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Poucas & Boas nº 110: Onde está a mudança?

Aberta a temporada de negociatas


                            Landisvalth Lima
Rui Costa
Li na Tribuna da Bahia, neste 25 de janeiro, a reportagem de Fernanda Chagas onde se vê a mobilização de Rui Costa para ser o escolhido de Wagner como sucessor no governo baiano. Lá diz que o deputado do PT sai na frente e visitará mais de setenta municípios com o fim de ganhar musculatura na luta pela indicação do PT e que a disputa para suceder o governador Jaques Wagner em 2014 ganha cada vez mais força na base aliada, e em especial no PT, cujo próprio líder petista afirmou que a sigla possui legitimidade e precisa acelerar o processo rumo à vitória. E, sem dúvida, articulações não têm faltado neste sentido, assim como nomes.
A reportagem afirma que estão no páreo o secretário da Casa Civil, Rui Costa, tido como o preferido do governador, o senador Walter Pinheiro, cuja experiência política é bastante lembrada, e ainda outros avaliados como de menos peso, como o secretário de Planejamento Sérgio Gabrielli, o ex-prefeito de Camaçari Luiz Caetano, assim como a ex-prefeita de Lauro de Freitas Moema Gramacho. Ainda o texto afirma que em meio à busca por espaços e, consequentemente, futura densidade eleitoral, por exemplo, não passou despercebido o anúncio por parte de Rui Costa de que a partir desta sexta-feira (25/1) os membros do Comitê Estadual para Ações de Convivência com a Seca, coordenados por ele, farão reuniões técnicas nos territórios de identidade atingidos pela seca. Em dois dias visitarão, pelo menos, 74 cidades. A largada será dada pelos 36 municípios dos territórios Médio Rio de Contas e Vale do Jiquiriçá. O debate está marcado para acontecer em Jequié, no receptivo de eventos Buffet Marlene Marinho, das 8h às 17h.
A meta, conforme Rui Costa, segundo a reportagem, é apresentar as medidas de convivência com a seca e receber as demandas de cada prefeito. “Faremos um atendimento direto aos prefeitos. O objetivo é acompanhar a situação dos municípios e otimizar as ações. Será um momento para sanar dúvidas, diagnosticar demandas e dar orientações”, disse o secretário. O encontro itinerante terá uma segunda reunião, quando secretários municipais de Agricultura, Assistência Social e Infraestrutura terão orientações técnicas das empresas e secretarias estaduais. Eles vão se reunir no auditório Waly Salomão, da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia. A segunda reunião itinerante do comitê reunirá os prefeitos dos 38 municípios distribuídos nos territórios Semi-árido Nordeste II e Sisal, no dia 5 de fevereiro, em Tucano. O terceiro encontro será em Jacobina, no dia 19 de fevereiro, e reunirá prefeitos dos territórios Piemonte da Diamantina e Piemonte Norte do Itapicuru.
O texto completa dizendo que as movimentações não se restringem apenas ao titular da Casa Civil. A ida de José Sérgio Gabrielli à China como um dos principais integrantes da comitiva oficial do governador também rendeu muitos comentários. Aliados de primeira hora não deixaram de pontuar que os investimentos assegurados na viagem podem ser revertidos em bons frutos na sucessão estadual. Nenhum, deles, entretanto, se intitulam como candidatos. Rui Costa, em entrevista exclusiva à Tribuna, ao ser questionado sobre o fato de ser o predileto, mais uma vez se esquivou e pontuou que nunca ouviu Wagner falar isso. “Tem outros nomes, evidente. O governador eu nunca ouvi falando que tem preferência. Tem vários nomes colocados, então eu acho que é o momento de todos os nomes que estão colocados nos dedicarmos a ajudar o governador a materializar todos os planos e ações de governo. Todos os nomes que têm surgido até agora têm ajudado o governador. Acho que nós teremos, com certeza, uma chance enorme de fazer sucessão, porque chegaremos lá unidos e entregando projetos e ações de governo”.
Fato é que o PT perdeu o rumo. Seus candidatos estão escolhendo o caminho do uso da máquina pública para formatar nomes. E só assim o Rui Costa poderá ter seu nome ventilado. O secretário, além de ser um péssimo deputado, é famoso por cortar cabeças de companheiros nesta Bahia de meu Deus, só para satisfazer os seus desejos políticos. Foi o responsável pela eliminação de companheiros históricos com o fim de abrigar ex-governistas ou políticos que outrora eram perseguidores implacáveis de petistas. Com ele, os fins justificam os meios. Está aberta a temporada de negociatas no terreno do vale-tudo!

