O Parque Nacional da Chapada
Diamantina ainda sofre com focos de incêndio, que já destruíram mil hectares
somente no Vale do Capão
Anderson Sotero – do CORREIO
O rebanho bovino caiu pela metade com mais uma seca trágica (foto: carlosmagno.com.br) |
O fogo que destrói e a seca que
castiga. Na Chapada Diamantina, os focos de incêndio no Parque Nacional haviam
atingido até ontem, somente no Vale do Capão, mil hectares. Já no semi-árido,
260 municípios sofrem as consequências de uma das piores secas dos últimos 50
anos. “Está queimando tudo. Todo ano tem (incêndio), mas esse ano tá pior.
Atingiu áreas como a Serra dos Cristais, Gerais da Águas Claras, Ribeirão,
Cachoeira do 21. Já tem mais de cinco dias que está pegando fogo”, destaca o
brigadista da Associação de Condutores e Visitantes do Vale do Capão, Fábio
Reis, 20 anos. Ontem, além do Vale do Capão, dois novos focos de incêndio foram
encontrados em Mucugê e no Morro do Chapéu, mas o secretário estadual de Meio Ambiente,
Eugênio Spengler, que sobrevoou a região, ainda não sabia a dimensão da área
atingida. “Das quatro regiões que preocupam, a mais grave é o Vale do Capão. A
região atingida é muito extensa. Teve ainda a área de proteção ambiental
Marimbus/Iraquara, que fizemos hoje (ontem) o trabalho de rescaldo”, disse o
secretário.
Lençóis
Segundo Christian Berlinck,
coordenador de emergências ambientais do Instituto Chico Mendes de Conservação
da Biodiversidade (ICMBio), uma das frentes do incêndio que caminhava em
direção ao Morrão foi controlada. “Agora tem outra caminhando contra o vento e
indo em direção a Lençóis. Está um pouco mais lento. Estamos entrando com
combate aéreo e terrestre”. O trabalho de combate é dificultado pela distância
dos locais. “São caminhadas de três horas. A gente usa bomba costal, abafador,
mas o material é pouquíssimo. Vale tudo, até mijar no fogo. A roupa não é
apropriada”, diz Fábio Reis. No trajeto, brigadistas contam que encontram
vários animais mortos. “Já encontramos tatu, cobra, tudo que é bicho morto”,
destaca o presidente da associação de brigadistas, Adelson Marques, 28. “Tem gente que se voluntariou e que nunca
apagou fogo. Até turista está ajudando”, destaca uma integrante da associação,
Haila Peterrazes. A alimentação dos combatentes vem de doações. “A gente passa
dias em cima do morro. Tem que levar água, comida e material pesado”, diz o
presidente da associação. Além da estiagem, a ação do homem também preocupa.
Brigadistas suspeitam de ação criminosa. “Aqui não tem fiscalização e nem
perícia”, emenda Marques. O secretário
de Meio Ambiente confirma a suspeita. “Vamos tratar com a Secretaria de
Segurança Pública e montar uma estratégia”, adianta o secretário, que destaca
ainda causas como a ação do sol, manejo inadequado de fogo para o plantio,
fogueiras, cigarros e ações de caçadores. Após uma reunião na tarde de ontem
com a prefeita de Lençóis e o secretário de Meio Ambiente de Palmeiras, cidade
onde o Vale do Capão está localizado, o secretário Eugênio Spengler admitiu que
foram encontradas falhas na distribuição de alimentos e água para os
brigadistas. Spengler anunciou que três helicópteros vão fazer o transporte dos
brigadistas para os locais de difícil acesso e para a distribuição de água e
alimento, além de cinco aviões, com três mil litros cada para apagar os focos.
