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Ádria, o último adeus!

Uma explicação ao Conselho ou o desfuturo dos desjovens

Kemilly C. Alves Abreu Mendes (foto: Instagram pessoal)

Não sou saudosista. Se olho para o passado vez ou outra é para aprender com os erros; se repito algo de outrora é porque não inventaram ainda nada de novo para aquela especificidade. Já sonhei um dia colocar jovens numa mesa com a proposta de tomarem para si o futuro, sem o contínuo pisar nos rastros dos seus antepassados, ecoando aquilo que jamais dará certo. Hoje constato que nossa juventude é um retrato pendurado na parede com as rugas herdadas do tempo. Ainda são os mesmos e vivem como seus antepassados. Belchior estava certo e estou consciente de que há sempre pontos fora da curva. Também constato que muitos pontos dentro da curva contribuem para piorar o que já é sofrível.

No último dia 19, recebi um ofício do Conselho Tutelar de Heliópolis, assinado pelo seu coordenador, Cleison Matos Guerra. No dia 20, minha casa foi perfumada com a inteligência de Kemilly C. Alves Abreu Mendes, que está concluindo jornalismo na UFS, ex-aluna do CEJDS e uma das promessas na área da comunicação em nossa região. Cleison representa o inchaço da porrada que recebemos da vida, o lado mais cruel da nossa existência; Kemilly é a esperança do renascimento da minha crença no futuro da juventude. Duas faces de uma realidade: uma, já esperada, mas que sempre choca e surpreende; outra inesperada, lenitivo para a continuação da caminhada.

Não. O escrito de hoje não é para falar de Kemilly. A foto dela neste artigo serve para abrandar minha verve e não permitir que vá além da didática, porque ando perdendo a paciência com a burrice. Ana Dalva deu o ciente no documento, já que eu estava no colégio. Logo ao chegar em casa, ela me perguntou onde eu havia dito tudo aquilo que estava no documento. A resposta foi instantânea: em lugar algum.

Diz no famigerado documento: (...) Vem por meio deste COMUNICAR, referente a publicação aonde o Sr. Landsvalth em seu blog relata a incompetência dos conselheiros ao combate a menores que trafegam com veículo motorizado na cidade de Heliópolis.” Não mudei uma vírgula sequer. Também não vou aqui comentar os erros de Português. Não é o foco deste artigo.

Agora, transcrevo o que escrevi no Contraprosa, em 18 de maio, como parte integrante do Poucas & Boas:

“O grande problema de Heliópolis é a ação de alguns políticos que agem para soltar malandros que são presos com motos sem documentação, guiando sem capacete, trafegando com descarga sem miolo e por aí vai. A questão dos jovens é fácil de ser resolvida. Não haveria necessidade da atuação da Polícia Militar se houvesse uma ação mais efetiva do Conselho Tutelar. Temos que parar com essa mania de que tudo pode ser resolvido apenas com policiais. A maioria está apenas querendo se divertir e acha que não está incomodando ninguém. Outros apenas fazem por puro exibicionismo. Uma boa conversa, com um punhado de conselhos, pode resolver vários destes problemas. Agora, se a coisa continuar…”

Em nenhum momento disse o que diz o documento. São cinco conselheiros! Será que nenhum deles sabe ler ou foi apenas o coordenador que resolveu chamar para si o odor do semianalfabetismo?

Não contente com o mal escrito, ainda passou o pitaco ao escrever todo o Artigo 131, da Lei 8069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente. Entretanto, ocultou os artigos 98, 101 e 105, que tratam da ação de um conselheiro quando perceber que o direito de uma criança ou adolescente é violado. Ou seja, um conselheiro tutelar, em plena ação, jamais veria um menor guiando uma motocicleta sem capacete, em alta velocidade, sem tomar providências. Não se trata de poder de polícia. Aquele menor não tem consciência do perigo porque, muitas vezes, está agindo por influência ou exibicionismo. Está no Artigo 98: “As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta.”. Vou colocar aqui em letras garrafais para ver se Cleison entende: EM RAZÃO DE SUA CONDUTA. Isso não quer dizer que o Conselho vai agir para prender o adolescente, mas para protegê-lo. Como? Primeiro com conselhos, chamando atenção para o perigo. Não resolvendo, busca-se o apoio dos pais. Caso não funcione, avisa-se a polícia para apreensão do veículo.

Isso é o que chamo de ação mais efetiva. Um bom conselheiro não tem que ficar na sede da instituição aguardando ser provocado para agir. Precisa se antecipar aos fatos. Tenho consciência também das limitações dos conselheiros, mas não é aceitável interpretar diferente do que está escrito. Se Cleison Matos Guerra não está acostumado com críticas, pegue sua enxada e vá cuidar de sua roça. Vida pública, principalmente aquela regada por mandatos eletivos, está sempre exposta ao crivo dos órgãos de observação e das pessoas. Além disso, exige de nós conhecimento, inteligência, humildade e senso de humanidade, sem prejuízo da nossa ação pertinente ao dia-a-dia do cargo que ocupamos.

O ofício assinado por Cleison é patético. Revela as feridas abertas da ignorância de muitos que estão em cargos públicos sem o devido preparo, mesmo reverenciado pela vontade popular, contaminada pela ligação do escolhido a um grupo político, a uma família ou a um fato momentâneo qualquer. Pior, revela que, mesmo sendo jovem, o comportamento não difere de outros de outrora. O novo já nasce velho e tira as esperanças de uma renovação política, cultural e ideológica ampla. Há apenas aqui e ali uma ou outra Kemilly. Esmagadoramente o que vemos são nossos desjovens caminhando inexoravelmente para um desfuturo.