Ana Dalva News: Exemplo: Justiça extingue 12.434 cargos políticos

Ana Dalva News: Exemplo: Justiça extingue 12.434 cargos políticos: MPE de São Paulo apontou ilegalidades na edição de leis municipais que abriram caminho para contratação de servidores sem realização de co...

Procurador do Ceará quer devolução de 650 mil de show de Ivete Sangalo


NELSON BARROS NETO – da Folha de São Paulo
Procurador Gleydson Alexandre
O Ministério Público de Contas do Ceará informou que vai pedir o ressarcimento aos cofres públicos do cachê de R$ 650 mil pago pelo governo do Estado à cantora Ivete Sangalo por um show na inauguração de um hospital estadual em Sobral. O show foi realizado na sexta-feira, na cidade que é berço político do governador Cid Gomes (PSB) e de seu irmão Ciro. O pagamento do cachê foi registrado ontem na contabilidade do Estado. Segundo a instituição, mesmo em casos de dispensa de licitação, o poder público deve apresentar ao menos três orçamentos, mas o governo só anexou dois. O procurador-geral do Ministério Público de Contas, Gleydson Alexandre, diz que apresentará o pedido no dia 5, na volta do recesso do Tribunal de Contas do Estado. Em análise inicial, o TCE não apontou irregularidade no caso. Se essa avaliação for mantida, Alexandre disse que cobrará a devolução dos R$ 650 mil na Justiça. O Ministério Público listou seis shows de Ivete Sangalo contratados por prefeituras em 2012, entre elas a do Rio de Janeiro, por valores entre R$ 400 mil e R$ 500 mil.
Outro lado
O governador Cid Gomes informou ontem, por meio da assessoria de comunicação, que não poderia se pronunciar porque não foi notificado sobre o tema. Na semana passada, Cid afirmara que continuaria a promover esses eventos "doa a quem doer" e que o "povo precisa de diversão". Ivete Sangalo não se pronunciou.

