Época acusa Negromonte de agenciar patrocínio para a Festa do Bode


O ministro das Cidades usa o cargo e arranca patrocínio estatal para evento no interior da Bahia que promoveu os interesses políticos de sua família
     Isabel Clemente – Revista ÉPOCA.
     As festas do bode fazem parte da tradição do interior nordestino. Em muitas cidades, as comemorações misturam exposições dos caprinos com muita comida, música e concursos entre vaqueiros a pé laçando os animais soltos no mato. A realização de uma dessas festas na semana passada em Paulo Afonso, município no norte da Bahia, mereceu a atenção de um ilustre representante da região, o ministro das Cidades, Mário Negromonte. Os cartazes da 11a Festa do Bode espalhados pelas ruas destacaram o nome e o cargo de Negromonte e do filho, o deputado estadual Mário Filho, ao lado dos logotipos de sete órgãos públicos apresentados como patrocinadores.
     A exibição do nome dos dois políticos no cartaz de divulgação de uma festa paga, pelo menos em parte, com verbas oficiais materializa uma situação delicada para um ministro ou um deputado. A legislação brasileira proíbe a promoção pessoal no exercício de cargos públicos. Veda também qualquer ato que possa ser caracterizado como campanha eleitoral antecipada. Para entender o exato envolvimento do ministro das Cidades com o bode de Paulo Afonso, é importante reconstituir os antecedentes da festança. O assunto foi tratado publicamente por Negromonte na manhã do dia 22 de outubro, durante a inauguração de uma estação de piscicultura em Paulo Afonso, obra realizada com verbas do Ministério da Pesca e do governo da Bahia. Acompanhado por Mário Filho, pela mulher, Ena Vilma, prefeita de Glória, município a 10 quilômetros de Paulo Afonso, e por vários outros aliados, Negromonte soube na ocasião que seu correligionário Delmiro do Bode, ex-vereador do PP, tinha dificuldades para obter patrocínio para a festa.
     Delmiro é cabo eleitoral de Negromonte e responsável pela Coomab, cooperativa que fez a festa. Nos dias anteriores à inauguração da estação de piscicultura, tentava sem sucesso arrancar verbas de órgãos como a BR Distribuidora, o Banco do Nordeste e a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (Chesf), uma estatal do grupo Eletrobras. Na frente de várias pessoas, Negromonte deu um telefonema para a Chesf e falou com um interlocutor sobre os problemas da festa. À noite, o ministro e Delmiro do Bode estiveram juntos num encontro do PSL em Paulo Afonso. Ele estava acompanhado, mais uma vez, de Mário Filho. Poucos dias depois, a Chesf autorizou a liberação de R$ 70 mil para o evento de Delmiro do Bode.
     A boa vontade com a festa de Paulo Afonso é uma novidade na Chesf. A estatal nunca colocara dinheiro na produção anual de Delmiro. A empresa tem critérios para patrocínios predefinidos e registrados no portal oficial. As regras internas impedem contribuições financeiras para “eventos que possam caracterizar promoção pessoal de autoridades”. As marcas da BR Distribuidora e do Banco do Nordeste estão no cartaz indevidamente, segundo as assessorias das duas empresas. No caso da distribuidora da Petrobras, o projeto de Delmiro do Bode “não se enquadrava na política de patrocínios”.
     O Banco do Nordeste também informou que o pedido não cumpria as formalidades exigidas pela instituição. Os outros órgãos citados no cartaz são ligados à Secretaria de Agricultura da Bahia. Disseram a ÉPOCA que entraram com apoio técnico, palestrantes e inspeção dos animais. A homenagem a Negromonte nos cartazes, segundo Delmiro, é uma retribuição a favores prestados pelo ministro. “Ele sempre ajuda com alguma coisinha, mas neste ano nem vi o ministro”, diz Delmiro. Não é a primeira vez que Delmiro do Bode põe o nome de Negromonte nos cartazes de suas festas. Ele fez a mesma coisa em 2009, quando Negromonte se preparava para disputar mais um mandato de deputado federal. Não foi repreendido.
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