Recorte
inédito do Censo mostra que alto índice de óbitos atinge, além da zona rural,
cidades médias e capitais da Região Norte
Levantamento inédito do Censo 2010, em que a população deu
informações sobre óbitos nas famílias, indica que, em média, 96 bebês morrem
por dia no Brasil. A taxa de mortalidade dos bebês - que se refere a crianças
de até 1 ano de idade - é de 3,4% em relação ao total de mortes registradas no
País. Para se ter uma ideia de como esse índice é elevado, a população
brasileira nessa faixa etária corresponde a 1,42% do total de habitantes. Além
de municípios pobres da zona rural, o Censo revela que a taxa de mortalidade de
bebês também é alarmante em cidades médias e em capitais da Região Norte.
Entre agosto de 2009 e julho de 2010, houve 1,034 milhão de
óbitos no País, mostram os números dos Resultados Preliminares do Censo 2010
divulgados no site do IBGE em junho passado. Desse total, 35.075 (3,4%) foram
mortes de crianças de até 1 ano. Os números estão disponíveis no site
ibge.gov.br, no banco de dados Sidra, tabela 3.151. Acompanhamento médico
deficiente de gestantes e recém-nascidos, carência de serviços básicos e falta
de profissionais de saúde são algumas causas das mortes de bebês. Pelos dados
do Censo é possível mensurar os altos índices de mortes de crianças de até 1
ano em regiões rurais de baixíssima renda - o que já era conhecido. Em Santa
Helena, no Maranhão, por exemplo, 20,6% de todas as mortes ocorridas no
município foram de bebês.
Capitais como Macapá (8%), Porto Velho (7,9%) e Manaus (6,1%)
também têm índices muito acima da média nacional de óbitos de crianças. Os
dados não permitem o cálculo da mortalidade infantil em 2010, que aponta o
número de mortes de bebês de até 1 ano para cada mil nascidos vivos, mas
indicam a proporção de mortes por faixa etária em comparação com o total de
óbitos. A partir do Censo 2010, o IBGE pretende criar uma nova base de dados de
mortalidade, com informações dos próprios entrevistados. Tradicionalmente, as
fontes para cálculos de mortalidade são as estatísticas de registro civil e o
sistema de informações do Ministério da Saúde, mas o IBGE tem apontado o
problema da subnotificação, especialmente nos óbitos de crianças. A
subnotificação se repete nos nascimentos. O Censo mostra que, em 2010, havia
32,270 milhões de crianças com até 10 anos no País, mas 599 mil (1,8%) não
tinham registro de nascimento em cartório.
Investigação. Coordenadora do Grupo de Pesquisa de Atenção à
Saúde da Mulher e do Recém-Nato da Universidade Federal Fluminense (UFF), a
professora Helen Campos Ferreira tem orientado trabalhos de investigação das
causas das mortes de bebês em Estados como Maranhão, Pará e Rondônia. "Os
dados do IBGE vão ajudar a cruzar os focos com as causas de mortes das
crianças", diz. Segundo Helen, pesquisas realizadas no Maranhão
descobriram em algumas cidades alto índice de mortes de bebês causadas por
infecções respiratórias. "Com a ajuda das universidades, os municípios
começam a desenvolver xaropes e medicamentos para tratar as crianças", diz
Helen. Em Porto Velho, relata a professora, equipes de saúde da família fazem
trabalho semelhante para buscar as causas das mortes infantis. O Censo indica
que os bebês de até 1 ano representam 1,6% da população de Porto Velho. Helen
destaca a importância das equipes de saúde da família no acompanhamento de
gestantes e dos recém-nascidos. Dados do Ministério da Saúde apontam a
existência de 32.081 equipes de saúde da família em 5.288 (95%) dos municípios.
Mas a distribuição dessas equipes pelo País é irregular.
Helen tem visto de perto a dificuldade dos Estados da Região Norte de atrair
médicos e enfermeiros. "Há um desinteresse pelo trabalho nestas áreas. Os
profissionais que estão lá acabam atendendo um grande número de famílias",
afirma a professora. Uma das preocupações de Helen é o cuidado com bebês
prematuros, que têm os primeiros atendimentos na maternidade, mas são logo
mandados para casa. "Essa criança precisa de atenção especial", diz. Entre
os municípios pequenos com maiores índices de mortes de bebês em relação ao
total de óbitos, duas características comuns são a alta proporção de moradores
na zona rural e a baixa renda média da população. Esses dois fatores são
agravantes para a dificuldade de atrair médicos e para o acesso das famílias a
hospitais ou postos de saúde. Professor adjunto de Pediatria da Faculdade de
Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), José Luiz
Muniz Bandeira Duarte afirma que os altos índices de mortalidade infantil são
"reflexo da saúde em geral" e critica governos e parlamentares pela
resistência em votar a emenda constitucional que fixa regras mais rígidas para
aplicação de recursos em saúde. "A assistência ao parto não é boa, faltam
leitos para os recém-nascidos, as unidades neonatais são trabalhosas e os
salários são baixos", diz o médico. Segundo ele, chama a atenção o alto
índice de mortes de bebês no primeiro mês de vida.