Idealizado em 1993, o Instituto investe no desenvolvimento
de estudantes com bom desempenho em escolas públicas e baixa renda familiar
Renato Alban – do CORREIO
Estudante de Engenharia Elétrica, Ícaro aproveita os últimos momentos ao lado da mãe, Noêmia, antes de partir para intercâmbio de um ano |
“Sempre gostei de experimentar novas realidades. Pra mim,
sair da Liberdade e passar por Mussurunga, Federação, Paripe e conhecer a
cidade era como viajar e aprender novos caminhos, histórias e costumes”. A
afirmação acima é de Ícaro Farias, 20 anos, que cresceu na Liberdade e, desde
ontem, deu início à maior viagem de sua vida. Estudante de Engenharia Elétrica
no Instituto Federal da Bahia (Ifba), o jovem partiu para um intercâmbio de um
ano na Universidade Bucknell, na Pensilvânia, Estados Unidos. Jovens
participarem de intercâmbios é cada vez mais comum. A questão é que Ícaro só
conseguiu realizar o sonho de morar fora do país devido ao Instituto Bom Aluno
do Brasil (Ibab), que há oito anos acompanha e auxilia seus estudos. Em 2004,
quando ainda estudava na Escola Municipal Amélia Rodrigues, Ícaro foi convidado
para participar do processo seletivo do Programa Bom Aluno. Na época, junto com
outras nove crianças, ele foi selecionado para a primeira turma em Salvador. Programa
Idealizado em 1993 pelos empresários paranaenses Francisco Simeão e Luiz
Bonacin, o Ibab investe no desenvolvimento de estudantes com bom desempenho em
escolas públicas e baixa renda familiar. Dentro de suas ações, cobre os custos
de cursos complementares, material escolar, transporte, alimentação e
acompanhamento psicológico e pedagógico. O Ibab bancou, por exemplo, as aulas
de inglês que Ícaro precisou fazer para conseguir uma bolsa do Programa Ciência
Sem Fronteiras, do governo federal. É com esta bolsa que o jovem da Liberdade
vai estudar na universidade americana. “Desde que comecei a estudar num colégio
público, em 2003, sentia que queria mais. Não por soberba, mas por ambição”,
afirma o estudante, que vê o programa como uma “ferramenta” que o ajudou a
realizar sonhos. “Acredito que o fato do programa sempre ter tido fé em mim,
mesmo nos momentos em que tive problemas na minha vida acadêmica, foi
fundamental”.
A psicóloga Gisela Lima, coordenadora do Ibab na Bahia,
explica o intuito do projeto: “A ideia não é resolver o problema da educação,
mas ajudar alguns que farão a diferença no futuro. O objetivo é beneficiar
alunos da rede pública que são pérolas e o melhor é que encontramos muitos”. Contando
com investimentos de empresas privadas, o programa seleciona os estudantes no
6º ano do ensino fundamental. Quando chegam ao ensino médio, a maioria dos
contemplados ingressa na rede particular e estuda com bolsas concedidas através
de parcerias do Ibab. Para Ícaro, que cursou o ensino médio no Colégio Cândido
Portinari, a experiência na rede particular também teve forte influência no seu
desejo de crescimento. “Quando via meus colegas com maior poder aquisitivo
realizando intercâmbios, tinha vontade de fazer também, pois percebi que seria
uma boa maneira de enriquecer como pessoa e de quebra teria o domínio de uma
língua estrangeira”, conta. Segundo Gisela Lima, os responsáveis pelo programa
têm uma preocupação especial para que a mudança na realidade dos estudantes
beneficiados não seja um fator negativo. “Temos que cuidar para não criar um
abismo entre o aluno e seus pais. Eles têm que respeitar a sua origem”,
explica. A mãe de Ícaro, Noêmia Doralício da Silva, revela que ficou receosa
quando o filho entrou num colégio particular. “Os colegas falavam de gastos que
ele não tinha condição e eu ficava preocupada com a cabecinha dele”, lembra
ela, que mal pode acreditar nas conquistas do próprio filho. “A gente dá toda
força, mas seria muito convencimento meu achar que ele ia chegar aonde chegou”.
Exemplo
O sucesso de Ícaro serve como exemplo para integrantes mais
novos do programa. Renan Carneiro, 20, estudante de Engenharia Mecânica da
Unifacs, pretende seguir os passos do colega e também ganhar uma bolsa do
Ciência Sem Fronteiras. “O Bom Aluno abriu nossa visão para o mundo”, diz. Para
Renato Funari, sócio da V10 Pneus, empresa que mantém o programa em Salvador,
os estudantes terminam multiplicando o conhecimento através do Bom Aluno. “Tem
alguns (ex-integrantes) que já mantêm novos estudantes do programa”, afirma. Ícaro,
com boa parte dos sonhos já realizados, assegura que vai ajudar outros
estudantes a conseguir o mesmo. “É um compromisso que todos os alunos assumem.
Essa iniciativa tem que continuar”.
Programa depende de empresas
O baiano é solidário. Nunca tivemos problemas para conseguir
bolsas”,diz Gisela Lima, coordenadora do Programa Bom Aluno em Salvador. Apesar
da afirmação, por falta de verbas, o instituto não conseguiu realizar seleção
em todos os anos desde que chegou à Bahia, em 2004. No estado, o Bom Aluno é
mantido somente pela V10 Pneus. Este ano, o programa conseguiu mais um
mantenedor, que acompanhará uma nova turma durante cerca de 11 anos, tempo
médio entre o 6º ano e a pós-graduação. Entretanto, ainda não foi definido
quando começa a seleção. Segundo Gisela, o apoio familiar é fundamental, já que
o programa exige disciplina. Dos 40 alunos selecionados em Salvador em oito
anos, 25 permanecem no programa. “Alguns desanimam e não podem ficar, porque
conta o desempenho acadêmico”, conclui Gisela.
Instituto vai em busca de estudantes
A seleção de novos estudantes para o Programa Bom Aluno
começa com a divulgação do projeto nas escolas públicas da cidade onde o
projeto está implantado, após a aprovação das secretarias de Educação municipal
e estadual. Em reuniões, o programa é apresentado às diretorias das escolas,
que, juntamente com professores e pais, selecionam os alunos com o perfil do
projeto. O estudante tem que ter idade máxima de 12 anos, pertencer a uma
família de baixa renda, estar no 6º ano, ter frequência escolar mínima de 90%
ao ano e média igual ou superior a 7 em todas as matérias, desde o 1º ano
primário. A partir da seleção dos alunos, eles passam por etapas que incluem
provas de conhecimento, dinâmica de grupo, entrevista individual e visita
domiciliar. O Instituto Bom Aluno tem ações também no Paraná, Rio Grande do
Sul, Rio de Janeiro e Minas Gerais.