Landisvalth Lima
Cartaz da campanha de 1989. O maior partido do Brasil saia das urnas com menos 5% dos votos (Foto: Jonas de Carvalho/Museu Histórico Nacional) |
Se nos fosse permitido dialogar
com alguém que morreu, a pergunta do título seria a primeira coisa que faria ao
desvivido. E como responderia o ex-governador Waldir Pires que nos deixou esta
semana? Um homem que nasceu em Acajutiba no ano de 1926, atravessou a história
do país arrastando consigo a palavra sonho. Aos 24 anos foi secretário do
governo Régis Pacheco, responsável pela construção do açude de Heliópolis, e
que hoje dá nome à Rua das Pedrinhas. Em 1954 virou deputado estadual,
defendendo o governador Antônio Balbino. Em 1958 foi eleito deputado federal e assumiu
a vice-liderança do governo Juscelino Kubistchek.
Waldir Pires era o novo para a
Bahia. Quando se candidatou, em 1962, para governar o estado, inclusive com
apoio do Partido Comunista, perdeu o apoio da Igreja Católica. Foi derrotado
por uma ninharia de votos. Mas, com a chegada de João Goulart ao poder, Waldir,
advogado de formação, é chamado para ser o Consultor Geral da República. Segue o
golpe militar de 64. O sonho virou água. Seu nome constava na lista dos que
deveria ser preso. Exilou-se no Uruguai com a esposa Yolanda e os filhos. Em
1966 está na França. Ensina em universidades de Dijon e Paris e retorna ao
Brasil em 1970. Depois de readquirir seus direitos políticos, finca o pé
novamente na política.
Conheci Waldir Pires em Serrinha,
no início de 1982. Com a união do PP e MDB, nasceu o PMDB. Eu tinha 21 anos e
virei secretário do partido. Waldir disputava naquele ano uma vaga para o
Senado, em disputa contra Luiz Viana Filho. Era uma luta completamente
desigual. Fui com Waldir para a cidade de Teofilândia, num dia de feira na
cidade. Lá não tinha nem mesmo o partido organizado. Waldir pediu um tamborete
emprestado numa barraca e, já no alto, pedia a atenção dos passantes. Em alguns
minutos, cerca de doze pessoas começam a ouvi-lo. Enquanto eu distribuía santinhos,
prestava atenção no que dizia o candidato. Foi um dos mais belos discursos que
já tive a oportunidade de ouvir, só igualado pelo proferido por Marina Silva na
Fonte Nova, quando ainda vice de Eduardo Campos, nas eleições de 2014.
Waldir perdeu a eleição para
senador. Depois virou ministro da Previdência Social, chamado por Tancredo e
mantido por Sarney. Foi sua ótima passagem pelo ministério que o credenciou a
ser candidato ao governo da Bahia novamente. Eram as eleições da
redemocratização do país e chance para derrubar o carlismo na Bahia. Waldir vira
governador com uma frente de 1 milhão e meio de votos. Heliópolis vota em
Waldir e ajuda a eleger Gerbaldo Avena, irmão de dona Yolanda Pires, a deputado
estadual. Foi nesta época que conseguimos a verba para construção do Colégio
Waldir Pires, no primeiro governo de Zé do Sertão.
Waldir queria agora mudar o país.
Dois anos depois, renuncia ao governo para ser vice na chapa de Ulisses
Guimarães. O PMDB perde a eleição, mesmo com quase todos os governadores do
país, exceto Sergipe. Nilo Coelho, o vice que assumiu a Bahia, faz uma administração
desastrosa. Isso permite a volta triunfante do carlismo. Há vices para o bem e
para o mal. Waldir vira deputado federal por duas vezes, perde eleição para o
senado, vira ministro no governo Lula e encerra sua carreira política como vereador
em Salvador, pelo PT, em 2016, aos 89 anos.
Pode ser ironia do destino, mas
Waldir morreu filiado ao partido que lhe fez forte oposição quando era
governador. Nos portais do PT baiano e do PT nacional, há notas de pesar e um
pouco da história do ex-governador. A Rede Sustentabilidade divulgou nota no
seu portal lamentando a perda da importante figura de Waldir Pires. Pasmem!
Nenhuma linha escrita no PMDB. Nem da Bahia, nem do Brasil. Pode ser aceitável,
já que, em sua maioria, estão preocupados em se defender das centenas de
acusações de corrupção, ou articulando com advogados Habeas Corpus para tentativa
de soltura dos guardadores de malas e mais malas de dinheiro indecente. Não há
espaço para pensar nos bons nomes do velho MDB.
Voltando ao início do texto, a
pergunta insiste em se manter. Valeu a pena, Waldir? Respondo por ele sem titubear.
Claro que sim! Não consigo imaginar como seria a Bahia sem as ações políticas
de Waldir Pires. Não se constrói um estado progressista em um governo, numa
década ou em cinquenta anos. Waldir colocou vários tijolos numa construção
iniciada por alguns antes. Vez em quando vem um vendaval e derruba alguma
parede ainda com a massa úmida. Mas Waldir nos ensinou a seguir sempre e, se possível,
recomeçar. Pena que a vida é curta. 91 anos não são nada diante da história da
humanidade, mas sempre há alguém que retoma a luta, pega a bandeira e caminha
na busca de novos sonhos.