Saímos de Morro do Chapéu e
pegamos a rodovia BA 052 com destino a América Dourada e Irecê. Esta rodovia
nasce na BR 116, em Feira de Santana e vai até o rio São Francisco, passando
por municípios como Serra Preta, Ipirá, Baixa Grande, Mundo Novo, Piritiba,
Morro do Chapéu, América Dourada, Irecê e vai até o Xique-Xique, totalizando
462 kms. É conhecida como a Estrada do Feijão. Ao longo do seu trajeto, várias
outras rodovias baianas nascem nela ou fazem cruzamento com a mesma. São
incontáveis as povoações, distritos ou comunidades desenvolvidas ao longo de
suas margens, levando produção agrícola aos principais centros urbanos da Bahia
e do Brasil. No trecho que percorremos, as condições eram perfeitas.
Entretanto, quando tínhamos tudo para terminar o dia bem, havia uma blitz no
meio da rodovia, no meio da rodovia tinha uma blitz. Eu não tinha que me
preocupar. Toda documentação minha e do carro estavam em dias. O que temer?
Acontece que eu havia esquecido de ligar o farol. Fui abordado pelo policial e levei
uma multa de 130 reais. Dias depois, quando recebi a notificação, percebi o
motivo de dizerem que o Brasil é o país da piada pronta. Lá estava escrito que “Em
movimento de dia, deixar de manter acesa luz baixa sob chuva, neblina ou
cerração.”, enquanto o sol torrava nossa pela a 38 graus.
Já devidamente multado, 33 kms
depois chegamos ao município de América Dourada, que faz parte da região de
Irecê, como João Dourado e Lapão. A cidade é acolhedora e sua origem começa com
os netos de João Dourado, em 1870. Eles compraram uma fazenda, que no decorrer
dos tempos passou a povoado e foi denominado Mundo Novo, com praticamente todos
sendo descendentes do fazendeiro que deu nome ao município vizinho. Como já
havia outra localidade bem mais antiga com o nome de Mundo Novo, resolveram
mudar para América. As pessoas se referiam ao lugar como América dos Dourados, passando,
tempos depois, para América Dourada.
Nasce então o distrito de América
Dourada, pela Lei Estadual nº 1090, de 22-07-1915, subordinado ao Município de
Morro do Chapéu. Pela Lei Estadual nº 1896, de 02-08-1926, o Distrito de
América Dourada foi transferido do Município de Morro do Chapéu para constituir
o novo Município de Irecê. A emancipação do município com a denominação de
América Dourada vem pela Lei Estadual nº 4399, de 25-02-1985, desmembrado de
Irecê. Hoje, além do distrito sede, América Dourada é constituído de mais 3
distritos: Belo Campo, Prevenido e Soares, todos criados pela mesma lei. O
município foi oficialmente instalado em Instalado em 1º de janeiro de 1986.
A população do município deve
chegar próximo aos 17 mil habitantes no novo censo. Sua área total é de 743,889
km², com uma densidade em torno dos 23 habitantes por km2. O clima é semiárido
e sua distância para Salvador é de 430 kms. Faz limites com João Dourado,
Lapão, Cafarnaum, Morro do Chapéu e Irecê. É um grande polo de plantação de
feijão, mas hoje sua economia está muito diversificada. A cidade é administrada
pelo prefeito Joelson Cardoso do Rosário, do PL. Como Heliópolis, sua festa
mais conhecida é a do São Pedro, quando a população da cidade quadriplica.
Percorremos mais 50 kms e chegamos
à cidade de Irecê. O município se localiza região setentrional da Chapada
Diamantina. Sua população deve ultrapassar a marca dos 75 mil habitantes e é conhecida
por sua produção agrícola, e chamada de "Capital mundial do feijão"
durante décadas. Hoje, o feijão está em declínio e há muito mais elementos
geradores de riqueza em seu território. Irecê é um nome indígena, dado por Teodoro
Sampaio, em substituição ao antigo nome Carahybas. Irecê significa “pela
água, à tona d’água, à mercê da corrente”. Isso pode representar muito para sua
realidade. Caso seja um ano chuvoso, riquezas brotam de suas terras.
Mas a história começa muito
antes. Em 1624, a Bahia começou a ser invadida pelos holandeses. Naquela época
um homem se destacou, porque lutou bravamente contra os invasores. Chamava-se
Antônio de Brito Corrêa, pai de Antônio Guedes de Brito. Este último residia em
Morro do Chapéu, desde o ano de 1663 e carregava no sangue a valentia do pai.
Em sua época, a região do Rio São Francisco vivia atormentada por bandidos,
mamelucos e negros aquilombados. Incumbido pelo rei de Portugal para pacificar
a região do São Francisco, Antônio Guedes de Brito entrou em ação e em pouco
tempo trouxe de volta a paz em toda a região. Como recompensa, o rei lhe deu
uma sesmaria remuneratória de 160 léguas de terras, que abrangia a área de
terras de Irecê e de diversas outras cidades da região, transformando-o no
maior latifundiário de toda a Bahia.
