenação a Voz do Brasil, as páginas oficiais na internet e a
Agência Brasil. A principal sugestão, no entanto, é concentrar os investimentos
de comunicação em São Paulo, em parceria com Haddad, que também sofre com
baixos índices de aprovação. "Há uma relação direta entre um e
outro."
O texto termina com uma analogia
entre a situação atual e o terremoto que destruiu Lisboa em 1755 e deixou 10
mil mortos. Na ocasião, o rei d. José teria pedido sugestão ao marquês de
Alorna, que recomendou: "Sepultar os mortos, cuidar dos vivos e fechar os
portos". "Significa que não podemos deixar que ocorra um novo tremor
enquanto estamos cuidando dos vivos e salvando o que restou", diz o
documento.