Ontem, apenas um sobrevoou a área. “Distribuímos também 50 kits de equipamentos
de proteção individual para os brigadistas”, disse o secretário. Os
brigadistas, no entanto, reclamam da demora. “Governo, até agora nada”,
reclamou Adelson Marques. Moradores se assustaram com as chamas. “A casa ficou
empesteada de cinzas. Tá sem água dentro de casa. Quanto mais a gente olhava
para o fogo, mais parecia que estava aumentando. Era uma luz tão forte que deu
medo”, disse a professora Rilza Pinto. “A gente pensa que é o fim do mundo”.
Seca
Avião com capacidade de carregar e despejar 3 mil litros de água a cada decolagem tenta conter o fogo (Foto: Eloi Correa / GOVBA) |
A terra que não queima, arde. Em
98% dos municípios do semi-árido, segundo a Defesa Civil Estadual, a falta de
chuvas também tem provocado prejuízos. O ano de 2012 fechou com 260 cidades em
estado de emergência por conta da seca. “É um número bastante elevado. Estamos
chegando ao final do período de chuvas e o que choveu não reverteu o quadro”,
diz o coordenador da Defesa Civil Estadual, Salvador Brito. Para amenizar os
prejuízos, o coordenador destaca a construção de poços artesianos, cisternas,
adutoras e sistemas simplificados de tratamento de água, além da limpeza de
aguadas. A previsão, no entanto, é de chuvas abaixo das médias históricas.
Segundo a Seagri, o sisal está sofrendo com a estiagem prolongada, deixando as
regiões produtoras com estimativa de perda de 75% da produção em 2013. “Está
muito seco e a falta de água já dura há muito tempo. Quem sofre é a zona rural”
diz a moradora de Coronel João Sá, Anísia Carvalho. A cidade é uma das oito
apontadas pela Cordec com seca é mais grave. Destacam-se também Macururé,
Itiúba, Caetanos, Curaça e Uauá. “Os bichos estão fracos. O restinho que tinha
de gado está sendo vendido”, lamenta o atendente Jaelinto Santos, 20.
Previsão ruim: trimestre de chuva
abaixo da média
Os ventos que sopram do Instituto
Nacional de Meteorologia não trazem boas notícias para as cidades que aguardam
ansiosamente por chuvas. A previsão para os três primeiros meses de 2013 é de
precipitação abaixo da média no semiárido. “Não vai ter mudança no quadro de
poucas chuvas”, alerta a meteorologista Marines Oliveira. Para a Chapada
Diamantina, a previsão é de chuvas dentro da média. “Vai chover o que costuma
chover, mas não vai sair disso”, acrescenta Marines. No início do próximo mês,
um novo boletim com a previsão para fevereiro, março e abril deve ser
divulgado. Para este final de semana, a previsão é de que podem ocorrer chuvas
fracas e isoladas. “Na semana passada, na Chapada, nem chuvas fracas
ocorreram”, lembra a meteorologista. Para o coordenador da Defesa Civil
estadual, Salvador Brito, a “expectativa são as chuvas de março”.
Estiagem é ameaça para abastecimento
de energia
Se a falta de chuvas na Bahia
causa o problema da seca, a estiagem no Sudeste vem ameaçando o abastecimento
de energia no país. Isso porque os reservatórios das hidrelétricas estão em
níveis muito baixos. Segundo o diretor do Centro Brasileiro de Energia e
Mudança do Clima (Cbem), Osvaldo Soliano, as chuvas de Goiás, Minas Gerais e
São Paulo são as mais importantes para fazer subir o nível dos reservatórios. “Chover
no Nordeste não faz muita diferença, a maioria dos reservatórios fica no Sudeste
e Centro-Oeste. Até Sobradinho, que fica na Bahia, é abastecida pelo Rio São
Francisco, que nasce em Minas”, explicou. Soliano lembra ainda que é normal não
chover no Nordeste nesta época. “As chuvas do Sudeste é que deveriam ter
começado em novembro”. Ontem, os reservatórios apresentaram a primeira alta
desde o início do ano.
Com informações complementares de
THAÍS BORGES.