Denúncias
de corrupção, lobby e venda de emendas parlamentares na Assembleia Legislativa
de São Paulo colocam sob suspeita os 94 deputados estaduais
Alan
Rodrigues e Pedro Marcondes de Moura – Revista ISTOÉ - edição 2186.
Se o
caixote modernista de 36 mil metros quadrados que abriga a Assembleia
Legislativa de São Paulo (Alesp), no Parque do Ibirapuera, estivesse pintado de
preto, ele seria uma redundância. A atividade dos 94 deputados estaduais
paulistas, que administram um orçamento de R$ 700 milhões, é uma notável
caixa-preta. Pouco se sabe do que acontece lá dentro. Até a identidade das mais
de três mil pessoas empregadas na Assembleia só será divulgada depois de uma
decisão judicial do Supremo Tribunal Federal – durante 11 anos, os
parlamentares recorreram contra a divulgação. Agora, no entanto, uma leve luz
foi jogada sobre o funcionamento do Parlamento por um de seus mais ilustres
integrantes. Com a experiência de quem cumpre seu sexto mandato, o deputado
Roque Barbiere - PTB - (foto) disse, numa entrevista ao jornal “Folha da Região”, do
interior paulista, que boa parte de seus colegas vive e enriquece com a venda
de emendas parlamentares. A Assembleia não passaria de uma casa de negócios.
“Não é a maioria, mas tem um belo de um grupo que vive e sobrevive e enriquece
fazendo isso”, denunciou Barbiere. Sem rodeios, ele disse que 25% a 30% dos
colegas negociam emendas e fazem lobbies para empresas. O deputado não deu
nomes nem citou fatos que confirmassem suas denúncias, mas ninguém se dispõe a
contraditá-lo de frente. Roquinho, como é conhecido, sabe bem como ocorrem as
tramitações das emendas orçamentárias na Casa – solicitação de liberação de
recursos encaminhada por cada parlamentar ao governo estadual.
É prática
na Alesp que cada deputado estadual tenha R$ 2 milhões anuais para destinar à
área que quiser, da compra de um simples equipamento médico até a construção de
uma estrada. De acordo com a denúncia, os parlamentares se aproveitam desse
subterfúgio para embolsar dinheiro, muito dinheiro, de comissão das
prefeituras, entidades e empresas recomendadas para execução das obras e compra
de materiais. Na verdade, as emendas do orçamento são como o toma lá dá cá da
política brasileira. Na versão paulista, os deputados se locupletariam com o
dinheiro público sem medo de ser identificados, já que não existe transparência
pública por parte do governo estadual e tampouco da Assembleia na liberação das
verbas, a não ser quando as emendas são destinadas à área social, como Ongs,
publicadas no “Diário Oficial” do Executivo e Legislativo. O “Diário Oficial”
deixa de publicar o nome dos responsáveis de várias solicitações (leia quadro).
A falta de informações sobre as emendas é tão escabrosa que a deputada Vanessa
Damo (PMDB) teve que recorrer, em abril deste ano, ao “Diário Oficial” para
questionar o governo, do qual ela faz parte da base, sobre a liberação, ou não,
de uma solicitação feita em 2009.
Obscuro
ou não, o certo é que a denúncia ganhou ainda mais substância depois que veio
a público uma entrevista do secretário de Meio Ambiente do Estado, deputado
estadual licenciado Bruno Covas. No áudio, ele diz que um prefeito o procurou
para repassar a comissão de uma emenda de sua autoria, o que ele não aceitou. O
tucano, que esta semana disse ter sido mal interpretado, não foi, no entanto, o
único a sofrer esse tipo de assédio. O deputado Major Olímpio (PDT) confirmou à
ISTOÉ o escândalo. “Coloquei uns cinco (lobistas) para fora da minha sala. Eles
falam em contribuições ou contrapartidas políticas, um jeito mais suave de
chamar propina”, diz Olímpio. “São muito graves essas denúncias”, diz o
parlamentar Geraldo Cruz (PT). Autor do pedido de uma CPI para investigar o
caso, até a quinta-feira 28 o petista já colecionava 29 das 32 assinaturas
necessárias para a abertura das investigações.
Os
estilhaços atingiram também o Palácio dos Bandeirantes, sede do Executivo
estadual. Afinal, parte do governador a autorização para liberação dos
recursos. Num primeiro momento, o governador Geraldo Alckmin desqualificou as
denúncias. Agora, já admite a falta de transparência e anuncia medidas para
minimizar os problemas. Oito meses antes de o escândalo vir a público, Barbiere
questionou formalmente a Casa Civil do governo de São Paulo sobre quais
deputados destinaram emendas a entidades e obras públicas. Até hoje, não
recebeu resposta. O secretário da Casa Civil do Estado, Sidney Beraldo (PSDB),
afirmou, na quinta-feira 28, que Alckmin determinou o levantamento dos
convênios oriundos de emendas parlamentares assinados em 2011 para
encaminhamento à Assembleia como forma de contribuir com as investigações e
ordenou “transparência total” em relação às emendas, publicando-as em sites
oficiais com a indicação dos deputados que as solicitaram. O secretário
admitiu, porém, que o levantamento que está sendo feito contempla apenas os
anos de 2009, 2010 e 2011. Disse não saber se teria como pesquisar os anos
anteriores. A resposta é simples: abram-se os arquivos.