A revista ISTOÉ, edição 2368, do
dia 3 deste mês, mostrou como a união entre professores, pais, alunos e
autoridades de Foz do Iguaçu reverteu em pouco tempo índices ruins de
aprendizado no ensino básico e conseguiu bater, inclusive, metas estipuladas
para 2022.
Laura Daudén, de Foz do Iguaçu –
da revista ISTOÉ.
REFORÇO A escola Papa João Paulo I instituiu aulas no turno oposto ao regular para melhorar a aprendizagem |
Uma música infantil anuncia o
final do recreio e os alunos do 5ºA se aglomeram no corredor para colar na
parede os poemas feitos por eles pouco antes. Entre as mãos que recortam,
dobram e apontam estão as da professora Ana Pereira. Mais do que disposição em
ajudar os alunos, chama a atenção a camiseta que ela orgulhosamente veste. Na
parte de trás, em números garrafais, uma nota: 7,2. Essa é a média conquistada
pela escola municipal Adele Zanotto, de Foz do Iguaçu, no último Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que conjuga dados sobre evasão e
reprovação com os resultados das avaliações externas – no caso das escolas
municipais, a Prova Brasil. Quanto maior o número na classificação do Ideb,
melhor a posição. Ver professores e funcionários vestindo, literalmente, a
camisa de suas instituições mostra a importância que a educação básica ganhou
na cidade paranaense. Entre os municípios brasileiros com mais de mil alunos
matriculados no 5º ano do ensino fundamental, Foz é o que exibe o melhor
desempenho. Bate, inclusive, a meta estipulada pelo movimento Todos Pela
Educação para 2022 (ver quadro) e é um exemplo de como a mobilização da
comunidade pode revolucionar a aprendizagem em pouco tempo.
A conquista é recente. Segundo
Joane Vilela, ex-secretária municipal de educação e atual secretária-adjunta na
pasta de educação da cidade de São Paulo, em 2001 o índice de reprovação na
rede era de 13% e chegou a 15% em 2009. Foi o sinal de alerta. “Instituímos o
Plano de Estudos Individualizados no turno oposto para alunos com dificuldades,
com grande incentivo à leitura e à escrita, e o acompanhamento de frequência e
desempenho”, diz ela. O retorno foi tão rápido que o vereador Dilto Vitorassi
(PV) demandou em fevereiro a criação de uma comissão especial na Câmara para
investigar eventuais irregularidades na aplicação da Prova Brasil de 2011. “Não
encontramos qualquer indício de fraude para maquiar o resultado”, diz o
vereador Nilton Bobato (PCdoB), relator da comissão. Descartada a possibilidade
de fraude, cabe à cidade se concentrar em manter os bons resultados. E terá de
fazer isso sob uma nova gestão, provando que o compromisso vai além da
política. Depois de oito anos, a administração do PDT, liderada pelo prefeito
Paulo Mac Donald Ghisi, deu lugar ao PSB de Reni Pereira. A nova secretária
municipal de Educação, Shirlei de Carvalho, promete abraçar o desafio.
Ex-diretora da escola Santa Rita de Cássia, que obteve 8,6 no Ideb, a nota mais
alta do Brasil, ela promete dar sequência aos programas de maior destaque da
cidade. Entre eles, está o que garante visitas semanais de uma equipe
multidisciplinar, formada por um fonoaudiólogo, um assistente social e um
psicólogo, a todas as instituições da rede e o prêmio Professor Paulo Freire,
que oferece uma dotação em dinheiro aos professores e escolas que liderarem as
experiências e os projetos bem-sucedidos no ano. Um dos homenageados na edição
de 2009 foi o professor Fernando Lima, hoje supervisor da escola Santa Rita de
Cássia, para quem a ênfase nos projetos é um dos grandes trunfos da
escola-modelo. “A aposta nesses programas criou um vínculo forte com as
crianças e suas famílias”, diz. Um desafio, entretanto, é a transição para a
rede estadual de ensino. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais
(Inep) mostram que a porcentagem de alunos com conhecimentos adequados de
português cai de 77% para 26% entre o 5o e o 9o ano. Em matemática a situação
se repete: o índice despenca de 81% para 24%.
Um dos segredos do êxito de Foz
do Iguaçu, segundo a ex-secretária Joana Vilela, é o envolvimento de toda a
cidade. “Vimos a proliferação de mobilizações com o objetivo de garantir a
todos os alunos da rede o direito à aprendizagem”, diz. Os resultados do esforço
coletivo são evidentes na escola Suzana Moraes de Balen, na periferia. A
diretora Rozilda Luísa dos Reis e a coordenadora pedagógica Beatriz Martins
formaram uma dupla forte para driblar os problemas de evasão e cobrar o
envolvimento dos pais no dia a dia do colégio. Juntas, elas passaram a ir de
casa em casa buscando os alunos que faltavam com frequência. “Tivemos que lidar
até com ameaças porque às vezes víamos o que não podíamos ver”, conta Rozilda.
A iniciativa só foi possível porque ambas tinham legitimidade para desempenhar
o trabalho. Em Foz, tanto diretores quanto coordenadores são escolhidos pela
comunidade. “É importante que o entorno veja a escola como uma parte importante
dele mesmo, especialmente em regiões mais vulneráveis”, afirma o economista
Ernesto Martins Faria, coordenador do site QEdu da Fundação Leman e da Meritt,
e um dos responsáveis pela pesquisa Excelência com Equidade.
Do outro lado do município, a
escola Papa João Paulo I também é um exemplo de como a união entre comunidade,
diretores e professores pode transformar a realidade em tempo recorde. Foi lá
que a diretora Janeci Maria Werdt, no cargo há 22 anos, fez sua pequena-grande
revolução. Diante dos resultados negativos na Prova Brasil de 2007, ela decidiu
recorrer à associação de pais e professores para contratar um docente que desse
aula para os alunos do 5o ano no período inverso – um programa de reforço em
contraturno, que depois foi adotado em toda a rede municipal a partir do 1o
ano. “Começamos uma guerra contra os números. “Trabalhávamos manhã, tarde e
noite para reverter a situação”, diz. Deu resultado. De 4,8 no Ideb em 2007 a escola
passou para 8,4 em 2011.
Apesar de ser um fator objetivo
para auferir proficiências, especialistas ainda divergem sobre a importância
que se deve dar ao resultado das avaliações externas. “Elas não podem ser a
única matriz ao redor da qual gira o currículo da escola”, diz Ocimar Alavarse,
professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, sublinhando
que os rankings escondem as diferenças das quais as escolas partem e estimulam
o desequilíbrio, e não a igualdade do sistema. “As provas criam, no entanto, um
referencial relativamente confiável para os colégios, permitindo que a evolução
dos alunos seja acompanhada ao longo dos anos.” Para ele, esse movimento já era
observado na rede particular tendo como ponto de partida os vestibulares. “A
novidade é que as escolas públicas aderiram ao processo”, completa. E agora,
com uma base de comparação, podem empreender os avanços educacionais
necessários.