ISTOÉ teve acesso a exames da
polícia científica que provam que Elize Araújo teve um cúmplice no assassinato
de seu marido. Testes de DNA mostram que pelo menos uma pessoa, do sexo
masculino, ajudou-a a cortar o corpo do empresário
Antônio Carlos Prado – portal da
revista ISTOÉ.
O laudo revela mais do que Elise disse |
Um laudo do Instituto de
Criminalística da Polícia Técnico-Científica de São Paulo, obtido na semana
passada com exclusividade por ISTOÉ, provoca uma reviravolta no caso Yoki, como
ficou conhecido o assassinato e esquartejamento do empresário Marcos Matsunaga,
morto por sua mulher, Elize Araújo. Trata-se do exame das amostras de sangue
encontradas no quarto em que ela esquartejou o corpo da vítima na madrugada de
20 de maio. Desde que foi presa no dia 4 de junho, Elize sustenta que fez tudo
sozinha ? tanto o assassinato quanto o esquartejamento e a ocultação do
cadáver. O documento agora revelado por ISTOÉ prova que ela está mentindo: um
homem a ajudou a esquartejar o cadáver de Matsunaga tornando-se assim coautor
do crime.
Assinado pela perita criminal
Roberta Casemiro da Rocha Hirschfeld, esse laudo de DNA (nº 35493/12) reuniu 30
amostras de manchas de sangue existentes em toda a área ao redor do corpo e
afirma categoricamente: ?Identificado (...) material genético de no mínimo dois
indivíduos, sendo ao menos um deles do sexo masculino (...) estando Marcos
Matsunaga excluído como (...) gerador dessas amostras.? Ou seja: os resultados
dos exames de DNA detectaram no quarto a presença de sangue de outro homem além
do sangue de Matsunaga. Mais: há também, de acordo com o laudo, a possibilidade
de que haja sangue de outra mulher, além do de Elize, nas amostras de sangue
feminino que foram coletadas. A polícia de São Paulo deverá agora pedir o cotejamento
de seu perfil genético com o perfil genético do sangue feminino encontrado para
saber se outra mulher também fez parte do crime. ?Não resta dúvida, pela
conclusão do laudo, que um homem participou do esquartejamento. E para haver
sangue dele, é porque ele se machucou enquanto manuseava faca ou outro objeto
cortante para dilacerar o cadáver?, disse à ISTOÉ a especialista em perícia
criminal Rosângela da Rocha Souza. ?Eu tenho a percepção da coautoria no crime.
Pelo menos depois de o tiro ter sido dado?, diz o promotor de Justiça José
Carlos Cosenzo, responsável pela acusação da ré.
O laudo deixa claro que as
manchas de sangue são contemporâneas, ou seja, são do evento do corte do corpo
e não há amostra anterior a ele?, diz Rosângela. ?O advogado de defesa, que
estava presente e que pelas leis do País validou a prova estando ali, não
registrou que se cortou, assim como nenhum perito o fez. Então o sangue é de
outro homem que participou do esquartejamento.? A rigor, a exclusão de todos os
homens que pisaram o apartamento na noite de 6 de junho, quando foi feita a
perícia, é fácil de ser operada: basta que cada um forneça material genético
para comparação. O laboratório de DNA do Núcleo de Biologia e Bioquímica do
Instituto de Criminalística é o mais conceituado da América Latina, com
equipamentos de ponta também utilizados, por exemplo, nos EUA, na Alemanha e na
Itália.
ISTOÉ consultou a diretora
responsável por sua implantação e autoridade máxima no assunto dentro da
Polícia Científica, a perita criminal e professora doutora Eloisa Auler
Bittencourt. Fez isso para questionar se existe a possibilidade de haver algum
erro na perícia. Ela referendou o laudo integralmente: há amostras que
apresentam perfil genético com perfeita coincidência com o perfil genético
obtido do material coletado da vítima Marcos Matsunaga; existem também amostras
que exibem perfis genéticos discordantes do de Matsunaga; e, finalmente, a
diretora frisa que todo material que ?serviu de base às perícias de DNA (...)
está guardado no Núcleo de Biologia e Bioquímica (laboratório de DNA) para
eventual nova perícia objetivando a identificação dos perfis genéticos caso
ocorra solicitação judicial?. Os pontos anotados por Eloisa são importantes
porque o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), responsável
pela investigação do caso, nunca abandonou a tese de que mais de uma pessoa
possa ter participado do crime, apesar de Elize, em sua confissão, ter negado
esse fato. O diretor do DHPP, Jorge Carrasco, e o promotor Cosenzo jamais
acreditaram totalmente na versão contada pela acusada.
