O ministro da Educação Milton Ribeiro é apenas menos ruim que Weintraub. (Foto: O Liberal)
Muito se fala em Covid-19, em corrupção na compra de vacinas e no impeachment de Bolsonaro, mas há uma tragédia silenciosa que em breve veremos as consequências desabarem sobre nossas cabeças: o baixo nível educacional no Brasil. Sejamos justos! Destruir um sistema educacional não é coisa de um dia ou de um governo só. No nosso país a coisa vem se alastrando há muito tempo, mas o enterro definitivo da nossa educação poderá acontecer no governo de Jair Bolsonaro. O homem escolhido para coveiro é o pastor Milton Ribeiro, ministro da educação, que completará, no próximo sábado (10), um ano à frente da pasta. Se tudo continuar no ritmo deste primeiro ano, faltará pouco para o velório da nossa educação.
E não se trata de exagero! O jornalista Paulo Saldaña, da Folha de São Paulo, publica reportagem neste domingo (4) sobre o tema e faz um retrato realista, embora assustador, da administração do pastor frente ao Mec. No texto diz que Milton Ribeiro foi escolhido para acalmar os ânimos no Ministério da Educação após as confusões de Abraham Weintraub e que a atual gestão está marcada por polêmicas, ineficiência e reforço em questões ideológicas. "A administração do terceiro ministro da Educação de Jair Bolsonaro acumula erros em transferências de recursos e até suspeita de atuar a favor de um grupo educacional religioso. O período ainda é marcado por redução de orçamento e pela ausência de medidas para enfrentar os reflexos da pandemia na educação básica.", diz o texto.
Para Saldaña, Ribeiro assumiu o cargo com as escolas fechadas havia cerca de três meses por causa da pandemia. Secretários e especialistas cobram desde o ano passado por uma coordenação federal para garantir, entre outras coisas, conectividade para alunos e plataformas educacionais. O Congresso precisou derrubar o veto de Bolsonaro a uma lei aprovada que prevê a garantia de internet para estudantes. A única iniciativa efetiva do MEC na educação básica, segundo o jornalista, foi o incremento, a partir de outubro, de cerca de R$ 600 milhões no programa que envia dinheiro para as escolas. Entre as beneficiadas estão três escolas municipais de Heliópolis.
Apesar de tudo isso, o governo não investiu o que se esperava em educação. O programa Dinheiro Direto na Escola - PDDE, em 2020 com cerca de de R$ 1,7 bilhão, são os menores ao menos desde 2015, na comparação com valores atualizados. Só ficam acima dos de 2019, primeiro ano da gestão Bolsonaro. A pasta fechou o ano passado com recordes negativos de execução orçamentária na educação básica. Os gastos em educação representaram no ano passado 5,2% das despesas totais do governo; esse percentual já foi de 6,5% em 2016. O ministro já disse em entrevistas que não cabe ao MEC apoiar estados e municípios e que o sistema educacional já vivia dificuldades e desigualdades antes da pandemia, eximindo o governo Bolsonaro de responsabilidade pela situação atual. Ou seja, o governo que prometeu solucionar os problemas do passado está apenas cruzando os braços.
Em audiência no Senado na quinta-feira (1), voltou a defender a volta das aulas presenciais, mas admitiu que o MEC nem sequer tem um mapeamento de quantos alunos já voltaram. Confessou sua incapacidade, ineficiência ou má vontade. O pesquisador da FGV João Marcelo Borges, diz o texto de Saldaña, ressalta que Ribeiro não fez movimentos para batalhar por orçamento, não deu nenhuma solução educacional na pandemia e até projetos como o de alfabetização, lançados como prioridade do governo, andam a passos lentos. “Ele não conseguiu, não quis ou não recebeu a demanda de coordenar a política nacional de enfrentamento à pandemia e construiu as condições de ser um tipo de ministro que o Bolsonaro quer: que defende suas bandeiras sem precisar entregar soluções, já que a educação não está na agenda de Bolsonaro”, diz.
