Rebeca Menezes – do Bahia
Notícias
Claudio Weber Abramo: A autonomia do MP permite a ele, inclusive, não fazer nada. |
Bacharel em matemática (USP),
mestre em filosofia da ciência (Unicamp) e jornalista no DNA – filho de Cláudio
Abramo, lenda do jornalismo, e Hilde Weber, chargista por meio século – Cláudio
Weber Abramo é autor de diversos artigos e publicações sobre corrupção. Desde
2000, atua como diretor-executivo da ONG Transparência Brasil. Em entrevista ao
Bahia Notícias, defende que a autonomia dada ao Ministério Público prejudica a
obtenção de informações.
Bahia Notícias – O poder público
tem sido transparente e acessível? Tem alguma ação que já esteja acontecendo
nesse sentido?
Cláudio Weber Abramo – Depende de
que poder público você está falando. O Brasil é grande, descentralizado. Muito
diferente entre as partes. Em geral você tem uma maior disposição de abrir os
atos do poder público na esfera federal, em um plano bem inferior estão os
estados - e muito diferentes entre si. Alguns andam mais e boa parte não anda -
e nos municípios é uma tragédia, não acontece.
BN – Quais as ações na esfera
federal que você acredita que têm mais destaque?
CWA – Depende da esfera, do
poder. Legislativo, Executivo, Judiciário... O principal é o Executivo, e o Executivo
federal tem impulsionado mesmo iniciativas no sentido de aumentar a
visibilidade sobre seus atos. É onde melhor anda, certamente.
BN – Você disse que o Ministério
Público é a instituição menos transparente do Brasil. Por quê?
CWA – Se você tomar o Ministério
Público como uma espécie de poder, não há nada mais opaco do que ele. Não se
conhece nada sobre o MP. Não se sabe quanto os caras ganham, você não sabe qual
é a distribuição de amigos e cupinchas, desses que nomeiam como cargos de
confiança... Não se sabe absolutamente nada. Mas fundamentalmente você não sabe
quão eficiente ou ineficiente o MP é. Não sabe se funciona, porque não dão
informação.
BN – E você acredita que isso
acontece por falta de regulamentação?
CWA – Acho que é uma
vulnerabilidade da forma como o MP é, de se atribuir autonomia a ele. O MP não
responde a ninguém.
BN – O que poderia ser feito pela
imprensa, pela população para conseguir essas informações?
CWA – Vocês é que tem que saber.
Chamar os caras e dizer "você me dê a informação". Porque só assim
que acontece, só com pressão. Voluntariamente nada acontece. Então a
responsabilidade primordial é de vocês. Tem que ficar enchendo a paciência
deles: cadê a informação, onde é que tá? E que informação? Você quer saber das
ações que o MP da Bahia apresenta, que os procuradores oferecem no Judiciário?
Quantas são derrubadas em segunda instancia? Isso é uma maneira de medir.
Quantas não são nem recebidas pelo juiz porque são mal instruídas? Isso é informação
crucial para você saber a eficiência. Não é a única informação, mas é
importante.
BN – Dentro dessas instâncias há
uma estrutura capaz de fornecer essas informações?
CWA – Não, Não há. Não estão
interessados. Não tem nem estrutura pra mandar o cara fazer alguma coisa. O
sujeito obedece se quiser, porque não existe nenhuma espécie de hierarquia
funcional no MP. Na prática não existe. Você não pode dar uma ordem para o
promotor de justiça que ele "não, eu tenho autonomia, não vou obedecer".
Nenhuma organização funciona sem hierarquia, não é possível. Então o MP, embora
evidentemente tenha prestado relevantes serviços desde 88, depois que publicou
o seu caráter, vai ficar deitado nos louros e isso não vai levar a lugar
nenhum. Porque essencialmente o MP é muito mal estruturado.
BN – E como resolver?
CWA – Quem deveria cobrar não
cobra. O Legislativo não cobra. O Executivo, ao qual o MP pertence, se pela de
medo e não vai fazer. O MP não é nada mais do que uma repartição do poder
Executivo. Mas tem lá toda uma conversa de não sei o quê, elege o cara,
procurador, essas coisas... Então o Executivo não vai em cima, "o senhor
obedeça aí". O Judiciário é só o poder moderador, não tem iniciativa nessa
direção. A imprensa, as ONGs, não pressionam. Se não é cobrado por ninguém,
ninguém vai fazer nada.
BN – Você disse que a imprensa
não pressiona. No caso do mensalão vários juristas e advogados criticaram o
papel da imprensa e a pressão que ela fez ao STF para que os réus fossem
julgados, condenados e presos. O que você acha dessa situação? Acha que a
imprensa foi correta?
CWA – A imprensa noticiou. O caso
do mensalão interessava muito a imprensa porque envolvia as pessoas mais
importantes do poder federal na época, o partido que detinha o poder no
Congresso nacional. Isso evidentemente levanta a curiosidade da imprensa. O
comportamento dela em relação ao mensalão, segundo eu enxergo, foi consequência
dos fatos. A imprensa não criou os fatos. Pelo contrário, né? Não é que não
existiu um caso e a imprensa inventou. Isso não aconteceu.
BN – Mas a postura do STF também
foi criticada. Foi emitido um manifesto de juristas e advogados...
CWA – Tem manifesto de
intelectual, artista, jurista, não sei o que mais, falando sobre diversos
aspectos do caso do mensalão. Muitos. Houve manifestações... As mais vocais
foram essas dizendo que não podiam ter decidido de um jeito ou de outro.
Evidentemente que não me cabe decidir questões de natureza jurídica. Agora,
muito daquilo que se reclamou me parece que tão reclamando... sabe? Que é o tal
do "jus sperniandi". Os caras tão reclamando de birra. E fazem o quê?
Coloca só a tropa de choque pra fazer. É isso aí, é política. É disso do que se
trata. Não tem honestidade intelectual nisso. O fato de você chamar... Você
sabe o que é um jurista? É uma profissão, isso? Não. Jurista é o advogado que
ganha muito dinheiro, e que dá parecer. É um nome cheio de história para um
cara que é um advogado, simplesmente. Não tem nenhum valor com isso. Só porque
é chamado jurista, não quer dizer que esse cara seja sensato. Ele pode ser um
idiota, ou mal intencionado, desonesto... Ou pode ser honesto também.
BN – Você acredita que a situação
em outros países da América Latina, em relação a essa transparência, é melhor
ou pior?
CWA – Do que eu conheço de
América Latina, o Brasil tá bem situado. Não há muitos países que tenham o grau
de informação proporcionado pelo Estado como o Brasil. O Chile, por exemplo,
que é um país sempre mencionado, não chega nem perto.