Policiais sendo mortos: face negra da falência da segurança no Brasil |
Numa semana em que o que mais se
discute é se Lula vai ou não vai ser candidato, ou se vai ou não vai ser preso,
o ministro da defesa, Raul Jungmann (PPS), soltou a frase que, acredito, sepultará
quaisquer esperanças do povo brasileiro no sistema de segurança pública. Jungmann
ressaltou, na revista ISTOÉ, o fato de que, na Constituição de 1988, entre 80%
a 85% da responsabilidade com segurança e ordem pública foram transferidas para
os estados, restando ao governo federal apenas o controle das polícias Federal
e Rodoviária Federal, que ficam encarregadas do controle das fronteiras e das
ações contra crimes transnacionais e o tráfico de drogas.
O que está nas entrelinhas desta
afirmação é que os estados brasileiros são incompetentes para gerir o sistema
de segurança pública. Daí o caos. “Há, sim, a influência da crise neste
processo, da falta de recursos para serem canalizados para a segurança pública.
E, também, porque não temos um fluxo estável de recursos orçamentários e
financeiros para a área de segurança. O país passa por uma das maiores crises
dos últimos 50 anos em termos econômicos e fiscais e a segurança pública
mergulha com o país nesta crise”, acrescentou.
Não podemos esquecer que poucos são os
segmentos que não enfrentam crise nestes tempos. Com segurança, posso citar
dois: cosméticos e bebidas. Parece que o país não se prepara nunca para o
futuro. Estamos numa sociedade que prioriza a estética e o entretenimento. Educação,
ética, moralidade, saúde e segurança estão sendo vistos como coisas supérfluas.
O importante é estar bem na fita. Um exemplo claro vem da crise enfrentada pelo
sistema penitenciário, com superlotações de presídios e presos mantidos em
situações adversas, como determinante para a falência do sistema e o avanço da
criminalidade no país. “Em razão da incapacidade do Judiciário de julgar os
processos, o sistema penitenciário brasileiro tem 30% a 40% dos presos provisórios
e temporários em suas celas. Ninguém sabe hoje, de fato, qual é o tamanho da
população carcerária do país. E quem acha que sabe está enganado”.
É inaceitável que presos tenham o
controle sobre o tráfico de drogas. De uma penitenciária de segurança máxima no
Brasil é possível mandar matar, prender, vender e roubar. E não será surpresa
que conte com a colaboração de funcionários públicos, advogados e até
políticos. Para Jungmann, foi nestes espaços que surgiram as grandes gangues: o
PCC, o Comando Vermelho, Amigos dos Amigos, Sindicato do Crime, Terceiro
Comando, Família do Norte. “Todos estes grupos criminosos, que surgiram dentro
do sistema penitenciário e a partir do sistema penitenciário, controlam o crime
nas cidades. Determinam ações criminosas e aterrorizam a população. Veja o
exemplo do Nem [o traficante Antônio Francisco Bonfim Lopes]. Nem está preso a
5 mil quilômetros do Rio, em um presídio de segurança máxima de Rondônia, e
ainda assim, é capaz de declarar uma guerra na Rocinha, e levar o governo
federal a convocar as Forças Armadas para tentar apaziguar o local.”
O ministro diz coisas que não podem
ser entendidas. Para ele, a impossibilidade de o governo federal não ter
mandato sobre a situação dos estados é prova da falência do sistema: “apenas em
situações extraordinárias, quando falecem as condições de controle por parte da
ordem pública, há um pedido dos governadores, e as Forças Armadas são chamadas
a interferir a pedido do governador, o que não deveria acontecer”. Mas se
acontece isso, não seriam os governadores os incompetentes? Se todas as vezes
que tivermos problemas for imperativo chamar o governo federal, para que então estamos
elegendo governadores?
Mas a fala do ministro tem outra curiosidade.
Ele defendeu a necessidade da criação de uma lei da responsabilidade da
segurança social no país, lei que deverá prever o mínimo em orçamento para a
segurança, e também promover uma redistribuição das responsabilidades entre as
três esferas da Federação. Mais uma lei, ministro? O que está na Constituição
não é suficiente. Por que diabo quando uma coisa dá errada logo se pensa na
criação de leis? Quantas leis foram criadas na área da educação? E onde está a
escola pública?
Para ele, é necessário cortar
toda e qualquer comunicação entre as diversas gangues existentes no país e suas
facções que se encontram em liberdade. “É necessário a adoção do parlatório:
tudo que o preso falar com o seu advogado, familiares ou amigos tem que ser
gravado. O que diz respeito a sua defesa não nos interessa, mas o que disser
respeito ao planejamento do crime tem que ser objeto de investigação. O que não
pode é acontecer de bandido ter cerca de 37 advogados, como é o caso de dois ou
três aqui do Rio. Para que que um bandido precisa de 37 advogados?”, questiona.
Terrível é saber que isso
acontece e ninguém faz nada! Enquanto isso, 14 policiais foram mortos só este
ano no Rio de Janeiro. Homens nas ruas morrem e advogados funcionam como pombo
correio, em nome do sagrado direito do bandido de se defender, ou do defensor
de ganhar seu dinheiro sujo. O ministro
defendeu uma varredura permanente em todos os presídios para evitar a entrada
de celular, botar bloqueador, aparelho de raio-x. “Estaremos em breve abrindo
um debate presidencial sobre o assunto embora ache muito difícil aprovar uma
lei nesse sentido em ano eleitoral”. Não sabíamos que precisávamos de uma lei
para isso. Se assim for, bandido tem voto e os urubus passeiam à tarde sobre os
girassóis.