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Poucas & Boas nº 110: Onde está a mudança?

Os sonhos de Marina na ISTOÉ



Com propostas que fazem parte do imaginário dos eleitores e um tom de utopia, a candidata do PV faz campanha que lembra o PT dos anos 80 e encanta os mais jovens. Mas pode ser atropelada pela realidade do País

Octávio Costa e Sérgio Pardellas
PLURAL
Em sua campanha, Marina conseguiu trazer até nomes ligados ao PT e ao PSDB

A pré-candidata do PV à Presidência, Marina Silva, é dona de uma história pessoal que emociona pelo passado e entusiasma pelo presente. Nascida pobre num seringal na zona rural do Acre, jamais deixou de acreditar em seus sonhos e de persegui-los. Foi alfabetizada aos 16 anos, conseguiu se formar em história, aderiu à luta sindical, tornou-se a senadora mais jovem da história da República e respeitada internacionalmente como ministra do Meio Ambiente. Sobreviveu não só às dificuldades da vida como também a várias doenças. Chegou ao poder, mas não permitiu que seus sonhos fossem revistos. Como candidata a presidente da República, Marina continua uma incansável combatente pela ética, pela transparência e pela defesa de tudo o que chama de “princípios”. “Pelo seu perfil e postura, Marina é a única em condições de pensar o impensável”, diz o economista Eduardo Giannetti da Fonseca, um dos colaboradores da campanha do PV.
Idealista por convicção, mantenedora de utopias, como gosta de repetir, Marina tem corrido o País apresentando propostas que fazem parte do imaginário de todos os eleitores. São plataformas impossíveis de refutar, como a bandeira do desenvolvimento sustentável, que cada vez mais ganha adeptos e encanta os mais jovens. A candidata do PV em 2010 lembra as candidaturas do PT no início da década de 80. Boas ideias e boas intenções não faltam a Marina, que não se coloca nem à direita nem à esquerda dos demais candidatos. “Estou à frente”, diz. O problema é que, na hora de explicar como realizar tudo o que Marina sonha para o Brasil e para o mundo, a realidade de um planeta cada vez mais competitivo e de um país com pressa para crescer atropela os seus sonhos. Marina é, por exemplo, uma obstinada defensora da energia limpa. Condena o impacto ambiental da construção da hidrelétrica de Belo Monte, pelo governo Lula, mas não dá alternativas concretas para suprir o abastecimento energético, hoje um dos gargalos da economia brasileira.
PARCERIA
Marina tem em seu candidato a vice, Guilherme Leal,
uma ponte com o mundo empresarial (foto ao lado)

Como é difícil imaginar que a indústria possa ser movida exclusivamente à base de energia eólica, as usinas nuclea-res seriam uma alternativa, admitida até pelo empresário Guilherme Leal, candidato a vice na chapa do PV. Leal, porém, argumenta que o custo delas ainda é alto demais. Independentemente do valor, Marina tem, por “princípio”, se revelado terminantemente contra a construção de Angra 3, desde os tempos em que era ministra do Meio Ambiente. E também “por princípio”, a ministra Marina barrou projetos considerados fundamentais para o desenvolvimento do País, como as hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, o que contribuiu para que deixasse o governo. A aguerrida seringueira perdeu o poder, mas não abdicou de suas convicções. E, se agiu assim quando estava no governo, nada indica que será diferente na campanha. A senadora já declarou alto e bom som que não aceita contribuições financeiras de empresas que não respeitem o meio ambiente e nem das indústrias tabagista e bélica.
Evangélica praticante, também “por princípio”, a candidata se declara contra o aborto e a união entre pessoas do mesmo sexo. Não ignora que está, no entanto, diante de uma demanda real da sociedade. E quando colocada diante dessa contradição, mais uma vez a candidata se mostra capaz de sonhar. “Questões como liberação da maconha e aborto devem ser resolvidas por plebiscito e não pelo presidente”, advoga a ex-ministra, que, contraditoriamente, condena a democracia direta preconizada pelo venezuelano Hugo Chávez.
Marina quer vencer a eleição sem abrir mão de seus ideais, sem negociar com seus sonhos e leva para os eleitores a mensagem de um futuro com relações políticas bem distintas das que se observam no cenário atual. Ela sabe que o PV não tem quadros para montar um governo, mas acredita mesmo que pode reunir o que chama de “gente séria” do PT e do PSDB em um mesmo projeto de País sem corrupção, sem poluição e crescendo dentro de uma agenda até agora utópica. Aos críticos, Marina diz que a utopia pode ser possível. Já na pré-campanha importou colaboradores oriundos de outras legendas. Entre os nomes que incorporou destacam-se, além de Giannetti da Fonseca, ligado aos tucanos, o antropólogo Luiz Eduardo Soares, ex-secretário de Segurança Pública do governo Lula, e a socióloga e doutora em psicologia da educação Neca Setúbal. “Se é verdade que o sonho desligado da realidade é vazio, é preciso ter em mente que a realidade desprovida do poder transformador do sonho é deserta. O futuro responde à força e à ousadia do nosso querer”, diz Giannetti. No mundo da política, porém, nem sempre querer é poder.
DO ACRE PARA O MUNDO
Aos 13 anos, Marina é acolhida por freiras. Com 17 anos termina a primeira etapa do Mobral e com Chico Mendes entra no movimento sindical em defesa dos seringueiros. Aos 50 anos, como ministra do Meio Ambiente, recebe o maior prêmio da ONU na área ambiental, o Champions of the Earth  (Fonte: ISTOÉ - N° Edição:  2117 |  03.Jun.2010)