Por FERNANDO DE BARROS E SILVA –
do portal da revista PIAUÍ
Marina Silva nunca esteve tão perto da Presidência da República |
Marina Silva jamais esteve tão
próxima da Presidência. No mundinho da política esse sentimento se espalhou por
toda parte nas últimas 48 horas, em graus variados, entre adeptos e adversários
da possível candidata.
Sim, Eduardo Campos ainda não foi
enterrado; sim, Marina não assumirá a candidatura antes do funeral; sim, o PSB,
partido que a hospeda, é um saco de gatos magros sem nenhuma liderança forte e
ainda não decidiu oficialmente que rumo tomar.
Ninguém mais, no entanto, nem no
PT nem no PSDB, cogita seriamente a hipótese de ver Marina fora da disputa. A
carta do irmão de Campos reiterando a vontade da família de que a vice
substitua o candidato morto praticamente encerra a questão.
A repórter Daniela Pinheiro, da
piauí, tem a informação de que Marina quer Renata Campos, a viúva, como
candidata a vice-presidente. Considera que ela, auditora do Tribunal de Contas
de Pernambuco, gosta de política e entende de administração pública. Sua
candidatura seria também uma maneira de homenagear o marido e manter viva a
imagem da família na própria chapa presidencial. Seria, sobretudo, um tremendo
lance de marketing.
As resistências no PSB a Marina,
tão repisadas nos bastidores da pequena política nas últimas horas, tendem a se
diluir diante da perspectiva, agora real, de chegar ao comando do país. Ou
seja, até em nome do oportunismo político os velhos socialistas brasileiros
caminham para os braços da líder ambientalista, ainda que alguns deles tenham
horror a ela.
Sem Marina, Dilma muito
provavelmente venceria a eleição no primeiro turno. Aécio Neves, por sua vez,
vive uma situação paradoxal: precisa de Marina no páreo para manter viva a
expectativa de que haja segundo turno; ao mesmo tempo, corre o risco - a essa altura
muito grande - de ser ultrapassado pela representante da terceira via e ficar
fora do palco da grande final.
O histórico das candidaturas
sugere isso. Marina figurou pela última vez numa pesquisa do Datafolha como
possível candidata do PSB em abril deste ano (só em maio o partido viria
ratificar o nome de Campos na cabeça da chapa). Ela tinha, então, 27% das
intenções de voto (marca que Aécio jamais alcançou). Dilma estava com 39%
(praticamente no mesmo patamar em que se encontra hoje). Aécio somava 16%.
Na próxima segunda-feira, a Folha
divulga o resultado de uma nova pesquisa com Marina de volta à cédula. A
apreensão entre os petistas é imensa. “Sacanagem fazer a pesquisa nesse
momento”, me disse um deles ontem à noite. “Ninguém da elite, em sã consciência,
a quer como presidente. Querem usá-la para manter Aécio vivo, mas é uma manobra
arriscada”, acrescentou.
Na avaliação desse petista,
Marina será ungida candidata assim que o caixão de Campos descer à terra.
Haverá, num primeiro momento, uma pantomima para encenar a unidade do partido.
Os problemas e as brigas virão logo nos dias seguintes: quem vai mandar na
campanha? Qual será o discurso da candidata? Como se comportará diante das
alianças regionais com petistas e tucanos feitas por Campos à sua revelia?
Muita gente parece ter descoberto
que Eduardo Campos era seu candidato agora que ele morreu. Boa parte disso se
deve às circunstâncias trágicas de seu fim e à comoção que tomou conta do país.
Mas, além disso, parece que a morte de Campos trouxe à tona o desejo latente de
mudança que fermenta há meses de forma difusa na sociedade. Até então nenhum
candidato - nem Aécio nem Campos - tinha sido capaz de galvanizar esse
sentimento de insatisfação, que não é necessariamente contra o governo (embora
também o seja), mas, também, contra o sistema político. A deterioração do
quadro econômico, embora lenta, só tende a engrossar o coro dos descontentes.
Marina parece ser o personagem
ideal para o momento. Basta lembrar que, ao contrário da quase totalidade dos
políticos, ela se beneficiou das revoltas de junho de 2013. No início daquele
mês, quando o movimento ainda era gestado, Marina aparecia no Datafolha com 16%
das intenções de voto; Dilma tinha 51%. Dois meses depois, em agosto, Marina
tinha saltado para 26%, enquanto Dilma caía para 35%. A virtual candidata
entrava em sintonia com o recado das ruas.
Renovação da política e aversão à
política se confundem na figura de Marina. Sua fala a todo instante descamba
para o registro messiânico, ao mesmo tempo em que ela preserva sua postura
ponderada e dá sempre a impressão de ser uma pessoa extremamente racional. Há
algo de genuinamente monástico em sua figura que contrasta com o bordel da
política brasileira. Como ela vai governar, se chegar lá, talvez nem o Senhor
saiba explicar.
Em 2010, Marina era uma candidata
mambembe, com pouco tempo de TV e quase nenhuma estrutura partidária. Obteve
quase 20 milhões de votos, surpreendendo a todos. Dois anos depois, nas
eleições municipais, pressionada a sair candidata para aproveitar o cacife
eleitoral acumulado, se recusou a fazê-lo. Foi além, retirando-se da disputa
sem apoiar ninguém. Parecia um fim.
Quando eclodiram as revoltas de
junho o nome de Marina andava esquecido. Praticamente ninguém a mencionava como
peça importante do xadrez da sucessão. Em poucas semanas, ela ressuscitou nas
ruas, quase à revelia de si mesma.
Logo adiante, voltou a afundar
quando a Justiça Eleitoral negou o registro da sua Rede. A mão pesada do PT
atuou para inviabilizar a provável candidatura presidencial da ex-ministra de
Lula, sabemos disso. Mas o episódio também deixava patente a inabilidade (ou
incompetência) de Marina para lidar com as contingências do mundo prático. Fora
incapaz, apesar de todo o respaldo popular, de obter assinaturas ao longo de
meses para criar seu partido. Isso enquanto outras legendas muito menos
representativas ou francamente negocistas recebiam sua certidão de nascimento e
ingressavam no circo da democracia institucional.
Em menos de 48 horas, no entanto,
Marina virou o jogo novamente, aliando-se a Eduardo Campos, no que ficou conhecido
como o "casamento do ano”.
Nos últimos meses, muita gente na
cúpula do PSB acusava Marina de jogar apenas para si mesma e fazer pouco
esforço pela candidatura de Campos. A família de Eduardo, porém, a tinha e a
tem em alta consideração. Seja como for, o fato é que Marina ainda não havia
transferido sua popularidade ao ex-governador de Pernambuco. Parecia, mais uma
vez, devolvida à condição de coadjuvante numa chapa com algum potencial de
crescimento, mas na qual mais ninguém apostava suas fichas. Isso tudo até a
manhã dessa quarta-feira, dia 13 de agosto.
A campanha eleitoral está
praticamente recomeçando, a 50 dias do primeiro turno, sob forte componente
emocional. A tragédia de Campos o transforma num mártir. Marina Silva, por sua
vez, tem certeza de que é uma predestinada. Como milhões de pessoas, crê nos
desígnios de Deus. Só saberemos o final do filme em outubro. Mas para quem
acredita em destino este é um enredo e tanto.