FLÁVIA FOREQUE, MÁRCIO FALCÃO e FÁBIO
TAKAHASHI – da Folha de São Paulo
Pouco mais da metade (55%) dos
professores do ensino médio da rede pública do país não tem formação específica
na área em que atua. Na Bahia esse número chega a 91,5%. Em números absolutos,
o percentual equivale a quase 280 mil docentes do país. Em física, a proporção
de especialistas na matéria cai a 17,7%; em química, a 33,3%. Na rede
particular, a situação é só um pouco melhor: do total de professores, 47% não
possuem a formação ideal.
O levantamento, inédito, foi
tabulado pelo Inep (instituto de pesquisas do Ministério da Educação), a pedido
da Folha. A base é o Censo Escolar de 2012 (o mais recente). Os últimos dados
oficiais divulgados sobre deficit de professores no país referiam-se a uma
estimativa da Capes (outro órgão da pasta), com informações de 2005, que
englobavam também os anos finais do fundamental. Considerando as redes públicas
e privadas juntas, hoje 53,5% dos docentes do ensino médio não têm a formação
ideal. Naquele ano, eram 51% (fundamental e médio). A Bahia é o Estado que
possui menor proporção de professores com a formação ideal (8,5%) no sistema
público.
Fora da Lei
Na outra ponta da lista está o
Distrito Federal (71%). São Paulo possui 57% - o Estado afirma que, se o
professor não tem a formação específica na matéria, ao menos tem diploma em
área correlata (por exemplo, docente de matemática para física). "Não
existe uma oferta de profissional no ritmo que [a rede] precisa",
reconhece o secretário de educação básica do Ministério da Educação, Romeu
Caputo. Ele ressalta, porém, que parte do deficit é proveniente de matérias
recentemente incorporadas ao currículo, como sociologia e filosofia.
Para Ana Lúcia Marques, diretora
da escola Setor Leste, de Brasília, licenciatura faz diferença no ensino. A
escola, referência de ensino público na capital, diz ter todo corpo docente com
formação específica. "Uma pessoa que faz engenharia [e dá aula de física]
pode ter o domínio do conteúdo, mas não aprendeu o manejo da classe, que também
é extremamente necessário", disse a diretora. Para o professor de física
no Distrito Federal Paulo Sérgio Alves, 54, a especialização não é um fator
determinante, mas é importante. "Na área de física, a maioria dos
professores é de matemática porque sabe resolver, mas falta definição do
conceito, falta habilidade para passar de onde vem aquilo."
Na tentativa de reverter o
quadro, o Ministério da Educação lançou o pacto nacional para o fortalecimento
do ensino médio. A medida prevê a realização, a partir do próximo ano, do curso
de formação continuada para docentes da rede pública. Serão 90 horas de
capacitação, com bolsa mensal de R$ 200. O curso do ministério terá o objetivo
não apenas de atualizar o conhecimento dos professores na área de atuação como
desenvolver atividades para aproximá-lo dos alunos em sala de aula, afirma o
secretário da área.
Escolas privadas preveem apagão
de docentes
A rede privada está em situação
um pouco melhor do que a pública, mas apresenta percentuais baixos em algumas disciplinas.
Em 2012, de um total de 99.795 funções docentes, 52.863 (52,97%) tinham
formação específica. As disciplinas mais "deficitárias" são as mesmas
que as da pública, mas com indicadores melhores. Em física, por exemplo, pouco
mais de um terço tem licenciatura na área, o que representa quase o dobro do
percentual dos professores dessa matéria na rede pública.
A presidente da Fenep (Federação
das escolas privadas), Amábile Pacios, afirmou que o setor tem dificuldade em
preencher vagas em determinadas disciplinas e aponta um "apagão" de
mão de obra. Um dos motivos para esse cenário, avalia ela, é a baixa
remuneração. "O apagão que a gente está anunciando há algum tempo não vem
da falta de formação, mas da falta de incentivo dos professores para trabalhar
no ensino médio", afirmou Amábile. "É um problema que todo mundo vai
ter, porque os cursos de licenciaturas não são mais procurados", completou
a dirigente.
A Fenep, em parceria com a FGV,
está fazendo uma radiografia dessa situação dos docentes. De acordo com o Inep,
instituto responsável por apurar os dados do censo da educação básica, não é
possível detalhar a formação do contingente de professores que declararam não
ter licenciatura na matéria em que atuam. Segundo o Ministério da Educação, os
professores sem a formação específica são convocados, normalmente, por meio de
contratos temporários.