O deputado Natan Donadon no plenário da Câmara dos Deputados ajoelhado apos a votação que não cassou seu mandato
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Encarcerado desde o dia 28 de
junho em um presídio do Distrito Federal, após ser condenado pelo Supremo
Tribunal Federal, Natan Donadon (ex-PMDB-RO) não teve o seu mandato de deputado
federal cassado na noite desta quarta-feira (28). O resultado representa, além
de uma afronta ao STF e um prenúncio da resistência que a Casa deverá ter em
cassar o mandato dos quatro deputados condenados no processo do mensalão, uma
mensagem ao povo brasileiro de que aqui os corruptos tem seu espaço de prestígio
garantido. Na votação, que é secreta, o plenário da Câmara registrou apenas 233
votos pela cassação (24 a menos do que o mínimo necessário), contra 131 pela
absolvição e 41 abstenções. A ausência de 108 deputados no dia que
tradicionalmente há o maior quórum na Câmara também beneficiou Donadon.
Presente no plenário, o deputado reagiu com um grito de "não
acredito!" Apesar disso, o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves
(PMDB-RN), determinou o afastamento de Donadon, pelo fato de ele estar preso, e
a convocação do suplente, o ex-ministro Amir Lando (PMDB-RO), para assumir o
mandato. Após a sessão, Alves defendeu sua decisão, que não é baseada em
qualquer artigo do regimento da Casa ou da Constituição. "Tomei a decisão
conscientemente, porque era o que me cabia fazer. Eu assumo toda a
responsabilidade por ela", disse. Ambas as decisões são um indicativo de
que as leis foram feitas para beneficiar bandidos. Questionado sobre se, na
eventualidade de Donadon conseguir passar para o regime semiaberto, e poder
trabalhar durante o dia, Alves não soube responder o que aconteceria. Segundo o
presidente da Casa, Natan Donadon não terá qualquer prerrogativa do cargo,
apesar da decisão do plenário. Isso inclui o recebimento do salário de R$ 26,7
mil. "No que depender de mim, ele não recebe salário", disse. Em seu
discurso de defesa, no plenário, Donadon reclamou de não receber salário há
dois meses. Ou seja, é deputado, está condenado e preso, não receberá salários
e não foi cassado. Este é o retrato do Brasil. Até a tarde desta quarta,
líderes das bancadas governistas e de oposição apostavam na cassação de
Donadon. Os discursos na sessão foram unânimes a favor da perda do mandato. Condenado
a mais de 13 anos de prisão pela mais alta corte do país pelo desvio de R$ 8,4
milhões da Assembleia de Rondônia por meio de contratos de publicidade
fraudulentos, Donadon foi expulso do PMDB e estava isolado politicamente. Apesar
disso, vários fatores contribuíram para a reviravolta: insatisfação de
deputados com o STF, corporativismo, apoio da bancada religiosa --Donadon é
evangélico-- e de parlamentares da ala governista que não querem que os
deputados condenados no processo do mensalão percam seus mandatos. Os três
deputados em exercício condenados no mensalão --João Paulo Cunha (PT-SP), Pedro
Henry (PP-MT) e Valdemar Costa Neto (PR-SP)-- não votaram. José Genoino (PT-SP)
está licenciado. Além disso, Donadon compareceu ao plenário da Câmara
--mediante autorização judicial e sob escolta policial--, levou a família,
cumprimentou colegas e fez um discurso de 40 minutos que, para alguns, lhe
rendeu algum apoio. Primeiro deputado-presidiário desde a volta do país à
democracia, em 1985, ele reafirmou ser inocente, reclamou das condições
carcerárias, incluindo a comida, e disse que não é "ladrão". "Não
fiz pagamentos ilegais, não desviei um centavo, pelo amor de Deus, façam
justiça senhores deputados!", disse o deputado, em tom inflamado.
"Não sou ladrão, nunca roubei nada, é uma acusação injusta!". Ou
seja, todo STF, o Ministério Público, a Polícia Federal estão equivocados. Só
faltou dizer que ele estava em processo de canonização. Donadon relatou ter sido algemado com as mãos
nas costas no camburão que o conduziu. Ele entrou no plenário de terno,
gravata, broche de identificação dos deputados, e chorou ao abraçar a mulher e
os dois filhos. Ele foi cumprimentado por vários colegas, inclusive pelo
presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). A pena aplicada pelo
STF deve deixar o deputado em regime fechado até pelo menos setembro de 2015.
CÁRCERE
Donadon concentrou boa parte de
sua fala para relatar aos deputados as condições da cela que ocupa no presídio
da Papuda --6 m² com cama, sanitário e chuveiro. Ele disse que não pode tomar
banho hoje porque a água do presídio teria acabado. "Não há chuveiro, é
uma torneira de água fria." Segundo disse, teve que recorrer a um balde de
água de um vizinho de cela, de apelido "Espigão". Também relatou
estar passando por dificuldade financeira, já que a Câmara cortou o seu salário
e demais verbas desde que foi preso. "Tenho sofrido muito, até para alugar
uma casa está difícil, minha mulher veio aqui pedir pelo amor de Deus",
afirmou, em referência ao apartamento funcional que sua família ainda ocupa em
Brasília e que deveria ser desocupado caso houvesse a cassação. "Vim algemado de lá [Papuda] para cá,
nunca tinha entrado em um camburão na minha vida. Sofri muito, é desumano o que
um preso passa", afirmou. Mais tarde, falou em uma roda de deputados:
"O camburão é escuro, parece um caixão aquilo lá". Durante o processo
de votação, ele ainda pediu a palavra para transmitir um apelo dos colegas de
presídio. Para que as autoridades melhorem a comida da Papuda, classificada por
eles como "xepa" (resto de comida). "E eu que tenho síndrome de
intestino irritado, associado ao estresse, tenho passado muita
dificuldade." Pelo relato feito pelo condenado, muitos pensarão duas vezes
em desviar recursos públicos do país.
CONDENAÇÃO
Sobre a condenação pelo desvio de
R$ 8,4 milhões da Assembleia de Rondônia, ele disse que as acusações são
absurdas e estão embasadas em afirmações "repletas de asneiras".
Segundo ele, os contratos de publicidade apontados como fantasmas pelo STF
foram cumpridos. "Nunca fiz nada ilícito, sempre fui zeloso com o erário
público". Donadon criticou também a imprensa, que segundo ele é
sensacionalista e distorce os fatos. "A imprensa diz muita coisa, omite a
verdade." "Sou inocente, acreditem na minha verdade",
acrescentou. Não houve aplausos ao final de seu discurso, que foi acompanhada
em quase total silêncio pelos deputados. Antes dele, falou o deputado Sérgio
Zveiter (PSD-RJ), que relatou o parecer que pede a sua cassação. "A
leitura do acórdão [decisão colegiada] do STF revela que a conduta pela qual o
deputado Donadon foi condenado é gravíssima. Os fatos são verdadeiramente
estarrecedores e não coadunam com o decoro parlamentar." A comissão apenas
confirmou o óbvio: Donadon é um bandido de gravata e deveria ter o seu mandato
automaticamente cassado quando foi condenado. O problema é que neste país as
leis só maltratam verdadeiramente ladrões de galinha. Donadon merecia prisão
perpétua, mas deve estar livre logo para continuar roubando Rondônia e o
Brasil. Quem sabe, poderá até ainda conseguir se eleger um dia para mais um
mandato. Nesse país corrupto pode quase tudo. É quase o paraíso deles! (A partir do texto e das informações de BRENO
COSTA e RANIER BRAGON – da Folha de São Paulo)