Prefeitos dizem enfrentar dificuldades para contratar médicos

Aline Leal – da Agência Brasil – com edição de Carolina Pimentel
Brasília - O presidente da Associação Brasileira de Municípios (ABM), Eduardo Tadeu, disse hoje (22) que os prefeitos têm enfrentado dificuldades para contratar médicos. O relato foi feito ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Durante a reunião, a associação e outras entidades representativas entregaram carta endereçada a presidenta Dilma Rousseff em que pedem a adoção de medidas por parte do governo federal para resolver o problema. Segundo Tadeu, as prefeituras tentam de várias formas contratar médicos, mas não conseguem preencher as vagas. “Eu fui prefeito por oito anos e nunca consegui completar o número de médicos necessário nas unidades básicas de saúde. Tem um número pequeno de profissionais e os municípios ficam quase fazendo um leilão por esses profissionais”, contou. Para resolver o problema, o presidente defende ampliação das vagas nas faculdades de medicina e mais facilidades para a contratação dos profissionais formados no exterior. “Esses médicos [graduados fora do país] poderiam prestar serviços nos municípios mais necessitados, principalmente na atenção básica. O governo poderia flexibilizar o exame exigido para esses profissionais, até mesmo reconhecendo algumas faculdades estrangeiras”, sugere. Atualmente, a taxa é 1,9 médico por mil habitantes no Brasil. Para o Ministério da Saúde, o ideal seria elevar para 2,7 médicos por mil habitantes, o mesmo índice do Reino Unido. No ano passado, o ministério anunciou a criação de cursos de medicina e expandir as vagas nas faculdades já existentes, com o objetivo de ampliar o número de profissionais no país. A ABM e as outras entidades agendaram uma nova reunião sobre o tema para segunda-feira (28) com o ministro da Saúde.
Em seu primeiro ano, programa de seleção de médicos ocupou menos de 20% das vagas
Menos de 20% das vagas para médicos oferecidas pelo Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab) foram preenchidas no primeiro ano de vigência do programa. Das 2 mil vagas abertas para atuação na saúde básica, apenas 366 profissionais foram contratados, segundo o Ministério da Saúde. Criado em dezembro de 2011, o Provab é uma das estratégias do governo para tentar fixar médicos em regiões com carência desses profissionais, como a Amazônia, o Nordeste e as periferias das grandes cidades. Para estimular a ida para essas áreas, é oferecida pontuação adicional de 10% na nota dos exames de residência para os médicos que tiverem bom desempenho no primeiro ano de atuação no programa. O governo financia ainda especialização em Saúde da Família e cursos a distância. De acordo com balanço do ministério, 950 municípios se inscreveram no programa para seleção dos profissionais. Para Felipe Proenço, diretor de Programas da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do ministério, a baixa adesão está relacionada ao número insuficiente de profissionais no mercado. Segundo o diretor, uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostrou que existiam 13 mil médicos graduados em 2010 no país para 19 mil vagas formais de trabalho. No entanto, ele considera que o programa teve sucesso neste primeiro ano, mas que será revisado para ser aprimorado. “Olhando para várias dificuldades dos estados, ouvindo pesquisas com gestores, a gente entende que, além de um problema de má distribuição, existe um quantitativo menor de médicos do que é necessário para o sistema de saúde,” diz Proenço, destacando que diversas equipes do Saúde da Família estão desfalcadas, sem médicos. O diretor disse ainda que o ministério quer chegar à relação de 2,7 médicos para mil habitantes, a mesma do Reino Unido. Atualmente, no Brasil, essa relação é 1,9 médico para cada grupo de mil pessoas. Este ano, o governo anunciou que pretende criar novos cursos de medicina e expandir as vagas nas faculdades já existentes, com o objetivo de ampliar a quantidade de profissionais. Em junho, o Ministério da Educação anunciou o Plano de Expansão da Educação em Saúde, voltado para regiões consideradas prioritárias, que prevê em 10% o aumento do número de vagas de medicina. A proposta não tem o apoio do Conselho Federal de Medicina (CFM). O CFM tem argumentado que não faltam médicos no país e que a proporção atual (1,95 médico por mil habitantes) é suficiente. Segundo a entidade, existe uma má distribuição dos profissionais. O CFM defende a implantação de políticas públicas para reduzir essa desigualdade, como a criação de uma carreira de Estado exclusiva para médicos, semelhante à dos magistrados e procuradores do Ministério Público. Uma pesquisa do CFM, de 2011, mostra que enquanto em São Paulo são 4,02 médicos por mil habitantes, o maior número do país, no Maranhão a taxa é 0,68 médico por mil habitantes, o menor. Na Bahia, 69 municípios implantaram uma carreira médica por meio da Fundação Estatal de Saúde na Família. As progressões ocorrem com base no cumprimento de metas e resultados. O médico começa trabalhando em cidades com dificuldade de provimento e pouca infraestrutura. Conforme vai progredindo na carreira, passa a atuar em cidades com melhor estrutura. Porém, de acordo com o presidente da fundação, Carlos Aberto Trindade, a iniciativa não conseguiu reduzir o problema da fixação de médicos em locais que historicamente enfrentam dificuldade de contratação. Os salários, continuou o presidente, variam entre R$ 8 mil e R$ 11 mil para 40 horas de trabalho. Além da remuneração, os profissionais têm direito a cursos a distância de educação permanente e a possibilidade de cursarem mestrado e doutorado. “Há quase um leilão por médicos entre os municípios [da Bahia]”, disse Trindade, acrescentando que o número de profissionais é insuficiente. Além do Provab, o Ministério da Saúde desenvolve outros programas para incentivar a atuação dos médicos fora dos grandes centros urbanos. Um deles é o abatimento das dívidas com o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para quem trabalhar em uma das 2.282 cidades com carência na atenção básica à saúde.

