Em pleno ano eleitoral,
Orçamento de 2012, que previa inicialmente repasses de R$ 2,4 bi para
entidades, foi alterado para 3,4 bilhões!
Marta Salomon, de O Estado de
S.Paulo
BRASÍLIA - Personagens
coadjuvantes na queda de três ministros no primeiro ano de mandato da
presidente Dilma Rousseff, as entidades privadas sem fins lucrativos foram
autorizadas a receber quase R$ 1 bilhão extra no Orçamento de 2012, ano
eleitoral. A proposta orçamentária original chegou ao Congresso prevendo
repasses de R$ 2,4 bilhões às organizações não governamentais (ONGs), mas,
inflados pelas emendas parlamentares, os gastos poderão alcançar R$ 3,4
bilhões. A lei orçamentária será sancionada pela presidente nos próximos dias.
O aumento do dinheiro destinado a essas entidades acontece no momento em que o
governo tenta conter as irregularidades no repasse de verbas para as ONGs,
estimuladas por uma dificuldade crônica de fiscalizar as prestações de contas
desses contratos. O aumento dos repasses surpreende sobretudo pelo valor. No
Orçamento de 2011, o aumento de verbas aprovado pelo Congresso para as ONGs foi
de R$ 25 milhões. No de 2012, o volume é 38 vezes maior: R$ 967,3 milhões. Os
gastos extras estão concentrados nos ministérios da Saúde, do Trabalho e da
Cultura. De acordo com o Tribunal de Contas da União (TCU), o atraso médio na
apresentação das prestações de contas cresceu em 2010 e alcançou 2,9 anos. Já a
demora na análise das contas diminuiu, mas ainda é de inacreditáveis 6,8 anos,
em média. Os problemas não se resumem à falta de fiscalização. A
Controladoria-Geral da União (CGU) já apontou o desvio de verbas em entidades
contratadas em pelo menos cinco ministérios diferentes.
Pente-fino. No final de
outubro, em meio a denúncias de desvios na aplicação de verbas dos ministérios
do Trabalho, do Turismo e do Esporte, a presidente Dilma Rousseff determinou
uma devassa nos contratos, que só poderiam ter pagamentos retomados com o aval
do ministro e sob sua responsabilidade direta. Quase três meses depois, o
governo não informou ainda o número de entidades que poderão ser obrigadas a
devolver o dinheiro que receberam e não poderão celebrar novos contratos. Não
se sabe quantas entidades tiveram os recursos liberados, depois do bloqueio
inicial. O prazo para resolver as pendências termina no final do mês. Esse
trabalho tem como objetivo separar entidades eficientes daquelas que desviam
dinheiro. O aumento dos repasses a ONGs aprovado pelo Congresso vai na
contramão das restrições impostas pelo governo, ao exigir que as entidades
beneficiadas tenham de passar por seleção prévia e mostrar experiência na área
para as quais foram contratadas. Nos últimos anos multiplicaram-se as entidades
de fachada e sem qualificação, pois, a pretexto de evitar a burocracia, bastava
a apresentação de três declarações atestando a existência da ONG para que ela
fosse contratada para prestar serviços à União. “O governo estabeleceu travas
importantes para que os problemas não se repitam”, avalia a ministra do
Planejamento, Miriam Belchior.
Corrupção. Investigações de uma
Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso, da CGU e do TCU
identificaram reiteradas irregularidades em entidades. Desde 2002, pelo menos,
o relatório final da CPI das ONGs já alertava para a proliferação de entidades
“sem que haja qualquer mecanismo institucional de controle sobre as atividades
que desenvolvem”. Depois disso, em 2006, a CPI dos Sanguessugas revelou esquema
de 53 entidades que haviam desviado dinheiro de convênios para a compra de
ambulâncias.
Campeão. Em 2012, é o Fundo
Nacional de Saúde (FNS) o destino da maior parcela de gastos extras autorizados
pelo Congresso: foram R$ 726 milhões extras, que elevam as autorizações de
gastos para R$ 1,2 bilhão. O Ministério do Trabalho vem logo em seguida no
ranking dos principais destinos do dinheiro extra. O Orçamento das ONGs
aumentou R$ 49 milhões, para R$ 187 milhões. No final do ano passado, o TCU
mandou suspender convênios do Ministério do Trabalho com entidades privadas sem
fins lucrativos ao detectar 500 prestações de contas com análises pendentes.
Suspeitas de corrupção envolvendo ONGs derrubaram o então ministro Carlos Lupi.
No ano passado, ONGs receberam R$ 2,8 bilhões dos cofres públicos –
considerando os pagamentos efetivamente feitos. O Ministério da Ciência e
Tecnologia concentrou a maior parcela dos pagamentos, com R$ 873 milhões de
gastos. Os ministérios da Educação e da Saúde aparecem na sequência.