Caetité - Um Lugar no Sertão 27

     

     Neste episódio de Um Lugar no Sertão, chegou a vez de mostrarmos um pouco do histórico e importante município de Caetité, um dos lugares da Bahia que mais cérebros exportou para o Brasil e para o mundo. Pelo seu território passam as rodovias BR 030, BR 430, BR 122, BA 156 e BA 937.  Possui uma área de 2.651,536 km² e tem quase 9 km de área urbana. Sua população em 2022, pelo Censo IBGE, chegou aos 52.531 habitantes, com projeção da população para 2024 em 54.572 pessoas. A densidade demográfica é de 20,6 hab./km². Localizada no sudoeste da Bahia, numa altitude de 825 metros e distante 645 quilômetros de Salvador, Caetité foi o primeiro polo regional de povoamento do alto sertão e, principalmente, foi pioneira na implantação e difusão da educação. 

     Caetité tinha uma área que saía de Ilhéus até Guanambi. Do seu território nasceram todos os municípios ao seu derredor, inclusive Vitória da Conquista e Guanambi. Mas tudo começou nas terras do 2º maior latifundiário da Bahia: Antônio Guedes de Brito. Foi o dono de 150 léguas de terras, do Morro do Chapéu até as águas do Rio das Velhas, em Ouro Preto – Minas Gerais, instituído como o morgado da Casa da Ponte. Só perdia para a Casa da Torre, de Garcia D’Ávila. Nas terras de Guedes de Brito nasce um dos primeiros povoados do Alto sertão da Bahia, provavelmente a partir da catequese de índios não hostis no século XVII e da ocupação para criação de gado.   

    O nome Caetité deriva da língua tupi e significa ”mata da pedra verdadeira ou grande”. O morfema ka’a - significa mata, itá – é pedra, e eté – para verdadeiro. Faz uma referência à formação rochosa no leste da cidade conhecida por Pedra Redonda. Todo o território foi originalmente habitado por indígenas da linhagem jê - tupinaens e pataxós, mas há estudos que citam, no final do século XVI, a presença dos índios Maracás - ou Paiaiás – que ocupavam a região entre a serra do Sincorá e a serra de Caetité. Há ainda referências de que no século XVII a região entre Minas do Rio de Contas e Caetité era ocupada pelos índios Aracapás. É justamente nesta época que Caetité já se transforma em núcleo de catequese. Do final do XVII data a fazenda São Timóteo, entreposto do ouro que descia das chapadas para o porto de Parati, no Rio de Janeiro. 

     O primeiro núcleo oficial de sua formação administrativa data de 1754, quando criado o distrito de Vila Nova do Príncipe que pertence à Vila de Minas do Rio de Contas, emancipada de Jacobina 30 anos antes. Em decreto de 26 de fevereiro de 1810, nasce a vila de Vila Nova do Príncipe, desmembrada de Rio de Contas. A instalação ocorreu em 5 de abril de 1810, data fixada como a da emancipação. A ascensão como cidade só ocorreu pela Lei Provincial nº 995, datada de 12 de outubro de 1867, aparecendo oficialmente pela primeira vez o nome Caetité. Daí em diante, vários distritos são criados e anexados ao município de Caetité. Só para se ter uma ideia, em 1911, Caetité tinha 10 distritos: Caetité, Aroeiras, Caculé, Canabrava, Bonito, Lagoa Real, Passagem da Areia, Rio do Antônio, Santa Luzia e São Sebastião do Caetité. Outros foram criados e anexados e viraram novos municípios. Ao todo, 47 municípios foram formados no território de Caetité.

     Hoje, Caetité tem, além da sede, quatro distritos: Brejinho das Ametistas, a 24 km; Caldeiras, a 60 km; Maniaçu, a 28 km; Pajeú do Vento, a 26 km. Também há povoações que se destacam como os povoados de Anguá, Campinas, Juazeiro, Santa Luzia e Umbuzeiro. Caetité faz limites com as cidades de Igaporã, Guanambi, Pindaí, Licínio de Almeida, Caculé, Ibiassucê, Lagoa Real, Livramento de Nossa Senhora, Paramirim e Tanque Novo.

     A importância da formação de Caetité não está apenas pautada no seu crescimento econômico por si só. Fatos confirmam a tenacidade do seu povo. A história registra episódios que são marcas registradas comuns às grandes nações. É como se fossem gritos dizendo “Estamos aqui”. Esses gritos datam de mais de 6 mil anos. Encontraram registros em sítios arqueológicos e fizeram nascer o Museu do Alto Sertão da Bahia (MASB), em fase de implantação em Caetité. Vale dizer que a população se mobilizou e comprou à Coroa Portuguesa o direito de tornar-se vila. Nada acontece em Caetité sem luta de seu povo. Algum tempo após a sua emancipação, Caetité participou indiretamente das lutas pela Independência da Bahia, apoiando o governo provisório instalado na Vila de Cachoeira. Encerradas as lutas contra as tropas portuguesas no Recôncavo Baiano, em Caetité teve lugar o episódio do Mata-maroto, lutas entre brasileiros e portugueses, que se seguiram a 1823. Em 1817, a vila foi visitada pela expedição de Spix e Martius. Os naturalistas ficaram impressionados com a localidade, inclusive registraram a existência de uma escola régia de latim em Caetité.