IBGE atualiza área oficial de municípios, estados e regiões do Brasil


O arquipélago de Abrolhos pertence oficialmente à Bahia.
Vinícius Soares – da Agência Brasil – Edição de Davi Oliveira
Abrolhos pertence à Bahia
Brasília - O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicou hoje (23) no Diário Oficial da União uma série de tabelas com a área atualizada de todos os municípios, estados e regiões brasileiras, valores que, em alguns casos foram ajustados nos últimos anos. De acordo com a portaria, o Brasil tem 8.515.767,049 quilômetros quadrados (km²). Com sua extensão, é o quinto maior país do mundo em área territorial. O tamanho é cerca de metade dos 17 milhões de quilômetros quadrados da Rússia, o maior, e mais de 19 milhões de vezes superior à área do Vaticano, o menor. Algumas das alterações trazidas pela portaria do IBGE são a nova área da Bahia, que aumentou para 564.733,177 km², por ter incorporado a área insular do Arquipélago de Abrolhos, que faz parte do município de Caravelas. Santa Catarina conta agora com as águas internas da Baía Sul e da Baía Norte, entre o continente e a Ilha de Santa Catarina. O maior estado brasileiro continua sendo o Amazonas, com 1.559.159,148 km², que supera em território as regiões Sul e Sudeste somadas. Com sua área, o Amazonas seria maior que os países da América do Sul e da Europa, com exceção da Argentina e da Rússia, além do Brasil. Se fosse um país, o estado seria um dos 20 maiores do mundo em extensão territorial. O estado de menor extensão territorial, Sergipe, com 21.915,116 km², é cerca de 71 vezes menor. Se o Amazonas tivesse sido escolhido para ceder espaço ao Distrito Federal, poderia comportar 269 vezes a capital, que tem apenas 5.779,999 km². O maior município brasileiro, no entanto, fica no Pará. Altamira tem 159.533,730 km², o que o faz maior do que dez estados brasileiros e até do que alguns países, como Portugal, Coreia do Sul e Grécia. Vêm em seguida Barcelos (122.476,123 km²) e São Gabriel da Cachoeira (109.183,434 km²), ambos no Amazonas, e Oriximiná (107.603,292 km²), no Pará. O município mineiro de Santa Cruz de Minas, com área de 3,565 km², é o menor do país. Sua área é ainda menor que a da Ilha de Fernando de Noronha, distrito estadual de Pernambuco, que tem 17,017 km². A lista dos menores municípios inclui Águas de São Pedro (5,537 km²), São Caetano do Sul (15,331 km²) e Poá (17,263 km²), todos em São Paulo. Entre as regiões, a Norte, com 3.853.676,948 de km², é a maior, e a Sul, com 576.774,310, é a menor. Enquanto a primeira é maior que a Índia, o sétimo maior país do mundo, a Região Sul supera a extensão da França, o 47º.

