Em reportagem desta semana, a ISTOÉ mostra o esquema de
Cachoeira e o governo Serra. CPI e Ministério Público investigam como o grupo
do bicheiro Carlinhos Cachoeira atuou em São Paulo através de contratos da
construtora Delta com a Prefeitura e o Estado em obras na marginal Tietê
Pedro Marcondes de Moura – do portal da ISTOÉ.
José Serra |
CONEXÃO Em conversas telefônicas, Cachoeira fala sobre contratos públicos em São Paulo nas gestões de Serra e Kassab |
Os desdobramentos da Operação Monte Carlo, que investiga as
relações do bicheiro Carlinhos Cachoeira com governos estaduais e municipais,
chegaram ao principal bunker da oposição: o Estado de São Paulo. Em Brasília,
parlamentares que compõem a “CPI do Cachoeira” já tiveram acesso a conversas
telefônicas gravadas com autorização judicial entre junho do ano passado e
janeiro deste ano. Elas apontam que a construtora Delta, braço operacional e
financeiro do grupo do contraventor, foi favorecida nas gestões de José Serra
(PSDB) e de seu afilhado político Gilberto Kassab (PSD) na prefeitura e também
quando o tucano ocupou o governo do Estado. Em 31 de janeiro deste ano, por
exemplo, Carlinhos Cachoeira telefona para Cláudio Abreu, o representante da
empreiteira na região Centro-Oeste, atualmente preso sob a acusação de fraudar
licitações e superfaturar obras. Na ligação (leia quadro na pág. 43), o
bicheiro pergunta se Abreu teria conversado com Fernando Cavendish,
oficialmente o dono da construtora, sobre “o negócio do Kassab”. Em seguida,
diz a Abreu que o prefeito de São Paulo “triplicou o contrato”. Essa conversa,
segundo membros da CPI e do Ministério Público de São Paulo, é um dos indícios
de que a organização de Cachoeira também teria atuado com os tucanos e seus
aliados em São Paulo. “Os depoimentos de Cachoeira e Abreu serão fundamentais
para que se descubra o alcance das relações entre a empreiteira e políticos”,
diz o relator da CPI, deputado Odair Cunha (PT-MG).
A Delta começou a prestar serviços à capital paulista em
2005, quando Serra assumiu o comando do município. Inicialmente, os contratos
somavam R$ 11 milhões. A partir de 2006, quando Serra deixou a prefeitura e
venceu as eleições para governador, os negócios da empreiteira com o município
se multiplicaram, em muitos casos sem licitação. Em 2010, ano em que o tucano
disputou a Presidência, os repasses chegaram a R$ 36,4 milhões. Entre 2008 e
2011, os pagamentos da prefeitura para a Delta ultrapassaram R$ 167 milhões. O
que chama mais a atenção da CPI e do Ministério Público de São Paulo, porém, é
o fato de a Delta ter vencido em outubro do ano passado uma concorrência para
limpeza urbana no valor de R$ 1,1 bilhão. O MP abriu um inquérito para apurar
se houve fraude na licitação. Há suspeitas de uso de documentos falsos e de
edital dirigido. “Se a Delta cometeu essas irregularidades em outros Estados e
municípios, precisamos apurar se isso ocorreu também em São Paulo”, diz o
promotor Silvio Marques, do Patrimônio Público. Na quarta-feira 2, ele encaminhou
ofício à PF, solicitando acesso às investigações da Operação Monte Carlo.
ELE DE NOVO Então diretor da Dersa, Paulo Preto, o polêmico arrecadador tucano em 2010, foi o responsável por contratar a construtora Delta para obras viárias em São Paulo (Clique para ampliar) |
Entre a papelada, o promotor receberá a transcrição de uma
conversa gravada com autorização judicial ocorrida em 4 de agosto do ano
passado. No diálogo, a que ISTOÉ teve acesso, um homem identificado como Jorge
pergunta para Gleyb Ferreira, segundo a PF uma espécie de “faz-tudo” de
Cachoeira, sobre o edital de uma licitação. “E aí, evoluiu aquele negócio?”,
pergunta Jorge. “Aguardamos estar com o edital hoje à tarde. O Carlinhos
(Cachoeira) quer que a gente converse com o Heraldo (Puccini Neto,
representante da Delta na região Sudeste). Já estamos conseguindo uma
prorrogação com o secretário para o dia 31 ao invés do dia 15”, responde Gleyb.
Para a PF, o diálogo se refere à concorrência de R$ 1,1 bilhão vencida pela
empresa ligada ao bicheiro. O Ministério Público já apurou que foram
necessários dois editais para a concorrência. No primeiro, a Delta foi
desclassificada.
Gilberto Kassab |
Se a Delta multiplicou seus contratos com a prefeitura entre
2005 e 2011, um movimento semelhante ocorreu com o governo de São Paulo, quando
Serra chegou ao Palácio dos Bandeirantes em janeiro de 2007. Durante o mandato
do tucano, a construtora recebeu R$ 664 milhões do governo paulista. O valor
corresponde a 83% de todos os 27 convênios firmados pela Delta com o Estado de
São Paulo na última década. A obra mais polêmica é a ampliação da Marginal
Tietê, um dos cartões de visita da campanha presidencial de Serra em 2010. Além
de inúmeros problemas, como atrasos e falta de compensação ambiental, o valor
pago ao consórcio Nova Tietê, liderado pela Delta, sofreu um reajuste de 75%.
Na quarta-feira 2, o Ministério Público de São Paulo instaurou Inquérito Civil
para apurar a existência de irregularidades na licitação, superfaturamento e conluio
entre agentes públicos.
Segundo documentos obtidos por ISTOÉ, a obra da Marginal era
acompanhada dentro do governo de São Paulo por Delson José Amador e Paulo
Vieira de Souza, conhecido como Paulo Preto, que no PSDB é identificado como um
dos arrecadadores das campanhas eleitorais de Serra. Tanto Paulo Preto como
Amador são citados na Operação Castelo da Areia, da Polícia Federal, por
suposto envolvimento com empreiteiras. Pelo lado da Delta, o responsável pelo
gerenciamento da obra era o diretor da empreiteira para a região Sudeste,
Heraldo Puccini Neto. Ele está foragido, após ter a prisão preventiva decretada
por envolvimento em suposto esquema de fraude em licitações na área de
transporte público do Distrito Federal. “A apuração sobre os contratos da Delta
com o governo paulista pode levar ao caixa 2 dos tucanos em São Paulo”, afirma
o deputado estadual João Paulo Rillo (PT). “Não podemos nos limitar a fazer uma
análise política”, diz o líder tucano Álvaro Dias (PR). “Devemos checar todos
os contratos da Delta para saber de que forma foram celebrados e se os preços
praticados foram justos. Afinal, a empresa foi a principal patrocinadora da
relação do bicheiro Cachoeira com os recursos públicos.”
Colaborou Claudio Dantas Sequeira.