O Conde da Ponte, João de
Saldanha da Gama Mello Torres Guedes de Brito, e a Condessa da Ponte, D. Maria
Constança de Saldanha Oliveira e Souza, desmembraram, no dia 21 de fevereiro de
1807, a sesmaria remuneratória. Retiraram da grande sesmaria uma porção de
terras que denominaram Barra de São Rafael e venderam para Filipe Alves
Ferreira e Antônio Teixeira Alves, pela quantia de 1.200$000 (um conto e
duzentos mil réis). Em 21 de fevereiro de 1807 foi um marco para a história de
Irecê, porque nesta data comercializou-se, pela primeira vez, os terrenos onde
se ergueu a atual cidade de Irecê, conhecida naquela época como Lagoa das
Caraíbas ou Brejo das Caraíbas. Como se tratava de um latifúndio gigantesco,
Barra de São Rafael foi desmembrada. Do grande latifúndio retirou-se uma porção
de terras denominada Lagoa Grande, que foi vendida a Joaquim Alves Ferreira,
Joaquim Gomes Pereira e Domiciano Barbosa Pereira, os quais venderam para João
José da Silva Dourado em 29 de agosto de 1840.
No ano de 1877, Antônio Alves de Andrade,
Hermógenes José Santana, Sabino Badaró, Joaquim José de Sena, Deoclides José de
Sena, José Alves de Andrade, Benigno Andrade, entre outros, chegaram em Lagoa
das Caraíbas e encontraram abundantemente água, caça e terrenos férteis,
requisitos básicos para a sobrevivência deles. Estes moradores habitaram inicialmente
embaixo duma quixabeira secular, que se encontra até os dias de hoje na Av.
Tertuliano Cambuí, no quintal da casa de dona Nita. Depois construíram suas
casinhas de enchimento, desmataram parte das terras e começaram a desenvolver a
agricultura e a pecuária.
Anos depois, chegaram aqui os
herdeiros dos terrenos, entre eles Martiniano Marques Dourado e Clemente
Marques Dourado, descendentes de portugueses. Estes cidadãos e muitos outros
promoveram o desenvolvimento de Irecê, produzindo milhares de arroubas de algodão,
criando centenas de cabeças de gado e trazendo produtos de fora para serem
vendidos entre os habitantes locais. Estes herdeiros da fazenda Lagoa Grande
fizeram uma expedição para conhecer seu enorme latifúndio, já habitado por
pessoas estranhas. A expedição chegou ao lugar denominado "Mundo Novo"
que mais tarde se tornou distrito de Morro do Chapéu e atualmente é o município
de América Dourada. A história dá o título de fundador de Caraíbas a Aristides
Rodrigues Moitinho, que juntamente com Teotônio Marques Dourado Filho e com o
Cel. Terêncio Dourado, chefe de polícia da Bahia, conseguiram criar em 1906 um
distrito de Paz e subdelegacia de Polícia de Morro do Chapéu, com a denominação
de Caraíbas.
Sempre ancorado na agricultura, Caraíbas
cresceu e vira município em 02/08/1926, pela lei 1896, assinada pelo governador
Góes Calmon, com a denominação de Vila de Irecê. Até hoje o 2 de agosto é
considerado a data do aniversário da cidade. No entanto, por não ter renda
suficiente que o caracterizasse como município, foi anexado a Morro do Chapéu,
em 8 de Julho de 1931, pelo decreto nº 7 479. Mas isso durou menos de dois
anos. A independência política de Irecê aconteceu de fato a partir do ano de
1933, através do decreto 8.452, de 31 de maio de 1933, assinado pelo governador
Juracy Magalhães, restaurando o então extinto município.
Estávamos decididos a dormir na cidade e seguir viagem ao Centro Oeste no outro dia. Resolvemos visitar duas pessoas da nossa mais alta estima. Fomos logo ao encontra de Meyre Joyce Souza Figueiredo, ou simplesmente Meirinha, ex-vereadora da Rede Sustentabilidade de Irecê e atual secretária de comércio, indústria, serviços, micro e pequena empresa da Prefeitura Municipal de Irecê, administrada pelo prefeito Elmo Vaz, reeleito em 2020. Depois de debatermos sobre a política local e os passos futuros, Meirinha nos levou ao escritório de João Gonçalves de Souza, que também já foi secretário da prefeitura por duas oportunidades. João nos ofertou um queixo especial, mel e cocada, produzidos em Irecê. Foi o nosso lanche, almoço e jantar do dia seguinte. O queijo alimentava tanto que a gente não sentia fome. Depois das visitas, fomos para o Radar Inn Hotel, localizado na Avenida 1º de Janeiro, via que cruza a cidade ligando as rodovias BA 052, BA 148 e BA 432. Era hora do merecido repouso, antes de partir para Xique-Xique e Barra.