MARTA SALOMON, ENVIADA ESPECIAL
/ PETROLINA (PE) - O Estado de S.Paulo
Projeto de Irrigação Pontal - Petrolina (PE) |
Cabras vagueiam ao longo da
obra inacabada do Perímetro de Irrigação Pontal, em Petrolina (PE), em meio aos
carros-pipa que levam água de canais que nada irrigam para comunidades do
semiárido. Perto dali, no reduto político da família de Fernando Bezerra
Coelho, funciona o maior projeto de irrigação do País, o Nilo Coelho - nome de
um tio do ministro da Integração Nacional -, que produz mangas e uvas para
exportação.
Os dois perímetros já
consumiram R$ 1,1 bilhão em verbas públicas, segundo a Companhia de
Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf). O governo
prevê investimentos de mais R$ 160 milhões no Pontal e no Nilo Coelho até 2015,
por meio do Programa de Aceleração do Crescimento. Mais importante: os dois
estão em primeiro lugar no plano do governo de busca de parceiros privados para
levar adiante os projetos de irrigação do País, cuja sustentabilidade está
posta em xeque, segundo constatou o Estado em visita à região. Para produtores
e potenciais investidores, a emancipação dos perímetros é possibilidade remota.
O tema estará na pauta da reunião ministerial de amanhã com a presidente Dilma
Rousseff.
Eventuais ineficiências à
parte, um dos principais problemas da agricultura irrigada é o custo da água.
No Distrito Nilo Coelho, o produtor pequeno paga, em média, R$ 800 por mês de
água. O custo reflete, basicamente, o consumo de energia elétrica das bombas
que puxam as águas do Rio São Francisco para os canais de irrigação. "O
custo de produção da manga só é viável a partir de altas produtividades, acima
de 30 toneladas por ano", calcula Caio Coelho, irmão do ministro da Integração,
dono de uma das maiores fazendas do Nilo Coelho, que rendeu a Petrolina o
epíteto de "Califórnia sertaneja".
Produtor vip. A fazenda de Caio
Coelho, a UPA - Umbuzeiro Produções Agrícolas Ltda., detém um canal exclusivo
no projeto que leva o nome do tio. Os negócios prosperam, mas o irmão do
ministro não vê chance de emancipação do Nilo Coelho. "Em função do
tamanho da sua área e da diversificação das culturas, é indispensável a
presença da Codevasf. Não vejo a emancipação como boa alternativa."
Os Coelhos fizeram fama
política no sertão de Pernambuco a custa de projetos de irrigação. O Perímetro
Nilo Coelho começou a operar em 1984, bancado pelo regime militar. Ou na época
da "revolução", como prefere dizer um dos tios do ministro, Oswaldo
Coelho, dono de outra fazenda, a Barreiro de Santa Fé.
Perímetro irrigado Nilo Coelho |
Em relação à busca de parceiros
privados para operar os perímetros, os Coelhos se dividem. Enquanto o ministro
aparece como principal mentor do modelo, defendido em estudo da Secretaria de
Irrigação de sua pasta, o tio Oswaldo critica: "É a maior estupidez do
mundo, uma insensatez, uma barbaridade, é tirar o sonho do camarada que um dia
pensou em ser irrigante, invenção de gente desocupada". Segundo a proposta
em estudo na Integração, no programa Mais Irrigação, a União repassaria a
operação e a manutenção dos perímetros à iniciativa privada "para efetivar
sua emancipação", mas em troca da "contraprestação" de até R$
600 por hectare por ano ao sócio privado.
Os pequenos e médios produtores
temem que a garantia de lucro para o parceiro privado represente o aumento do
preço da água. "Existe uma hostilidade muito grande em relação à
PPP", relata Paulo Sales, gerente executivo do Distrito de Irrigação Nilo
Coelho, entidade privada sem fins lucrativos que administra a área irrigável de
220 km². Investidores privados não cogitam abrir mão de subsídios federais.
"O semiárido é a região mais inóspita do País. A agricultura irrigada não
suporta os custos do processo, devendo ser subvencionada", diz Carlos
Cavalcante, diretor da Agrovale, uma das empresas que participam das
negociações com o governo.
O Ministério da Integração
conta com o apoio do Rabobank para prospectar investidores. O banco de origem
holandesa foi contratado em parceria com o Banco Mundial e trabalha com a
previsão dos primeiros leilões no primeiro semestre deste ano. O grupo Queiroz
Galvão também participa das negociações, mas sem grande entusiasmo. "Não
encontramos a equação econômica que motive a empresa", disse o diretor de
negócios do grupo, Sérgio Lima.