Pepe Mujica, presidente do Uruguai, sem privilégios


O legado controvertido do homem que, entre um mate e outro, colocou o Uruguai entre os países mais liberais do continente depois de ficar 14 anos na cadeia
SIMON ROMERO - THE NEW YORK TIMES - O Estado de S.Paulo, com informações complementares de Janaina Figueiredo, de O GLOBO.
Jose Mujica, o presidente que optou pela simplicidade
Alguns líderes mundiais vivem em palácios. Outros desfrutam de uma vida privilegiada, com um mordomo discreto, uma frota de iates e uma adega de vinhos com Champagne de safras especiais. E há também José Mujica, o ex-guerrilheiro que é o atual presidente do Uruguai. Ele mora numa casa simples nos arredores de Montevidéu sem nenhum empregado. Como seguranças, tem dois policiais à paisana estacionados numa rua de terra.
Numa declaração à nação, famosa exportadora de carne de gado, com uma população de 3,3 milhões de habitantes, Mujica, de 77 anos, recusou a opulenta mansão presidencial de Suárez y Reyes, com nada menos que 42 funcionários, e preferiu permanecer na casa onde ele e a esposa vivem há anos, numa pequena fazenda onde plantam crisântemos que vendem nos mercados locais.
Chega-se à austera habitação de Mujica depois de percorrer a rodovia O'Higgins, passando por bosques de limoeiros. Ao assumir a presidência, em 2010, seu patrimônio era de aproximadamente US$ 1.800 - o valor do fusca 1987 estacionado na garagem. Jamais usa uma gravata e doa cerca de 90% do salário, em grande parte a um programa de expansão de moradias para os pobres. Sua atual versão de radicalismo discreto - uma mudança acentuada em relação aos dias nos quais ele pegou em armas para tentar derrubar o governo - exemplifica a emergência do Uruguai como talvez o país mais liberal do ponto de vista social da América Latina.
Sob o governo de Mujica, que tomou posse em 2010, o Uruguai chamou a atenção por tentar legalizar a maconha e o casamento de gays, e ao mesmo tempo implementar uma legislação das mais abrangentes de toda a região sobre o direito ao aborto, estimulando consideravelmente a utilização de fontes de energia renovável, como os ventos e a biomassa. Enquanto a doença afasta o presidente Hugo Chávez da Venezuela do cenário político, deixando repentinamente o continente sem a figura exagerada que tanto influenciou a esquerda, o ascetismo praticado por Mujica é um estudo de contrastes. Segundo ele, para que a democracia funcione devidamente, os líderes eleitos deveriam se adequar mais à realidade. "Fizemos todo o possível para tornar a presidência um cargo menos venerado", disse Mujica depois de preparar o mate para todos na cozinha de sua casa, numa recente entrevista.
A vida simples do antigo guerrilheiro foi matéria-destaque nos jornais americanos
Enquanto passava a cuia de mão em mão, ele admitiu que seu tranquilo estilo presidencial pode parecer inusitado. No entanto, afirmou que se trata de uma escolha consciente para evitar as armadilhas do poder e da riqueza. Citando o filósofo romano Sêneca, Mujica disse: "O pobre não é o homem que tem pouco demais, mas o homem que anseia por mais". O líder diante frente das mudanças do Uruguai, conhecido por seus inúmeros detratores e partidários como Pepe, é uma pessoa que poucos achariam em condições de ascender a essa posição. Antes que Mujica se tornasse produtor de crisântemos, era um dos líderes dos tupamaros, os guerrilheiros urbanos que se inspiraram na revolução cubana, realizavam roubos à mão armada a bancos e sequestros nas ruas de Montevidéu.
Em sua luta contra o Estado uruguaio, os tupamaros ganharam notoriedade pela violência. O diretor Constantin Costa-Gavras inspirou-se neles para o seu filme de 1972 Estado de Sítio, sobre o sequestro e execução, em 1970, de Daniel Mitrione, assessor americano da polícia uruguaia. Mujica disse que o grupo "tentava por todos os meios evitar matanças", mas também admitiu eufemisticamente seus "desvios militares". Uma operação brutal conseguiu por fim dominar os tupamaros e a polícia capturou Mujica em 1972. Ele passou 14 anos na cadeia, mais de 10 numa solitária, frequentemente num buraco no chão. Neste período, o deixaram mais de um ano sem tomar banho, e seus únicos companheiros, contou, eram uma perereca e os ratos com os quais compartilhava migalhas de pão. Alguns dos outros tupamaros que ficaram durante anos confinados em solitárias não tiveram o benefício da companhia de roedores amigos. Um deles, Henry Engler, um estudante de medicina, sofreu um grave esgotamento mental antes de ser libertado em 1985. Mujica raramente fala da época que passou na prisão. Sentado diante de uma mesa no jardim, bebericando o seu mate, ele diz que teve tempo para refletir. "Aprendi que sempre se pode começar de novo", afirmou. Ele optou por recomeçar ingressando na política. Eleito deputado, chocou os funcionários do estacionamento do Parlamento ao chegar a bordo de uma Vespa. Depois da ascensão da Frente Ampla ao poder em 2004, uma coligação de partidos de esquerda e de social democratas mais centristas, foi nomeado ministro da Pecuária, Agricultura e Pesca.
Pepe Mujica em sua chácara
