O INSS deixou de ser um órgão protetor do cidadão. Hoje é um problema na vida dos que a ele precisam recorrer. (Foto:Marcelo Elias/Gazeta)
Num país onde o contribuinte nunca é priorizado em suas conquistas, levando séculos para serem concretizadas, uma auditoria aponta falhas do INSS no processo de análise de recursos previdenciários. As falhas foram apontadas pelo TCU, que avaliou eficiência, eficácia e transparência no tratamento de recursos, tendo em vista o aumento da quantidade de pedidos de revisão e do tempo de resolução dos casos.
O Tribunal de Contas da União (TCU) realizou auditoria no processo de recursos administrativos previdenciários, em que atuam o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Conselho de Recursos da Previdência Social (CRPS) e a Subsecretaria de Perícia Médica Federal (SPMF). O objetivo da fiscalização, realizada no primeiro semestre de 2021, foi avaliar a eficiência, a eficácia e a transparência no tratamento de recursos administrativos, tendo em vista o aumento da quantidade de casos e do tempo de resolução.
O trabalho do TCU demonstra que falta capacidade operacional aos órgãos, bem como procedimentos para monitorar a qualidade dos julgados. Foram identificadas, ainda, deficiências quanto à sistematização da jurisprudência pertinente e à transparência do processo. O principal efeito dos gargalos apontados é a desproteção dos direitos dos cidadãos, que normalmente dependem do benefício previdenciário para sustento próprio e da família.
O relatório aponta que a duração total dos processos tem sido quase quatro vezes superior ao prazo máximo estipulado nas normas. Em razão do longo tempo de espera, os cidadãos acabam recorrendo ao judiciário, aumentando o custo para o governo. “É preciso ter em mente que a demora na concessão de direitos legítimos precariza a cidadania diante da natureza alimentícia das verbas previdenciárias”, observa o ministro Aroldo Cedraz, relator do processo.
De acordo com a auditoria, seriam necessários mais de 16 anos apenas para cumprir os 274.777 acórdãos do CRPS pendentes. Destaca, ainda, que a tendência da fila no CRPS é de crescimento relativamente rápido: em média, surgem 48.880 novos recursos por mês, ao passo que o Conselho julga, em média, 34.107 ações mensais.
Apesar de o INSS ter decidido investir em inteligência artificial para agilizar a análise dos requerimentos pendentes, foram implementados algoritmos cuja resposta padrão passou a ser negativa diante de qualquer falha, resultando em quase 60% de recusa dos pedidos. “É essencial que algoritmos sejam validados de forma criteriosa, com seus resultados sendo submetidos à revisão humana pelo período necessário para se obter segurança de que não existem falhas detectáveis que possam trazer prejuízo a qualquer das partes”, pontua Cedraz.
Outras razões que contribuem para a incapacidade do INSS e do CRPS em atender adequadamente à demanda de recursos são: falta de uniformização de entendimento; ineficiências nos processos de recurso que tratam apenas de matéria médica; falta de clareza nas comunicações aos cidadãos que tiveram pedidos indeferidos pelo INSS; divergência sobre o modo de acesso dos conselheiros a informações dos sistemas do INSS e da Perícia Médica federal (PMF); baixa quantidade de processos relatados pelos conselheiros que não recebem jeton (gratificação paga em razão da participação em órgãos colegiados).
O TCU recomendou ao Ministério do Trabalho e Previdência e ao INSS que adotem ações para uniformizar o entendimento em relação a jurisprudências já pacificadas, facilitar o acesso dos conselheiros às informações necessárias para análise conclusiva do recurso, aumentar o nível de transparência aos cidadãos sobre a fila de recursos e aprimorar a automatização das atividades. A Corte orientou também que o INSS tome medidas preventivas para reduzir a quantidade de indeferimentos indevidos, disponibilize informações mais claras e detalhadas sobre a análise que motivou a decisão e reduza o estoque de processos pendentes de cumprimento de acórdão.
O relatório é uma prova inconteste de que o INSS deixou o cidadão em segundo plano, descumprindo normas, prazos e desconsiderando direitos consolidados dos constribuintes. Deveria ser um braço do governo na defesa dos segurados, mas funciona como uma madrasta má, desorganizada e incompetente. O INSS é a cara dos seus administradores e reflete o grau de preocupação dos governantes do país com o seu povo. Demorará muito para que o cidadão passe a ser o núcleo central de sua governança. A Constituição do Brasil ainda tem muita coisa que só existe na sua escrita, principalmente quando se trata dos direitos do cidadão.