CLÁUDIA COLLUCCI e JOHANNA NUBLAT
– da Folha de São Paulo
Manifesto lançado ontem por 14
instituições e 54 pesquisadores e ativistas do movimento anti-Aids aponta
sérios problemas no controle da epidemia da doença no país. Entre eles estão o
aumento no número de casos e de mortes. Dados do Ministério da Saúde mostram
que o número de casos de HIV passou de 33.166, em 2005, para 37.219, em 2010
(aumento de 12%). No mesmo período, as mortes pularam de 11.100 para 12.073
(aumento de 8,8%). "Não é uma situação esperada. Com a melhoria do
tratamento, deveríamos estar reduzindo o número de óbitos. Se tivéssemos uma
política de prevenção efetiva, não teríamos tantos casos novos", afirma
Alexandre Grangeiro, pesquisador da USP que assina o manifesto. O diagnóstico
tardio, verificado em mais da metade dos pacientes, é apontado como a principal
causa para o aumento de mortes. "Uma pessoa sem tratamento tem mais risco
de morrer e de transmitir o vírus para outras. Em tratamento, ela reduz em 94%
as chances de infectar outras pessoas." Segundo Grangeiro, o Brasil tem
uma epidemia muito específica, com 90% dos casos concentrados em 400
municípios, e um crescente aumento de casos entre a população jovem, que está
iniciando a vida sexual. Para Vera Paiva, coordenadora do Núcleo de Estudos
para a Prevenção da Aids (USP), é preciso reverter a "banalização" da
Aids. "Os pesquisadores estão mostrando que o povo acha que não precisa
mais usar camisinha, que é coisa de gente velha. E o vírus parou de circular?
De jeito nenhum." Paiva afirma que é preciso baixar a curva da doença,
estabilizada em patamar mais alto do que deveria, em sua avaliação. E que essa
é uma questão a ser resolvida por diferentes governos. "Não é um problema
específico do governo federal, é nacional.
Considerado uma referência
mundial, o programa brasileiro de DST/Aids tem sido bastante criticado. No mês
passado, durante uma conferência internacional em Washington, pesquisadores
fizeram alertas sobre a falta de médicos, leitos e exames para os pacientes com
HIV e de medicamentos para tratar doenças causadas pelos antirretrovirais. Durante
o evento, o coordenador de HIV/Aids da Opas (Organização Panamericana da
Saúde), Massimo Ghidinelli, disse que o aumento da pressão de grupos religiosos
e a redução das campanhas de prevenção dedicadas às populações de maior risco
são a principal ameaça ao programa brasileiro. "O programa precisa mudar e
se adaptar rapidamente a esses novos desafios da epidemia e manter um grande
enfoque nas populações vulneráveis", afirmou.
OUTRO LADO
O secretário de vigilância em
saúde do Ministério da Saúde, Jarbas Barbosa, questionou a leitura dos dados da
Aids feita pelo manifesto. "O óbito aumentou entre aspas. A população
aumentou, então a taxa de mortalidade está estabilizada." Ele faz o mesmo
raciocínio para o número de casos da doença e diz que a taxa de incidência caiu
nitidamente no Sudeste, onde a epidemia está consolidada. E isso, continua,
mesmo com o maior número de testagens feitas para o HIV. Sobre o percentual de
gestantes com o vírus em tratamento, Barbosa afirma que dados de 2011 mostram
que também há estabilidade. Ele diz que é preciso fazer uma análise epidemiológica
mais aprofundada dos números. E argumenta que os dados da doença no Brasil são
bons frente a países com características semelhantes. Segundo o secretário, a
política de Aids é aberta no país, discutida periodicamente com especialistas e
a sociedade civil. "Algumas questões que eles colocam como inquietações
são compartilhadas, estamos fazendo políticas para atendê-las." As
preocupações, diz, são a aproximação com os grupos mais vulneráveis (como
jovens gays) e testes precoces para a doença.