Do Sertão ao Centro-Oeste: Episódio 08 - BR 330, BA 160, uma ponte e a Barra!
Saindo de Xique-Xique, partimos em direção ao sudoeste.
Nosso objetivo era chegar ao município de Barra, localizado na margem direita
do São Francisco, mas ainda bem distante. É que Xique-Xique é um município
enorme. Para se ter uma ideia, percorremos algo em torno de 40 kms para que as
duas rodovias irmanadas, BA 160 e BR 330, fossem cada uma para o seu destino. A
federal segue em direção de Gentio do Ouro e nós seguimos de volta ao Velho
Chico. A rodovia é pedagiada. A concessão ficou com a Concef. Antes da ponte sobre
o São Francisco, pagamos o mais caro pedágio: 19,60 para automóvel. Levando em
consideração que já havíamos percorrido mais de 150 kms em pleno asfalto e sem
nenhum perrengue, excetuando-se a multa, até que valeu a pena.
Chegamos finalmente a um dos objetivos da viagem, conhecer a
nova ponte Barra/Xique-Xique. A obra possui mais de 1 km de extensão e foi
construída sobre o Rio São Francisco, ligando a cidades de Barra e o município
de Xique-Xique, com sua sede distante cerca de 90 kms. É a ligação definitiva entre a região
produtiva de Irecê e o oeste baiano do agronegócio. São 2,5 milhões de baianos
que esperavam esta obra. Antes, balsas e barcos cumpriam o dever de transportar
veículos e pessoas entre os dois lados do rio. Esperas que duravam cerca de uma
hora. Tudo isso custou aos cofres públicos do Governo da Bahia um investimento
de R$ 133 milhões. fruto da Parceria Público-Privada (PPP) entre a Secretaria
de Infraestrutura do Estado (Seinfra) e a Concessionária Estrada do Feijão
(Concef), com a participação da Agência Estadual de Regulação de Serviços
Públicos de Energia, Transportes e Comunicações da Bahia (Agerba) como agente
fiscalizador. Não há dúvida que o retorno será rápido. Só não dá para imaginar
por que demoraram tanto para construir obra tão necessária.
O importante agora é que chegamos à cidade de Barra. Sua
história é tão bela quanto sua gente. E começa lá pelos idos de 1670, quando um
curral da Casa da Torre, de Dias D'Ávila, foi implantado nas barrancas do Rio
Grande. A cidade nasce no exato ponto do encontro entre o Rio Grande e o bem
maior São Francisco. Surge aí a Fazenda da Barra do Rio Grande do Sul e a
exploração das terras para criação de gado. Depois vieram os padres para
catequizar os índios dessas terras. Construiu-se então uma capela. A capela de
São Francisco das Chagas, da Barra do Rio Grande do Sul. Hoje, após ampliações
e restaurações, virou o Palácio Episcopal e Catedral de São Francisco das
Chagas, localizada na Praça Barão de Cotegipe, coração da cidade de Barra.
Mas é preciso contar a história com detalhes. A fazenda
Barra do Rio Grande do Sul cresceu e virou arraial. Em 1698, já era uma
povoação, reconhecida pelo próprio Dom José I, rei de Portugal. A Carta Régia
foi assinada pelo então governador geral do Brasil, Dom João de Lancastro.
Depois disso, o local ficou oficialmente conhecido como Povoação de São
Francisco das Chagas, da Barra do Rio Grande do Sul. De povoação passou a vila
em 1753, com o nome de Vila de São Francisco das Chagas da Barra do Rio Grande
do Sul. Nessa época, a economia da vila era promovida pela criação de gado,
pela lavoura e pelo beneficiamento de carnes e peixes. A população era composta
por vaqueiros, lavradores, pescadores, produtores de rapadura, de cachaça,
caixeiros viajantes, dentre outros.
Vale ainda uma informação importante. A região pertenceu à
capitania de Pernambuco por mais de setenta anos. Chegou também a pertencer a
Minas Gerais. Só em 1827, depois que o Brasil se tornou independente de
Portugal, Dom Pedro I, Imperador do Brasil, incorporou à Província da Bahia a
Comarca do Rio São Francisco com sede na Vila da Barra, o povoamento mais
importante do Oeste. A transferência religiosa só aconteceu em 1853, quando a
vila da Barra da diocese de Pernambuco passou para a diocese da Bahia.
Se hoje há dificuldades em cruzar os quase 600 kms que
separam a região de Salvador, imaginem no século 19? Só havia uma linha dos
Correios, com homens a pés, ligando Vila da Barra à Cachoeira, no Recôncavo
Baiano, por três vezes ao mês. No início do século XX entre em cena o vapor
Saldanha Marinho, trafegando entre Pirapora (MG) e Juazeiro (BA), com parada
obrigatória por esta cidade. Sim, Barra não era mais vila, desde 16 de junho de
1873, promovida à cidade com o pomposo nome de Cidade Florescente da Barra do
Rio Grande. No mesmo ano reduziu-se a denominação e passou a ser chamada Barra
do Rio Grande. Em 1931 ficou apenas Barra.
Em divisão territorial de 1950 o município é constituído de
5 distritos: Barra, Buritirama, Ibiraba, Igarité e Piragiba. Em 09 de maio de 1985,
desmembra-se de Barra o distrito de Buritirama, elevado à categoria de
município. Já em 13 de junho de 1989, nasce o município de Muquém do São
Francisco desmembrado do município de Barra. A partir daí, Barra passa a ter o
seu distrito sede e mais dois: Ibiraba, que fica do outro lado esquerdo do São
Francisco – direção norte, distante cerca de 10 kms em linha reta a partir de
Xique-Xique. Neste distrito é iniciada a rodovia BA 161 ligando a povoação até
Barra, sempre margeando à direita do São Francisco no sentido sul. A mesma
rodovia, após Barra, segue margeando o rio Grande até se encontrar com a BA
351. Daí em diante, segue novamente a busca do Velho Chico e ao outro distrito:
Igarité. Daí em diante vai rumo à BR 242.
Barra tem um povo que parece ter herdado a valentia dos seus
povos primitivos, os Acroás, os Mocoazes, os Tupiniquins, Xacriabás, Caiapós,
Cariris e Aricobés, base sólida dos seus 55 mil habitantes hoje, espalhados
pelos 11.414,405 km2, numa densidade menor que 5 habitantes por km. Isso ajuda
a enfrentar os vários obstáculos provocados pelo esquecimento de várias
autoridades. Só em 1998 teve sua sede ligada à rodovia 242 e somente agora, em
2021, teve finalmente sua ponte ligando seu território a Xique-Xique. É um povo
que sabe que a luta está só começando e ainda há muito a conquistar.