Antes que Mujica vencesse as eleições de 2009 por ampla margem, seu adversário, Luis Alberto Lacalle, menosprezou sua casinha chamando-a de "caverna". Depois disso, Mujica também provocou uma agitação nos meios políticos do Uruguai vendendo uma residência presidencial numa estância balneária, por considerá-la "inútil". As doações o deixam com US$ 800 por mês do seu salário. Como declarou, ele e sua mulher, Lucia Topolanski, ex-guerrilheira que também foi presa e hoje é senadora, não precisam de muita coisa para viver. Em uma nova declaração em 2012, Mujica disse que compartilha da propriedade dos bens que antes estavam no nome da esposa, incluindo a casa e os implementos agrícolas, que contribuem para aumentar sua renda.
Ele destacou que seu antecessor da Frente Ampla na presidência, Tabaré Vázquez, também permaneceu na sua casa (embora Vázquez, oncologista de profissão, more no bairro da classe alta de El Prado), e José Batlle y Ordóñez, o presidente do início do século 20 que criou o estado do bem-estar uruguaio, ajudou a forjar uma tradição na qual "não existe distância entre o presidente e qualquer um dos seus vizinhos". Na realidade, se há um país na América do Sul em que um presidente pode dirigir um fusca e viver sem um exército de seguranças será o Uruguai, que figura entre as nações da região com menos corrupção e menos desigualdade social. Embora a criminalidade comece a se tornar preocupante, o Uruguai continua um dos países mais seguros da região.
No entanto, o estilo de governo do presidente não agrada a todos os cidadãos. A proposta de legalizar a maconha, particularmente, provocou um violento debate e as pesquisas mostram que a maioria da população é contrária à medida. Em dezembro, Mujica pediu aos parlamentares que adiassem a votação sobre a regulação do mercado da maconha, embora ele pressione para que o projeto de lei seja debatido mais uma vez em breve. "É uma vergonha ter como presidente um homem como ele", disse Luz Díaz, uma empregada doméstica aposentada de 78 anos que mora perto de Mujica e votou nele em 2009. Ela afirmou que não votaria mais nele se tivesse a chance. "Esse negócio da maconha é um absurdo", acrescentou. "Pepe deveria voltar a vender suas flores."
As pesquisas mostram que seus índices de aprovação estão caindo, mas Mujica diz não se importar. "Não ligo a mínima", disse, enfatizando que considera "monarquista" a possibilidade de se reeleger para mandatos consecutivos, proibidos pela Constituição uruguaia. "Se me preocupasse com as pesquisas, não seria presidente", afirmou. Faltando dois anos para o fim do mandato, Mujica parece apreciar a liberdade de falar o que pensa. Quanto às suas crenças religiosas, disse que ainda está em busca de Deus. Ele lamenta que tantas sociedades tenham a expansão econômica como prioridade, definindo-a "um problema para a nossa civilização" em razão das exigências feitas aos recursos do planeta. (O interessante é que a economia do Uruguai anda crescendo a uma taxa confortável anual estimada em 3,6%. Quando a cuia de mate ficou vazia, Mujica desapareceu na cozinha e voltou com um sorriso malicioso e uma garrafa de Espinillar, uma bebida alcoólica feita com a cana de açúcar. Ainda não era meio-dia, mas enchemos os copos e brindamos.
Depois disso, o presidente falou de vários assuntos: antropologia, ciclismo e a paixão dos uruguaios pela carne bovina. Ele disse que nem sonha em se aposentar, mas espera poder dedicar-se novamente à agricultura em tempo integral no final do mandato. Finalmente, os olhos do presidente se iluminaram quando lembrou de um trecho do Dom Quixote, no qual o cavaleiro andante bebe vinho de um chifre e janta carne de ovelha com os pastores seus anfitriões, pronunciando um discurso sobre a "peste da cavalaria". "Os pastores eram as pessoas mais pobres da Espanha", disse Mujica. "Provavelmente, eram os mais ricos", acrescentou. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
Candidato divide propriedade com família que ficou sem casa
Casa onde vive o presidente do Uruguai
A rua é de terra e a casa, um pouco precária. No portão de madeira da entrada, os cinco cachorros que moram no lugar recebem os visitantes com alegria. A mais mimada é Manuela, que perdeu uma das patas num acidente. Ela é a única que pode entrar na casa e até mesmo dormir com seus donos, o então candidato à Presidência do Uruguai José "Pepe" Mujica e a deputada e candidata a senadora na época Lucia Topolansky. O casal vive numa chácara de 35 hectares, em Rincón del Cerro, a 15 quilômetros de Montevidéu. Às vésperas da eleição, a repórter Janaína Figueiredo, de O GLOBO, visitou a casa de Mujica, com um pequeno grupo de jornalistas estrangeiros. Por recomendação dos assessores, o candidato, de 74 anos na época, evitou dar entrevista, mas aceitou mostrar o lugar onde mora há mais de 20 anos. A chácara é um retrato do ex-guerrilheiro e uma espécie de refúgio. Mujica e Lucia (que também integrou o movimento tupamaro e esteve 14 anos presa) gostam de plantar flores e verduras. O casal compartilha sua casa com uma família que há alguns anos enfrentou graves problemas econômicos e, sem ter onde morar, foi socorrida por Mujica e sua mulher.