     Um fato inusitado ocorreu em Caetité, na casa do Major Silva Castro, herói das guerras de independência. Sua filha Pórcia Castro foi raptada por Leolino Pinheiro de Azevedo e isso acabou por inspirar tempos depois a criação do romance Sinhazinha, de Afrânio Peixoto. Teodoro Sampaio, considerado o primeiro grande pensador brasileiro, esteve em Caetité no final do século 19. O engenheiro afirmou que a cidade era uma “Corte do Sertão”.  De Caetité são destaques Aristides Spínola - ex-governador de Goiás e o mais jovem parlamentar no Império; Cezar Zama - grande polemista e maior adversário, na tribuna, de Rui Barbosa – ambos abolicionistas e republicanos. Em 1894, o primeiro governador eleito do estado nasceu em Caetité. Rodrigues Lima, genro do Barão de Caetité. Ele promoveu as primeiras ações efetivas do poder público estadual na cidade, inclusive a criação da 1ª Escola Normal do Alto Sertão.  

     Não podemos esquecer que, no começo do século passado, Caetité teve a instalação da Missão Presbiteriana Brasil-Central, com a morada na cidade do pastor Henry John McCall, e fundação da Escola Americana. Isso veio a incrementar a sua condição de polo educacional sertanejo, ampliado ainda mais com a instalação do colégio jesuíta São Luiz Gonzaga. Outros acontecimentos mostram a vocação da cidade para o progresso. Caetité foi a primeira cidade do interior baiano a ter uma rede de energia elétrica – trabalho dedicado do alemão Otto Koehne. Também foi pioneira na instalação de rede de água. Vale registrar a construção do Teatro Centenário, coisa distante para localidades interioranas. Um nome precisa ser lembrado na efetivação de muitas melhorias na cidade: Durval Públio de Castro.

     Figuras também importantes do município precisam ser lembradas. Os líderes políticos de outrora: Rodrigues Lima, o coronel Cazuzinha, o coronel Deocleciano Pires Teixeira, pai de Anísio Teixeira. No município nasceram figuras como Nestor Duarte, a pintora Lucília Fraga, os escritores Marcelino Neves, João Gumes, Nicodema Alves e, mais recentemente, Vandilson Junqueira, Erivaldo Fagundes Neves e outros. João Gumes foi o responsável por instalar em Caetité o primeiro jornal do alto sertão: “A Pena”, presente no acervo do Arquivo Público Municipal de Caetité. A diocese de Caetité foi instalada em 1915, e teve como primeiro bispo – dom Manoel Raimundo de Melo. O fato contribuiu positivamente para o desenvolvimento da cidade: nasce o primeiro aeroporto do sertão baiano, escala dos voos da então Cia. Aérea Sadia, o clube social Círculo Operário, o Seminário São José e a Rádio Educadora Santana – foram alguns dos benefícios derivados da elevação da paróquia em diocese.

     Não poderíamos deixar de destacar o educador Anísio Teixeira, um dos maiores destaques da luta para melhoria da educação no Brasil. Sua luta começa em Caetité pelas melhorias da Escola Normal, depois transformada no Instituto que leva seu nome. Ali estudaram figuras como Newton Cardoso, Georgino Jorge dos Santos, Tânia Martins e muitos outros. Quem visitar Caetité, precisa conhecer o trabalho da Fundação Casa Anísio Teixeira. Caetité, cidade defensora da liberdade, sofreu muito com o regime militar de ditadura de 1964. Os assassinatos obscuros de Anísio Teixeira e do poeta Camillo de Jesus Lima fizeram com que o tradicional polo de educação e cultura assistisse ao declínio, a partir dos anos 1970. Mesmo assim, ali teve início o trabalho de documentação das atrocidades do regime, graças ao pastor Jaime Wright.

     Numa lista que parece estar longe do fim, figuras importantes da vida baiana e brasileira despontam a partir de Caetité: Cezar Zama (parlamentar, historiador), Plínio de Lima (poeta, colega e amigo de Castro Alves), Aristides Spínola (advogado, governador de Goiás 1879-80), Joaquim Manoel Rodrigues Lima (primeiro Governador eleito da Bahia) e seu irmão, Antônio Rodrigues Lima, Anísio Teixeira (pedagogo), Joaquim Spínola (fundador da Revista dos Tribunais), Nestor Duarte (jurista, escritor), Paulo Souto (Governador da Bahia 1994-98; 2002-06), Prisco Viana (político, ex-ministro da Previdência Social), Haroldo Lima (político, ex-Diretor Geral da Agência Nacional do Petróleo, Cidadão Benemérito da Liberdade e da Justiça Social João Mangabeira), Aldovandro Chaves (advogado, cônsul honorário e poeta), a pintora Lucília Fraga e seus parentes Afonso e o jurista Constantino Fraga, o músico símbolo do estilo brega Waldick Soriano, José Neves Teixeira, Luiz Neves Cotrim, professor, poeta e cronista social, o ator Buiu (Edvan Rodrigues de Souza) do programa humorístico A Praça é Nossa, dentre outros.

     Convivi com o Dr. Antônio José Moreira Dias, quando estudante da Universidade Federal de Sergipe, médico hoje radicado em Feira de Santana. Morávamos numa república estudantil. Figura humana incomum. A primeira e única cirurgia que fiz em minha vida devo a ele. É natural de Caetité. A ele dedico esta reportagem.

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