BRENO COSTA, LEANDRO COLON e FABIO
LEITE – da Folha de São Paulo
A Presidência da República gastou
R$ 135,6 mil para fazer publicidade oficial em cinco jornais de São Paulo que
não existem.
As publicações fictícias são
vinculadas à Laujar Empresa Jornalística S/C Ltda, com sede registrada num
imóvel fechado e vazio, em São Bernardo do Campo (SP). Essa empresa aparece em
11º lugar num ranking de 1.132 empresas que, desde o início do governo Dilma
Rousseff, receberam recursos públicos da Presidência para veicular propaganda
do governo em diários impressos. Embora esteja à frente de empresas
responsáveis por publicações de ampla circulação e tradição no país, como o
gaúcho "Zero Hora" e o carioca "O Dia", a Laujar não
publica nenhum jornal. Os cinco títulos da empresa beneficiados pela
Presidência inexistem em bancas do ABC Paulista, onde supostamente são
editados, não são cadastrados em nenhum sindicato de nenhuma categoria do
universo editorial e são completamente desconhecidos de jornalistas e
jornaleiros da região. Também não aparecem em cadastros municipais de jornais
aptos a fazer publicidade de prefeituras.
SEMELHANÇA
Além disso, exemplares enviados à
Presidência como provas de que as publicações existem contêm sinais de serem
forjados. A Laujar mandou as supostas edições do dia 15 de março do ano passado
do "Jornal do ABC Paulista", "O Dia de Guarulhos",
"Gazeta de Osasco", "Diário de Cubatão" e "O
Paulistano". Todas elas têm os mesmos textos --a única diferença é o nome
da publicação. Uma das "reportagens" apresentadas contém declarações
do então ministro do Trabalho, Carlos Lupi, dadas no próprio dia 15. O que
torna impossível a impressão ter ocorrido na data informada nos jornais. Na
verdade, o texto é uma cópia de uma nota publicada no site da Folha na tarde
daquele dia. As impressões têm também um suposto anúncio de meia página da
Unimed. A empresa de planos de saúde, no entanto, informou à Folha que nunca
fez publicidade em nenhum dos "jornais" da empresa Laujar. Também há
registros de pagamentos efetuados pela Caixa Econômica Federal à empresa, mas
os valores não foram divulgados pelo banco federal.
CHECAGEM
Para comprovar a existência de
uma publicação que receberá dinheiro público para veicular propaganda federal,
o governo exige apenas o envio de seis exemplares de datas aleatórias,
definidas pela Secom, que é a Secretaria de Comunicação Social da Presidência. Além
disso, o órgão pede documento, registrado em cartório, no qual é o próprio
responsável pelo veículo quem atesta sua tiragem. A Laujar, por exemplo,
declarou que seus jornais tinham uma tiragem total de 250 mil exemplares,
vendidos por R$ 2,50 cada. Se a informação fosse verdadeira, as supostas
publicações da empresa teriam, juntas, uma circulação parecida com a do jornal
"O Globo", a quinta maior do país. A Secom informou que, em maio,
excluiu a empresa de seu cadastro. Não pela inexistência dos cinco
"jornais", entretanto, mas porque segundo o órgão eles não falavam
sobre questões específicas dos municípios onde circulavam. Com isso, diz a
secretaria da Presidência, a empresa não cumpriu o princípio da
"regionalização" na distribuição de verbas publicitárias.
OUTRO LADO
A Secom (Secretaria de Comunicação Social da
Presidência), responsável pela liberação dos pagamentos à Laujar, disse que
seguiu todas as exigências internas para a efetivação dos repasses. Sobre o
critério que a levou a escolher os jornais da empresa, afirmou que seguiu a
"diretriz de regionalização" da publicidade oficial. Ainda assim,
informou em nota que, caso sejam encontrados "indícios de irregularidade,
não hesitará em adotar medidas administrativas e/ou judiciais, de forma a
garantir a preservação dos recursos públicos". A Presidência admitiu não
ter feito verificações "in loco" para checar a existência dos
jornais, mas citou o Anuário de Mídia produzido pela editora
Meio&Mensagem, voltado para o mercado publicitário, para respaldar a versão
de que os jornais existem. No entanto, a editora informou à Folha que não faz
checagem para a inclusão de veículos em seu anuário. Basta que a empresa envie
dados gerais, como a tiragem, por e-mail ou por telefone. A Propeg, agência que
repassou o dinheiro da Secom, disse que não havia restrição à Laujar quando a
verba foi transferida. "No exercício de 2011 não havia qualquer pendência
de comprovação que desabonasse o referido veículo", disse a diretora de
mídia, Neide Santos. A Caixa Econômica informou que a escolha dos meios de
comunicação "levam em conta critério técnicos de mídia e as necessidades
estratégicas da empresa". O dono da Laujar, Wilson Nascimento, disse que
os jornais existem. Ele afirma que o grupo de publicações existe há 24 anos e
que elas circulam de terça a sábado. "Você encontra nas principais bancas
da região [ABC Paulista]." Ao ser confrontado com a informação de que a
reportagem não encontrou os jornais, disse: "Na periferia você
encontra". Mas Nascimento não quis indicar em qual banca. Também se negou
a dizer o endereço da redação e do parque gráfico que diz possuir. Em
Guarulhos, por exemplo, donos de banca desconhecem os jornais. A pedido da
Folha, Nascimento mostrou dois exemplares. Ambos apresentam o suposto anúncio
da Unimed, que a própria empresa disse não ter feito, e textos copiados da
internet. Os títulos trazem no cabeçalho o mesmo lema da Folha, "um jornal
a serviço do Brasil". Sobre o anúncio da Unimed, Nascimento disse se referir
a um contrato com corretor "independente". Ele disse ainda que o
dinheiro que recebeu é menor do que o informado pelo governo.