Na verdade, não uma política educacional definida no governo Bolsonaro, além de haver claramente falhas sob seu comando. A Folha revelou erros da ordem de R$ 766 milhões em transferências do principal mecanismo de financiamento da educação básica, o Fundeb. Em abril, mais um equívoco deixou matrículas de fora no cálculo da divisão dos recursos do fundo. O jornalista ainda diz que, nos primeiros meses no cargo, Ribeiro passou a ser apontado nos bastidores como decorativo, por não se inteirar das rotinas da pasta e dar preferência a agendas e viagens com o presidente. Com o passar dos meses, reforçou iniciativas ideológicas para se estabelecer no cargo.
Isso não quer dizer que não houve uma agenda. A única, e prioritária da educação neste ano foi a liberação do ensino domiciliar. Trata-se de uma pauta histórica de grupos conservadores e religiosos. Dentro da pasta, Milton Ribeiro tem mobilizado sua equipe para tarefas com esse caráter. O MEC chegou a mandar um ofício às universidades federais para tentar barrar manifestações políticas. Após repercussão negativa, teve de recuar e cancelou o ato. Chegou a dizer que iria olhar pessoalmente a prova do Enem para evitar questões que julgasse impertinentes. Recuou diante de críticas, mas determinou a criação de uma espécie de tribunal ideológico para fazer um pente-fino nos itens, como a Folha revelou. Com reações fortes, a publicação da portaria perdeu o ritmo de urgência dentro do Inep - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais.
Mas a tropa de choque bolsonarista está em atividade no Mec. Em outra ação de fundo ideológico, barrou um artigo em uma publicação do Inep porque o texto trazia evidências de efeitos positivos de uma política de alfabetização do governo do PT. Entretanto, para proteger interesses, o ministro está ativo. Em maio, a Folha de São Paulo revelou que o ministro atuou a favor de um centro universitário privado suspeito de fraude no Enade (avaliação do ensino superior). A Unifil, de Londrina (PR), é presbiteriana, assim como o ministro. Ribeiro protelou o envio do caso à Polícia Federal, recebeu os controladores da instituição, viajou duas vezes a Londrina e determinou que seu próprio secretário acompanhasse visita de supervisão — que absolveu a instituição. Para completar o serviço, ameaçou de demissão quem no Inep levasse o caso à esfera criminal. O MEC negou haver irregularidades.
Em mais uma ação danosa ao processo educacional, com o argumento de falta de dinheiro, a equipe de Ribeiro já havia decidido adiar a realização deste ano do Saeb, a avaliação da educação básica, e do próprio Enem. Mas o ministro mudou de opinião também após repercussão negativa. Nesse vaivém, a implementação do chamado Enem seriado e a expansão do Saeb para todas as séries foram abandonados. As ações haviam sido anunciadas pelo próprio governo, na gestão de Weintraub. Demitido da presidência do Inep em fevereiro, Alexandre Lopes diz que elas haviam sido pensadas em diálogo com secretários de Educação e também com o MEC. “As avaliações ajudariam nesse processo de identificar evasão e buscar informações”, diz. “Educação é processo que dá trabalho e custa dinheiro. O importante é como melhorar a aplicação dos recursos e nunca diminuir.”
O governo Bolsonaro está marcado por fazer, e muito mal, aquilo que é apenas constitucional e impossível de não fazer. Parece que sinaliza a ideia de que a educação não vai gerar nenhum dividendo político ao seu grupo. Dá a entender que quanto maior a ignorância maior será a durabilidade do seu governo. Para tanto, está enterrando a educação e Milton Ribeiro é uma espécie de coveiro. No texto de Paulo Saldaña, o pesquisador da FGV, João Marcelo afirma que o Brasil se permite ter um ministro que possui como reconhecimento o fato de ser um pouco menos pior que Weintraub. Apesar disso tudo, Jair Bolsonaro o mantém no cargo.