"A perícia tem provado que Elize mente o tempo todo. Sempre tive a percepção de coautoria após o tiro" José Carlos Cosenzo, promotor de Justiça |
"O laudo do laboratório de DNA é impecável: um homem ajudou a cortar o corpo, e as manchas de sangue são contemporâneas" Rosângela da Rocha Souza, especialista em perícia criminal |
Uma vez provado que outra pessoa
ajudou Elize a retalhar o cadáver do marido, alguns depoimentos já prestados à
polícia e que nos próximos dias serão dados à Justiça ganham nova dimensão. É o
caso da dentista Luciana Yukari Hirayama Chinen. Ela afirmou ao DHPP que foi
procurada por Mauriceia José Gonçalves dos Santos, uma das babás da filhinha do
casal Matsunaga, poucos dias depois da prisão de Elize. Segundo a dentista,
Mauriceia queria comprar dela um atestado médico para seu marido, André
Rodrigues de Lima, a fim de justificar sua falta no trabalho nos dias que se
seguiram ao homicídio. Luciana afirmou que ficou indignada com a proposta e
cortou o assunto. As afirmações da dentista foram confirmadas pela própria
Mauriceia. Entre policiais e peritos que investigam o caso, há quem suspeite
que tanto a babá quanto o seu marido poderiam estar em busca de álibis. A filha
de Mauriceia também era babá folguista da filha de Elize e Marcos Matsunaga. A
moça diz que chegou ao apartamento do casal, onde o crime ocorreu, às cinco
horas da manhã do domingo 20, dia em que o empresário e diretor-executivo da
Yoki foi esquartejado. Ela declara que deixou o serviço às sete e meia da
noite.
Ocorre, porém, que Elize saiu de
casa por volta das nove horas da manhã e só retornou onze e meia da noite ?
esteve fora para se livrar das partes do corpo do marido jogando-as nas
imediações de um sítio de propriedade de um amigo do casal, no município paulista
de Cotia. Com quem ficou então a filhinha de Elize, de apenas um ano de idade,
entre as sete e meia e as onze e meia da noite daquele domingo? Alguns
policiais acreditam que as babás possam estar mentindo e agora também estudam
pedir na Justiça o cotejamento de material genético delas com o sangue feminino
coletado no quarto onde o corpo foi cortado.
A reforçar a conclusão da
investigação da polícia científica, exposta no laudo de DNA do sangue
encontrado no apartamento do casal Matsunaga, ISTOÉ destaca novos pontos do
exame necroscópico assinado pelo médico legista Jorge Pereira de Oliveira.
Também ele aponta para a participação de outra pessoa além de Elize. No item
?g?, lê-se: ?os cortes apresentam características praticadas por pessoa ou
pessoas com noções de anatomia?; no item ?h? tem-se: ?os cortes em raízes de
membros superiores apresentam retalhos de pele, indicando dificuldade ou
desconhecimento anatômico da região?. Ou seja: ?alguma pessoa com conhecimento
de anatomia? ? Elize é enfermeira ? ?mostrou-se exímia na execução das secções
do corpo enquanto outra pessoa? ? provavelmente o homem que agora se sabe ter
ajudado ? ?não dominava tal conhecimento com objetos cortantes?, na opinião de
especialistas. Também aqui resta uma pergunta: por que Elize, que já está presa
como ré confessa, não revela à Justiça quem a ajudou? Segundo delegados, a
resposta é simples: a revelação da coautoria no esquartejamento sepulta
definitivamente a já agonizante versão da defesa de crime passional ? o
assassinato teria sido resultado de ?forte emoção?. O homem presente no quarto
do esquartejamento pode ser a prova de que tudo foi milimetricamente planejado.
?O motivo do crime está claro. Tem motivação patrimonial, foi tudo premeditado,
tanto que Elize mente o tempo todo. Ela queria para si todo o dinheiro e bens
do marido?, diz o promotor Cosenzo.
Ilustração: Rica Ramos
Fotos: Joel Silva/Folhapress;
Rafael Hupsel/Ag. Istoé; Kelsen Fernandes