Nordeste do Brasil vive pior seca em 83 anos
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Quando Sobradinho está cheio, a caixa de água da velha Remanso fica submersa (foto: Blog do Tovinho Régis) |
O Lago de Sobradinho, maior da região
Nordeste, e que representa 58,20% de toda reserva de água da região, bateu
nesta sexta-feira (06) a menor nível da sua história: 3.58%. A reserva de Três
Marias, que representa 31,02% da capacidade de reserva de água, chegou a
preocupantes 12.31%. Já o de Itaparica, o menor dos três maiores com apenas
6,62% da capacidade da nossa região, está com menos de 10% de água armazenada. Pior
é que estes níveis não param de cair. É a pior seca em 83 anos. Na Barragem de
Sobradinho a situação é crítica.
Na zona rural de Medeiros Neto,
extremo sul da Bahia, Dona Maria dos Reis não vê água na torneira há mais de um
mês. "Muito quente, e a gente tomando banho aí com pouca água. Para beber
a gente tem que comprar água mineral", diz a aposentada. A barragem que
abastece a comunidade secou. Quando o caminhão-pipa quebra no meio do caminho,
então, os moradores têm que se virar como podem. "Pegando ela de pouco a
pouco, lava uma roupa, lava uma vasilha, toma um banho. Somos nós que controla
aí”, afirma a lavradora Maria da Silva.
No norte do estado da Bahia, a
situação também é crítica. O Lago de Sobradinho é o principal gerador de energia
elétrica da região, com o nível de água ainda mais baixo, prejudica diretamente
o abastecimento e a captação de água para a agricultura, afetando ainda mais a
população que vive às margens do lago. A vazão do reservatório de Sobradinho
está em 800 m³/segundo, um número bem menor que o volume normal e mais baixo
até do que a vazão durante o racionamento de 2001. Com a seca, o Rio São
Francisco pede socorro.
O Operador Nacional do Sistema
Elétrico diz que essa é a pior situação de Sobradinho nos últimos 83 anos. E
que nesse ritmo, a barragem pode entrar no volume morto entre novembro e
dezembro. Segundo o ONS, o reservatório vem sendo usado basicamente para o
abastecimento de água e quase nada para a geração de energia. E a crise hídrica
vai muito além de Sobradinho. O nível dos reservatórios do Nordeste vem caindo
nos últimos anos. Nesta sexta-feira (06), o volume despencou para menos de 8%
da capacidade total. Quase mil municípios da região decretaram situação de
emergência por causa da seca. Os estados mais afetados são a Paraíba, o Piauí e
o Rio Grande do Norte.
Os números do consumo dão uma
dimensão do impacto da seca na vida das pessoas. Em Salvador, por exemplo, uma cidade
que não sofre com a falta d'água, a média diária de consumo por habitante é de
250 litros, segundo a companhia de abastecimento. Já nas cidades maltratadas
pela estiagem, a realidade é bem pior. Em algumas delas, essa média por
habitante chega a ser de 20 litros por dia. É o caso de Quixeramobim, no sertão
do Ceará. Desde o início do mês, quando um reservatório que abastece o
município secou, 70% das casas vêm sendo abastecidas por caminhões-pipa. Quando
a água chega, é uma disputa. "A gente tem que se conscientizar que nós
estamos em um momento de anormalidade, que a gente tem que viver, infelizmente,
com menos água do que vivíamos", afirma o tenente Cleiton Baston, da
Defesa Civil.
Energia mais cara
Com a água cada vez mais
escassa, o Brasil está gastando energia mais cara, que vem das usinas térmicas.
É por isso, que a bandeira vermelha não sai da conta de luz todo mês. O governo
prometeu reduzir essa conta desligando 21 usinas térmicas. Desligou, mas não
adiantou. Dois meses depois de desligar as usinas térmicas mais caras, o que
aconteceu? As outras usinas passaram a produzir mais. Em julho, antes de
desligar as usinas, a produção era de: 12.539 MW. Depois, em agosto, subiu
para12.872 MW. Em setembro, pulou para quase 14 MW. E outubro nem terminou e a
produção das térmicas já ultrapassou os 12.600 MW. Para reduzir essa conta, vai
depender de São Pedro. O período de chuva começa em novembro, mas se a seca
continuar, a conta de luz vai ficar ainda mais cara no verão.
Estudos da NASA
Em Toronto, no Canadá, a Thomson
Reuters Foundation divulgou novos dados de satélite que mostram ser a seca no
Brasil pior do que se pensava. Só o Sudeste perdeu 56 trilhões de litros de
água em cada um dos últimos três anos passados, disse um cientista da agência
espacial dos Estados Unidos (Nasa) nesta sexta-feira. A pior seca do país também
tem levado o Nordeste brasileiro a perder 49 trilhões de litros de água a cada
ano nos últimos três anos, comparando com os níveis normais, afirmou o hidrólogo
da Nasa, Augusto Getirana. Os brasileiros estão bastante conscientes da seca,
dado o racionamento de água, blecautes e reservatórios vazios em partes do
país, mas esse é o primeiro estudo que documenta exatamente a quantidade de
água que tem desaparecido dos lençóis de água e reservatórios, disse Getirana. "É
muito maior do que eu imaginava", disse Getirana à Thomson Reuters
Foundation. "Com as mudanças climáticas, isso vai acontecer com mais e
mais frequência." O sistema da Cantareira, que fornece água para 8,8
milhões de moradores de São Paulo, tinha, por exemplo, menos de 11 por cento da
sua capacidade no ano passado, segundo autoridades locais.
A pesquisa de Getirana,
publicada nesta semana no Journal of Hydrometeorology, tem como base 13 anos de
informações dos satélites Recuperação da Gravidade e Experimento Climático
(Grace, na sigla em inglês) da Nasa, que circulam a Terra detectando mudanças
no campo de gravidade causadas pelos movimentos da água no planeta. O país não
tem uma falta de água absoluta, afirmou o pesquisador. O problema é que as
regiões muito povoadas, particularmente o Sudeste, dependem de aquíferos e
reservatórios locais, que não estão sendo reabastecidos devido à seca. Teoricamente,
a água pode ser transportada de outras partes do país para cidades afetadas,
disse ele, mas os custos financeiros e logísticos seriam enormes.
As novas informações de satélite
devem representar um chamado de alerta para os políticos gerenciarem melhor a
água e atuarem em relação às mudanças climáticas para lidar com a crise,
declarou Getirana. Os dados não permitem que os pesquisadores façam previsões
de quanto tempo a seca vai durar, disse ele, acrescentando que os níveis de
água continuaram a cair nos últimos meses.
Com informações de Chris
Arsenault, do portal MSN, e do G1.